Título: Eleição de diretor não teve voto do Itamaraty
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 28/04/2005, Especial, p. A22

O Brasil não apareceu nem para dizer que não votaria para a escolha do diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), ontem, no último dia da segunda rodada de consultas entre os países. No entanto, nações que estiveram ao lado da candidatura derrotada do Brasil, como a Índia, visivelmente esperam que Brasília volte a participar da escolha do novo diretor na próxima rodada de consultas, que será decisiva. Ainda mais porque as apostas são de que a final ficará entre o francês Pascal Lamy e Jaya Cuttaree, da República de Mauricio, no esperado confronto entre representantes de um país desenvolvido e de um país em desenvolvimento. A Índia, que se engajou ao lado de Cuttaree, certamente espera o apoio brasileiro a esse candidato, indicam fontes. A abstenção do Brasil atraiu as atenções, ontem, e certos negociadores não escondiam a opinião de que o país "mostra-se mau perdedor", ainda mais pela liderança que quer exercer na entidade. Outros reconheciam que desta vez o Brasil não votou por "motivos regionais", mas que voltará ao processo. Já o diretor-geral da OMC, Supachai Panitchpakdi, não escondia seu embaraço. "Obrigado por me informarem (sobre a abstenção brasileira)", disse a jornalistas. Questionado sobre o gesto brasileiro, Supachai hesitou, hesitou, até pedir: "Posso não responder a isso?". Entrou rapidamente na limousine e partiu. A embaixadora do Quênia, Amina Mohamed, esperou os últimos países até às 19h30. Ao final, fez um balanço positivo da participação, com mais de 140 dos 148 países-membros dando sua preferência. "É responsabilidade de todos escolher o novo diretor", disse, sem mencionar o Brasil. "Os países estão participando seriamente." Indagada se estava surpresa ou decepcionada com a abstenção brasileira, retrucou que não, porque considera "uma outra forma de expressão". Por sua vez, certos analistas recomendavam prudência ontem antes de se apostar na eliminação nesta sexta-feira do uruguaio Carlos Perez del Castillo. "Pode haver dificuldades para definir quem é o eliminado da vez", estimava alta fonte. Países da América Latina teriam votado quase todos só em Castillo, evitando indicar um segundo candidato na ordem de preferência. Isso reduz a margem de apoio dos outros. Em Buenos Aires, durante uma entrevista coletiva, o secretário de Relações Econômicas Internacionais da Argentina, Alfredo Chiaradía, rejeitou ontem as acusações de que seu país tenha contribuído para o fracasso da candidatura de Seixas Corrêa à direção-geral da OMC. "Qualquer acusação de que a Argentina teve uma atitude inadequada não nos cai bem, para colocar as coisas em termos cordiais", disse. Ele também deu a entender que o governo argentino tentou persuadir o Uruguai a retirar a candidatura de Carlos Perez del Castillo, mas como não teve êxito, sentiu-se obrigado a manter o apoio que havia prometido antes de o Brasil ter decidido entrar na disputa. "Mesmo com esse compromisso prévio, manifestamos nossa enorme simpatia pela candidatura de Seixas Corrêa e além disso tentamos ter uma candidatura única no Mercosul", disse. A ausência de apoio ao Brasil por parte da Argentina e de outros países sul-americanos foi interpretada por analistas como uma demonstração de resistência em relação à intenção brasileira de liderar a região. A Argentina também rejeita a pretensão do Brasil de conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. (Assis Moreira e Paulo Braga)