Título: Na volta ao parlamento, Dirceu diz ter desejo de governar SP
Autor: Henrique Gomes Batista
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2005, Política, p. A10

Com um discurso presenciado por menos da metade da Câmara dos Deputados, o ex-ministro José Dirceu reassumiu ontem o mandato em sessão que terminou em tumulto. Dirceu lançou pontes em direção à oposição, fez declarações de humildade - "sou mais um deputado na minha bancada" -, anunciou o desejo de governar o Estado de São Paulo, mas não resistiu a uma provocação do líder do PSDB, Alberto Goldman (SP), e deixou claro que pretende travar o debate eleitoral com a oposição em sua volta à Câmara. Funcionários do Palácio do Planalto, da Câmara e militantes do PT ocuparam parte das galerias e interrompiam o discurso com aplausos. No plenário, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que é militar da reserva, interrompeu Dirceu aos gritos de "terrorista, terrorista", quando o ex-ministro disse que defendia "a liberdade de imprensa, porque fui vítima da censura e da ditadura". A galeria reagiu com vaias, no primeiro sinal de que a sessão teria um final tumultuado. Em seu discurso, Dirceu disse que tinha mais de 40 anos de vida pública, serviu o governo durante 30 meses e não responde a um único processo. "Não sou réu". E fez a defesa da coalizão que ajudou a montar para apoiar o governo e que está na origem das atuais denúncias de corrupção no PT e no governo: "Não me envergonho, não faço autocrítica da política de alianças e da base de sustentação que o governo organizou" no Congresso. "Fomos eleitos para governar o Brasil, mas o PT tem 91 deputados e 13 senadores. Portanto, para governar o país, num sistema político partidário como o nosso, era preciso fazer alianças e compor uma base", argumentou. Em seguida, lançou pontes para a oposição: "Volto para defender o governo, para defender o PT e meu mandato, mas volto também para dialogar", disse. Segundo Dirceu, enquanto esteve na Casa Civil ele procurou o diálogo com a oposição e foram aprovadas reformas como a tributária, previdenciária e do Judiciário. Ele negou que tenha rompido esse diálogo com a oposição de maneira "unilateral" e radicalizado a posição do governo, o que atribuiu ao clima criado por ocasião do escândalo Valdomiro Diniz, seu ex-assessor. Dirceu também esclareceu que ameaçou não aceitar a presidência do PT, se o partido aprovasse a palavra de ordem "Fora FHC", o que o partido nunca teria formalizado. A partir daí passou a enumerar realizações do governo Lula e a criticar a situação do país ao final do governo tucano. "Não tinha política industrial, lei de inovação, lei de informática. Hoje tem tudo isso. A infra-estrutura estava abandonada, o setor energético em crise profunda". Arrematou dizendo que nos próximos meses quer debater com a oposição o governo Lula, porque o país precisaria desse debate, além de "enfrentar sim, as denúncias que existem de corrupção", mas sem paralisia do Congresso. Em aparte, Goldman provocou ao dizer que o discurso de Dirceu parecera um "programa de governo, um desejo", que tudo parecia "um projeto eleitoral". Podia também ser interpretado como uma prestação de contas do Presidente da República, o que Dirceu "talvez até desejasse sê-lo", mas que não era. Dirceu retomou os ataques aos tucanos, disse que Goldman reclamava do governo, mas esquecia os seis governos estaduais do PSDB (na realidade são sete). "Vamos debater, eu vou debater". Na galeria, militantes gritavam "Dirceu é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo" e "Brasil é dos trabalhadores". Quando Dirceu desceu da tribuna, o deputado Alberto Fraga (Sem Partido-DF) puxou algumas notas de R$ 50 e as exibiu para os manifestantes. O deputado Carlito Merss (PT-SC) avançou sobre o colega. No meio do plenário, Jair Bolsonaro (PP-RJ) levantou um saco com os dizeres "Mensalão do Lullão". Os manifestantes gritaram "fascista, fascista". A sessão foi suspensa. Dirceu achou tudo normal: "É o processo, é o processo".