Título: Acordo limita venda de calçados à Argentina
Autor: Paulo Braga e Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 21/07/2005, Brasil, p. A3

Comércio exterior Brasil aceita exportar mesmo volume de 2004 e vizinho pode usar licenças não-automáticas

Os fabricantes argentinos de calçados conseguiram fechar um acordo que garante proteção contra as importações brasileiras. O acerto prevê que os envios de sapatos ao país vizinho não ultrapassem o volume de 15,4 milhões de pares exportados no ano passado, sob a condição de que a produção brasileira não seja substituída por produtos de terceiros mercados, particularmente da China. Segundo uma fonte do governo brasileiro, o acordo foi fechado entre os dois países no dia 8, durante reunião da comissão de monitoramento do comércio bilateral ocorrida no Rio de Janeiro. A fonte disse que a limitação dos embarques brasileiros foi aceita ante o compromisso das autoridades argentinas de monitorar as importações de terceiros mercados. Caso elas cresçam, o Brasil também ganharia direito a uma cota maior. Ainda segundo a mesma fonte, o teto das exportações brasileiras em 2005 será definido pelo resultado do ano passado, mas a quantidade exportada neste ano dependerá da evolução do mercado argentino. O pacto foi obtido depois de fortes pressões do governo argentino, que chegaram a ser expressas pelo próprio presidente Néstor Kirchner, que diz que a recuperação da indústria nacional é uma das prioridades de sua gestão. Mesmo com o acordo, a Argentina deve implantar nos próximos dias um sistema de licenças não automáticas para calçados. A medida, que burocratiza as importações, permite que o governo controle o fluxo de produtos brasileiros que ingressa no país e ponha travas toda vez que considerar que há um aumento grande de embarques. O mesmo procedimento havia sido adotado anteriormente de forma unilateral pelas autoridades argentinas para pressionar o setor privado brasileiro a aceitar um acordo de limitação de exportações de lava-roupas. Adimar Schievelbein, consultor para assuntos internacionais da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), admitiu um acerto com o governo argentino para monitorar as exportações do Brasil em 2005 para que sejam semelhantes ao embarcado em 2004. Mas frisa que a entidade não assinou nenhum acordo formal. Segundo Schievelbein, os argentinos prometeram que não utilizarão as licenças não automáticas de importação de forma "impositiva" ou como uma "barreira protecionista". "Eles têm todo o direito de acompanhar o comércio, desde que não seja mal-feito", explica. O executivo, que foi um dos principais negociadores do acerto fechado no Rio, reconhece que também não há nenhuma garantia formal que os argentinos cumprirão sua parte no acordo. "Não há nada assinado. Mas há uma boa-fé de ambos os lados." Desta vez, a licença não automática entra como uma espécie de garantia do cumprimento do acordo. No ano passado, a Abicalçados fez uma estimativa de que as exportações brasileiras ficariam entre 12 milhões e 13 milhões de pares, mas o lado argentino diz que houve um compromisso de autolimitação que não teria sido cumprido, atingindo o volume de 15,4 milhões de pares. Os brasileiros negam que fecharam esse acordo. Nos seis primeiros meses deste ano, o Brasil exportou 5,07 milhões de pares de calçados à Argentina, o que representa um crescimento de 2,9% em relação aos 4,93 milhões vendidos em 2004. De acordo com a câmara de importadores local, a tendência para os próximos meses é de uma queda nas exportações brasileiras, principalmente por causa da valorização do real. Isso já estaria se refletindo nos números de junho, quando as vendas brasileiras caíram 18% em relação ao mesmo mês de 2004. "No ano passado, o preço médio de um par de sapatos brasileiro era de US$ 8,72 e hoje é de US$ 10,27", afirmou Juan Dumas, presidente da câmara de importadores do setor. Dumas considera que qualquer limitação vai acabar prejudicando os consumidores argentinos, resultando em menor oferta e incremento de preços, já que segundo ele as fábricas do país operam a plena capacidade.