Título: Governo fará licitação da folha do INSS
Autor: Raquel Balarin
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2006, Finanças, p. C8

Bancos Instituições dizem que idéia é "instrumento de pressão" na negociação de tarifas

O secretário do Tesouro, Joaquim Levy, surpreendeu as instituições financeiras no início deste ano, em meio às negociações para inclusão no Orçamento da União dos valores que o INSS terá de pagar aos bancos pelos serviços de pagamento de benefícios em 2006. Avisou que o Tesouro estuda fazer uma licitação da folha de pagamento do INSS. Com isso, em vez de receber pelos serviços, os bancos teriam de pagar para prestá-lo. "Antes, emprestar para o governo era um grande negócio. Agora, nesse admirável mundo novo, vale a pena emprestar ao cliente", diz Levy, lembrando que isso motivou muitos bancos nos últimos dois anos a participar de licitações de folhas de pagamento de prefeituras e estados e também da privatização de bancos. Segundo ele, a licitação da folha do INSS deverá reduzir despesas, mas seu principal objetivo será melhorar os serviços ao beneficiário. O pagamento do benefício deixaria de ser visto como um "favor". A expectativa de Levy é de que em maio seja dada partida ao processo de licitação, para que o novo modelo possa funcionar até o fim do ano. Hoje, são pagos mensalmente 23,9 milhões de benefícios em todo o país, no total de R$ 11,3 bilhões. Para o Tesouro, além do interesse nesse volume de recursos, o perfil dos beneficiários deve estimular os bancos a participar dos processos. Levy fez uma comparação com a folha da Prefeitura de São Paulo, adquirida pelo Itaú por R$ 510 milhões em licitação no ano passado. Na faixa de 5 a 10 salários mínimos, São Paulo tem 61 mil funcionários. O INSS, 800 mil beneficiários. "Não é preciso ser PhD para imaginar que um business dez vezes maior que o da Prefeitura de São Paulo tem algum potencial", afirma. Um executivo do setor financeiro disse que também chamou a atenção do governo o boom de crédito consignado para aposentados. Desde 2004, quando o INSS autorizou o desconto de empréstimos no benefício, aposentados e pensionistas tomaram créditos de R$ 12,1 bilhões. A assessoria de imprensa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou que oficialmente não tem conhecimento dessa proposta e que, após sua formalização, poderá dar uma resposta. Ainda segundo a instituição, os bancos prestam um serviço inestimável ao segurado e se preocupam com os aposentados, muitos deles com um relacionamento de anos com as instituições financeiras. Executivos de bancos consideram que a proposta do Tesouro não é factível e alguns deles afirmam que a idéia é apenas um "instrumento de pressão, já que os bancos estão em plena negociação das tarifas". "Não é pressão. É questão de transparência. No contrato de 2006 estabelecemos uma cláusula de que o acordo poderia ser suspenso e eu expliquei o porquê", rebate Levy. Atualmente, as instituições financeiras recebem R$ 1,07 por benefício pago com cartão de débito. Se o aposentado ou pensionista tem conta corrente, o valor cai para R$ 0,30. No ano passado, a prestação de serviços (que inclui a arrecadação de contribuições) rendeu às instituições financeiras R$ 383 milhões em tarifas. No contrato para este ano, a expectativa é de que este valor caia para pelo menos R$ 360 milhões. O governo tem insistido para que as instituições financeiras ampliem o uso de tecnologias que barateiam os custos e estimulem a bancarização. Para os bancos, uma licitação da folha de pagamento do INSS é difícil de ser executada, em primeiro lugar, pela extensão do país. Há locais que não comportam agências bancárias. "E se um Citibank ganhasse a licitação? Como ele faria os pagamentos no Amazonas?", cutuca um executivo. Uma das idéias em gestação seria a realização de licitações por região, o que evitaria a concentração, mas Levy preferiu não adiantar dados sobre o modelo. Ele afirmou, porém, que uma cláusula que já é certa é a de que todo beneficiário terá direito a um DOC gratuito. Isso evitaria uma acomodação do banco vencedor e estimularia a concorrência. Outro argumento dos bancos é o de que o filé mignon da folha do INSS é pequeno. Segundo dados da Fazenda, 79% dos beneficiários recebem até dois salários mínimos.