Título: Substituição de Aldo volta a enredar o Planalto
Autor: Raymundo Costa e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2005, Política, p. A6

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva convenceu-se de que a articulação política do governo não funciona e precisa mudar. "Caiu a ficha", dizia no final de semana um dirigente petista. Lula tem afeição especial pelo ministro Aldo Rebelo, insistiu em mantê-lo no cargo contra as pressões do PT, mas finalmente concluiu que o governo perdeu inteiramente o controle sobre a coordenação política. Fala isso abertamente no Planalto. Só não diz quando vai mudar e o que pensa em fazer com Aldo. O clima de intrigas voltou a envenenar as relações da base aliada no Congresso. Na sexta-feira, após mais de um mês na defensiva, ministros e dirigentes do PT voltaram a se reunir num café da manhã, na casa do ministro José Dirceu, para discutir a política. A conclusão a que chegaram e levaram a Lula: a articulação política não tem princípio, meio e fim e as derrotas sofridas pelo governo no Congresso propiciam um "clima de dispersão" perigoso; o presidente precisa chamar, cobrar e enquadrar os partidos. Nas contas feitas pelos dirigentes petistas, houve deserções no PMDB, PTB e PL na derrota imposta a um nome indicado pelo governo para o Conselho Nacional de Justiça. Na avaliação do conclave petista, o presidente deve chamar os presidentes e líderes desses partidos, diagnosticar e resolver pendências de cargos e verbas e cobrar fidelidade nas votações. O potencial de votação do governo na Câmara, concluíram, é de 300 votos, e, no entanto, o governo nem sequer consegue vencer uma votação de maioria simples. Do ponto de vista do PT, a substituição de Aldo poderia mudar esse clima. Visto das outras legendas que compõem a base, o problema não é tão simples. O PMDB governista, do qual o governo depende sobretudo no Senado, acha que Lula não pode simplesmente pôr um petista na coordenação política. A tendência seria ele sempre arbitrar os contenciosos em favor do PT, como, aliás, já ocorreria hoje, mesmo com Aldo Rebelo sendo do PC do B - a distribuição dos cargos continua na Casa Civil. Na véspera do café da manhã de Dirceu, Lula se reuniu com a cúpula do PMDB no Planalto. Os pemedebistas reclamaram de que o PT não só não partilha dos cargos federais, como tem avançado sobre a parte dos aliados. Dirceu, que participou também desta reunião, argumentou que os cargos do partido estavam todos resolvidos, inclusive os Correios. Eunício Oliveira (Comunicações) calou, muito embora seja recorrente a queixa dele e do partido de que teve de dividir os Correios com os demais aliados. Em pleno processo de eleição direta para a renovação dos dirigentes do partido, o "campo majoritário" do PT na realidade precisa dos cargos reivindicados pelos aliados para compor internamente e assegurar a manutenção do controle do partido, na eleição prevista para setembro. Cerca de 820 mil militantes estão habilitados a votar. Lula atua diretamente em duas frentes no Congresso, numa tentativa de neutralizar o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE) e de cooptar o PMDB numa aliança eleitoral em 2006. Após receber Severino para o café da manhã, semana passada, o presidente agora se dispõe a receber toda a Mesa da Câmara, comandada pelo deputado pernambucano, no Planalto. Mas não guarda muitas perspectivas: o único acordo que considera possível com Severino, no momento, é sobre a elaboração da pauta. O presidente da Câmara prometeu não criar mais obstáculos ao governo, como vinha fazendo, mas caberá ao Planalto a tarefa de arrumar os votos para os projetos de seu interesse. A reeleição de Lula permeou a conversa com o PMDB governista. A sigla argumentou que não teria como apoiar a recandidatura, se a verticalização das eleições for mantida. Lula respondeu que sempre fora contrário à reeleição - defende um mandato maior- mas já que ela existe iria disputá-la. "Eu quero o voto aberto, não quero o voto forçado. Isso não existe, eu tenho que estar bem para que as pessoas queiram votar em mim", discursou, antes de recomendar ao PT que páre de criar dificuldades ao projeto que determina o fim da verticalização, em tramitação na Câmara. Isso não foi o suficiente para acalmar o PMDB. Renan reclamou da liberação das emendas. Dirceu rebateu que esse era um problema que nem ele, Aldo ou o líder no Senado, Aloizio Mercadante, poderiam resolver. "Os recursos são muito escassos", disse, segundo presentes, sugerindo que o problema era o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Renan deixou a reunião insatisfeito. Desconfia de que Dirceu opera para isolá-lo dentro do PMDB. O presidente pemedebista, que teve o mandato prorrogado semana passada, não foi convidado, mas ligou para Lula e disse que a ampliação de seu mandato "não era contra" o presidente da República. Aldo Rebelo, por seu turno, tenta rearticular a coalizão governista por meio de um acordo para a votação da reforma tributária. O ministro conseguiu levar Palocci à mesa de negociação sob o argumento de que a Câmara, comandada por Severino, poderia votar apenas itens da reforma que aumentam as despesas. Aldo acredita que, votada a reforma, a base no Congresso entra nos eixos. É uma aposta de risco, até mesmo porque o ministro enfrenta a má vontade do PT. Rebelo nega que tenha colocado o cargo à disposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva depois das duas derrotas do governo no Congresso na semana passada, mas reconhece que há um problema de articulação entre os partidos aliados que precisa ser resolvido e está sendo trabalhado. Prova disso seriam os encontros de Severino Cavalcanti com o próprio ministro e com o presidente Lula na semana passada. Na análise do ministro, as duas derrotas não foram falha da sua pasta. A argumentação é de que a convocação do ministro da Casa Civil, José Dirceu, para explicar no Senado a abertura de capital da Infraero, não foi um erro da coordenação política porque o assunto estava fora de pauta e o governo não poderia ter um assessor em cada comissão da Casa. Amigos de Aldo, aliás, perguntam "por que outros ministros podem ser chamados pelo Congresso e Dirceu não pode?" Tampouco Aldo considera uma falha da coordenação política a indicação de Alexandre Moraes (secretário de Justiça e homem de confiança do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin) para o Conselho Nacional de Justiça no lugar do governista Sérgio Renault. O ministro não teria sido chamado para fazer essa negociação. (Colaborou Taciana Collet, de Brasília)