Título: Nova política para irrigação sai do papel
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2005, Agronegócios, p. B10

Está pronta e começa a sair do papel nos próximos meses a nova política nacional de irrigação, um projeto do governo federal para buscar maior envolvimento de grandes empresários na agricultura irrigada e explorar o potencial do país no setor. Apenas 3,15 milhões de hectares cultivados - ou 5,9% das propriedades rurais - usam algum método de irrigação para melhorar a produtividade do campo. Trata-se de um percentual ínfimo em relação a outros países e representa só 10,5% do potencial brasileiro em agricultura irrigada. Discutida desde abril de 2004, a nova política de irrigação terá como principal mudança o direcionamento dos novos projetos de irrigação ao agronegócio de grande porte. Tradicionalmente, pequenos produtores e assentamentos rurais têm sido o maior foco do governo no momento de distribuir as terras em volta dos empreendimentos de irrigação. Há projetos levados a cabo pela iniciativa privada, mas a maior parte da infra-estrutura de irrigação é desenvolvida pelo poder público, que depois entrega lotes para programas de agricultura familiar. Mesmo no Vale do São Francisco, conhecido pela recente pujança agrícola, a maior parte das propriedades é de pequenos e médios produtores e os grandes lotes dificilmente passam de 300 hectares. Quando iniciou as discussões para reformular a política nacional de irrigação, o governo deparou-se com uma situação desanimadora: visitou 72 perímetros de agricultura irrigada e constatou que havia pouco mais de 200 mil hectares de terras cultivadas, com projetos implementados. Outros 103 mil hectares estavam ociosos. Por falta de financiamento, pouca assistência na formação de cooperativas ou simples desinteresse, boa parte dos assentados havia desistido. Baseado no cálculo de que o investimento médio para viabilizar a produção agrícola irrigada é de US$ 10 mil por hectare, além de US$ 5 mil adicionais para fornecer capital de giro aos produtores, o governo ficou chocado com a quantidade de gastos perdidos. "A ociosidade dessas áreas gera um desperdício de US$ 1 bilhão em investimentos públicos", afirma Marcio Lacerda, secretário-executivo do Ministério da Integração Nacional, pasta responsável pela reformulação da nova política. Em vez de uma orientação exclusivamente voltada para os aspectos sociais, a agricultura irrigada dará prioridade agora aos projetos de benefício socioeconômico e ambiental. A política redesenhada prevê o lançamento de editais de licitação para entregar à iniciativa 12 perímetros de agricultura irrigada até o fim do ano. Nas próximas semanas, o Ministério da Integração Nacional contratará uma consultoria para elaborar os detalhes do novo modelo de concessão das áreas. Os primeiros perímetros licitados serão os de Pontal (PE) e Salitre (BA), provavelmente no segundo semestre. Nas áreas concedidas, a infra-estrutura de irrigação está praticamente pronta. Caberá à iniciativa privada apenas levar os canais aos lotes indicados e dar início a produção agrícola sustentada. Em fases subseqüentes, serão licitados perímetros irrigados em mais cinco fases, na seguinte ordem: Baixio de Irecê (BA) e a terceira etapa de Jaíba (MG); Tabuleiros Litorâneos (PI) e Tabuleiros do São Bernardo (MA); Várzeas de Sousa (PB) e a segunda etapa de Jaguaribe-Apodi (CE); Platôs de Guadalupe (PI) e São João (TO); Baixo Acaraú (CE) e Tabuleiros dos Russos (CE). O secretário Lacerda vê multinacionais do agronegócio, grandes tradings e até fundos de investimento como os principais candidatos nas futuras licitações. Os projetos receberão maior foco econômico, mas Lacerda garante que haverá contrapartidas sociais. Uma idéia é exigir que o vencedor da licitação use pelo menos 20% das terras irrigadas para assentar pequenos produtores, garantindo financiamento e comercialização. O novo modelo de concessão também propiciará economia de recursos públicos. Para 2005, o governo reservou R$ 140 milhões para a "transferência de gestão de perímetros". Uma parte considerável desse dinheiro se refere ao rateio de custos com água, energia e manutenção dos pólos de agricultura irrigada.