Título: Governo sepulta plano de encontro de contas à Varig
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2005, Empresas &, p. B3

O governo sepultou a possibilidade de fazer um encontro de contas entre as dívidas da Varig e a indenização obtida pela empresa no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por perdas decorrentes do congelamento de tarifas no Plano Cruzado. A vitória judicial garante à companhia aérea o recebimento de pelo menos R$ 2 bilhões, em cálculos não-atualizados, que poderiam ser abatidos da dívida com a União. O vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, deixou claro ontem que essa hipótese foi descartada. Além de inviável juridicamente, ele disse que o encontro de contas "não resolveria os problemas da companhia". "No caso da Varig, não traria nenhum benefício maior. A situação financeira ficaria absolutamente na mesma", disse Alencar, em audiência pública na Comissão de Infra-Estrutura do Senado. Segundo ele, a Advocacia-Geral da União vetou a possibilidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal. O ministro lembrou que TAM e Vasp ainda não tiveram ações julgadas pelo STJ por causa das mesmas perdas. Mencionou que "o Estado pagou à Transbrasil, mas nem assim ela saiu da situação difícil". Alencar defendeu a criação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e avaliou que ela fortalecerá a regulação. O projeto de lei que cria a agência já foi aprovado na Câmara. Durante a audiência, o relator do projeto no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), anunciou que apresentará o seu relatório até o fim de maio. O vice-presidente e ministro reiterou que não há mais planos do governo para socorrer a Varig e a empresa deverá passar por uma "solução de mercado". "Nós não temos nada para vender", disse Alencar, ao ser questionado sobre o apoio do governo à eventual compra da aérea. Sem citar nomes, ele afirmou que, no caso de transferência do controle acionário, o Estado analisará o negócio sob os aspectos econômicos e morais. Se a Varig não encontrar uma saída de mercado para a sua crise, poderá "definhar" como a Vasp, disse o ministro. O vice-presidente, ao falar sobre as negociações que tem feito na tentativa de salvar a empresa, garantiu que lutou pela sanção do artigo 199 da Lei de Falências, que beneficiaria as companhias aéreas. Chegou a afirmar que, tecnicamente, o governo poderia até, como principal credor, pedir a falência da Varig. Alencar enumerou as dificuldades técnicas para encontrar uma solução. Primeiro, criticou a medida provisória que encontrou pronta quando assumiu o ministério e previa intervenção federal na Varig, com a liqüidação extra-judicial da parte "podre" da empresa. Segundo ele, a medida tinha "cartas marcadas" e gerava controvérsias. "Não era bom nem do ponto de vista político nem do ponto de vista ético", disse Alencar, lembrando que a dívida acima de R$ 6 bilhões da Varig impedia a concretização da intervenção: "Há um dispositivo na legislação de que os ativos devem cobrir pelo menos 50% do patrimônio líquido negativo para executar a liqüidação". Alencar comentou que a transformação de créditos da União em participação acionária, resultando em uma espécie de estatização temporária, não pôde avançar por falta de embasamento legal. Disse ainda que Varig e Unibanco "acabaram se desentendendo" na busca por uma solução. "Eles [Varig] acabaram dizendo que não aceitavam mais o trabalho do banco, e o banco dizendo que não aceitava mais trabalhar para eles", revelou. Os participantes da audiência fizeram uma avaliação inusitada da aviação civil e disseram unanimemente que o setor não passa por crise. "Não há crise na indústria de aviação brasileira", disse o brigadeiro Jorge Godinho, diretor-geral do DAC, citando números que apontam lucratividade operacional de Varig, TAM e Gol, em 2004. "Um setor em que os desembarques estão crescendo 20% ao ano não pode estar em crise", reforçou o ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia. No Rio, o presidente do BNDES, Guido Mantega, disse que o banco ouviu anteontem o que os controladores da Varig (Fundação Ruben Berta) tinham a apresentar, em reunião pedida por eles, mas afirmou que não iria comentar o teor do encontro.