Título: Acordo para reeleição de Lula esbarra no PT
Autor: César Felício, Raymundo Costa e Maria Lúcia Delgad
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2005, Política, p. A14

Objetivo considerado essencial pelo Planalto para aumentar as chances de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda no primeiro turno da eleição presidencial do próximo ano, a aliança eleitoral com o PMDB esbarra na dificuldade do PT em ceder espaço político. O partido resiste a abrir mão de candidaturas a governador, sobretudo nos Estados em que o PMDB é o principal adversário, como Rio Grande do Sul e Distrito Federal. Não há garantia de apoio para a manutenção dos seis governos Estaduais que os pemedebistas controlam. A resistência faz com que os pemedebistas não se entusiasmem com as ofertas para indicar candidatos a vice e a senador nas chapas estaduais e com a perspectiva de ganhar a indicação para a Vice-Presidência. "Sabe qual é o problema? É que o PT sempre quer ter o PMDB na vice, mas a gente não consegue enxergar nenhum Estado onde o PT aceita o PMDB na cabeça de chapa", ironizou o presidente nacional do PMDB, Michel Temer. Cogitado para ser vice na chapa do PT em São Paulo, o dirigente afirmou que deverá apoiar mais uma candidatura ao governo estadual do ex-governador Orestes Quércia, que é presidente regional do partido. O próprio Temer relaciona alguns casos. "O governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto, sempre diz que o PMDB nunca vai apoiá-lo. No Paraná, o governador Roberto Requião diz que o PT o responsabilizou pela derrota do partido na eleição municipal em Curitiba, depois de ter recebido o apoio do PMDB. O presidente quer o acordo nestes Estados, mas o PT local dificulta demais", disse. A ala governista do PMDB tende a concordar com o diagnóstico. Ainda aposta em uma aliança com o PT em Santa Catarina, mas é completamente cética em relação aos outros dois Estados da região Sul. Dividida entre os "azuis" do governador Joaquim Roriz e os "vermelhos" do PT, a aliança é difícil em Brasília. Roriz avisou à cúpula do PMDB que é contrário à união das siglas em 2006, mas a eventual coligação é vista com outros olhos no Planalto e em setores do próprio petismo do Distrito Federal. Lula gostaria de montar um palanque forte com o senador Cristovam Buarque, hipótese que o ex-governador diz estar fora de cogitação. A opção petista poderia ser então o deputado Sigmaringa Seixas, que admite coligar-se com o PMDB, ou seja, ter Roriz ao lado como candidato ao Senado, se essa for uma decisão do PT. "Os interesses regionais, por mais importantes que sejam, não podem se sobrepor aos interesses nacionais", diz. Lula tem na manga uma solução mais heterodoxa e que escandaliza ainda mais a esquerda petista do DF: uma aliança branca com o senador Paulo Otávio (PF), o candidato de Roriz. Segundo o dirigente, a situação foi exposta a Lula, quando o presidente falou na parceria eleitoral. "Ele falou que Dirceu (ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu) e Genoino (presidente do PT, José Genoino) iriam nos procurar, para negociações. Mas o PT não vai cortar na própria carne e existe dificuldade também na outra ponta da linha. O partido caminha para a candidatura própria à Presidência e nos Estados", afirmou o pemedebista. A resistência do PT em ceder espaço, apontada por Temer pode ter como exemplo o Ceará. A direção nacional do PT gostaria de construir uma chapa com o ex-prefeito de Sobral, Cid Gomes (PPS) como candidato ao governo, o ministro das Comunicações, Eunício Oliveira (PMDB), candidato ao Senado e um petista no posto de vice na chapa. Mas a seção local veta Cid, alegando que o irmão do pré-candidato, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, ainda não rompeu com o grupo do senador Tasso Jereissati (PSDB), que controla o Estado há 20 anos. Líder da bancada petista na Assembléia e presidente regional por oito anos, o deputado estadual José Nobre Guimarães, irmão de Genoino, afirma que o PT deve restringir as candidaturas próprias a apenas oito Estados e apoiar o PMDB em pelo menos cinco. Mas exclui o Ceará da relação. "O PT tem maior densidade eleitoral e a candidatura própria aqui é importante para o embate contra Tasso, uma figura emblemática do PSDB nacional", afirmou. Guimarães, junto com o presidente da Agência Nacional de Transportes Terrestres, José Airton Cirilo, o deputado federal João Alfredo e o prefeito de Quixadá, Ilário Marques, é pré-candidato ao governo. Entre os Estados que Guimarães defende a aliança com o PMDB está o Mato Grosso do Sul, hoje governado pelo partido. É a vez do PT local novamente dizer que não é possível. "Pode até haver acordo, desde que seja com a cabeça de chapa para o PT. Agora que botamos o Estado para caminhar, vamos entregar ao PMDB? Não pode", disse o líder do PT no Senado e pré-candidato ao governo, Delcídio do Amaral Gomez, para quem "a direção nacional vai ouvir a direção local e fazer as composições à luz das circunstâncias de cada Estado". Ajuda a candidatura própria no Estado o fato de o postulante do PMDB ser o ex-prefeito de Campo Grande André Puccinelli, adversário histórico do governador Zeca do PT, que não pode mais se reeleger. Em São Paulo, ocorre o oposto: é o PMDB que tem restrições para fazer a aliança com o PT. Quércia e Temer encontraram-se recentemente com Lula, mas o acerto esbarra nas resistências políticas dos dois dirigentes aos pré-candidatos petistas. O preferido da cúpula, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante, é apontado pelos pemedebistas como o grande responsável pela derrota de Orestes Quércia na eleição para o Senado em 2002. Mercadante teria estimulado a candidatura do sindicalista Wagner Gomes (PCdoB) à segunda vaga para senador na chapa do PT, ao invés de promover uma coligação branca com o PMDB. Ao tentar se reeleger, ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy, contra a vontade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, vetou publicamente a presença de Temer em sua chapa, em uma composição PT/PMDB. Temer terminou na chapa de Luiza Erundina (PSB) e o episódio é uma das razões lembradas pelo Planalto para explicar a aliança que o dirigente pemedebista fez com a ala do partido que prega a oposição ao governo federal ainda durante o processo eleitoral. O terceiro pré-candidato, o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, não tem problemas com o PMDB paulista. Mas é o postulante com menos chance de conquistar a vaga. Temer exagera ao afirmar que as seções locais do PT rejeitam abrir mão da cabeça de chapa em todas as situações. Há pouquíssimas exceções a esta regra, segundo petistas e pemedebistas da ala governista. Precisamente cinco Estados de eleitorado muito pequeno: Alagoas, Espírito Santo, Tocantins, Roraima e Rondônia Em Alagoas, o enfraquecido PT local irá apoiar o nome que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), indicar. Ou até mesmo ele próprio: Renan tem dito a interlocutores que gostaria de ser candidato a governador. Outra possibilidade em Alagoas é o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo (PCdoB), trocar seu domicílio eleitoral de São Paulo para seu Estado natal e concorrer ao governo estadual, em uma chapa que unisse todo o bloco governista ao governador Ronaldo Lessa (PDT). A aliança no Espírito Santo ainda depende do governador Paulo Hartung filiar-se no partido, como espera a ala governista do PMDB. A entrada de Hartung para o partido terá como conseqüência a saída do senador Gerson Camata da legenda, que aspira a candidatura ao governo. Com Hartung no PMDB, a aproximação com o PT é garantida. O governador tem um ótimo relacionamento com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Situação semelhante existe em Tocantins. Caso o governador Marcelo Miranda se filie ao partido, há possibilidade de composição com os petistas. Seria possível o PMDB receber apoio do PT em Roraima e Rondônia, dois Estados em que ambas as siglas estão na oposição. O ministro da Previdência, Romero Jucá, aparecia na lista de candidatos do PMDB em Roraima, mas diante dos recentes desgastes que vem sofrendo, pode desistir da disputa. O senador Amir Lando é o nome mais provável do PMDB para disputar o governo de Rondônia, mas lá as relações com o PT local são delicadas. Em outros Estados em que o PT admite abrir mão da candidatura própria, também não é certo que o beneficiário seja pemedebista. Em Minas, a prioridade é convencer o vice-presidente José Alencar (PL) a concorrer no plano estadual. Em Goiás, o apoio ao senador Maguito Vilella (PMDB) esbarra no presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Todo o meio político goiano já trabalha com a hipótese da candidatura do dirigente ao governo estadual, por um partido que seja simultaneamente da base de apoio do governador Marcone Perillo (PSDB) e de Lula, como o PTB ou o PP. A disposição do PT local é de apoiar Meirelles, e não o pemedebista.