Título: Bom para os radicais
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 13/06/2010, Mundo, p. 22

Imposição de sanções pelo Conselho de Segurança não abala regimes como o do Irã, segundo analistas. Ao contrário, elas inibem a oposição interna e dificultam o diálogo

Limitar as atividades de um país para preservar a paz e garantir a segurança deveria bastar. No entanto, a história mostra que as sanções do Conselho de Segurança das Nações Unidas também podem fortalecer o regime que se pretende punir. O pacote aprovado contra o Irã na quarta-feira passada colocou uma vez mais em questão a eficácia das resoluções da ONU. Para o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, elas não terão efeito algum. Na ótica dos especialistas, as grandes potências podem dificultar o programa nuclear de Teerã, mas não estão nem perto de conseguir brecá-lo, a exemplo do que aconteceu com a Coreia do Norte.

Nos últimos 50 anos, o conselho aprovou sanções para tentar apaziguar conflitos e crises. O efeito, porém, pode ser o oposto do pretendido. No caso do Irã, as medidas parecem ter afastado ainda mais a possibilidade de diálogo. ¿Para começar, ao isolar o país, as potências foram contra o próprio discurso de conseguir um acordo. Com isso, elas vão dar mais tempo para o desenvolvimento do programa nuclear e, ao aprovar outras sanções, estão dando fôlego ao regime iraniano¿, argumenta Chales Pennaforte, diretor-geral do Centro de Estudos de Geopolítica e Relações Internacionais (Cenegri).

De acordo com o escritor iraniano Reza Aslan, membro do Centro de Diplomacia Pública da Universidade do Sul da Califórnia, a estratégia de intensificar as medidas contra o Irã não deve ter sucesso. ¿É a quarta vez que a ONU impõe sanções contra o Irã. As primeiras três rodadas não conseguiram fazer nada para deter as ambições nucleares ou o comportamento político do regime. Então, não há razão para acreditar que desta vez o resultado seja diferente. Acredito que Ahmadinejad deve continuar a buscar aliados nos países emergentes, como Brasil, Turquia, Índia e Rússia, para tentar resolver a questão¿, disse o especialista ao Correio.

As medidas dependem em parte da boa vontade dos países-membros da ONU. O Conselho de Segurança fiscaliza o cumprimento das sanções e pode abrir processo no Tribunal Internacional de Justiça, ou aprovar novas medidas. ¿Do ponto de vista prático, porém, é um balão de ensaio. Por trás das sanções há muitos interesses econômicos, então o comércio acaba se realizando de alguma forma¿, analisa Pennaforte.

No caso da Coreia do Norte, as restrições não ajudaram nas negociações e o país continuou com seu programa nuclear até testar duas bombas atômicas. Em Cuba, mantida sob embargo pelos Estados Unidos há 48 anos, o regime comunista sobreviveu e o país se desenvolveu, embora com sofrimento para a população. ¿Um país que tem petróleo, como o Irã, consegue se manter. Cuba conseguiu manter seu regime mesmo isolada. A Coreia do Norte, apoiada pela China, deve continuar a testar mísseis¿, ponderou o diretor geral do Cenegri.

Exceção Nem sempre, porém, resoluções punitivas do conselho atrapalham o desenvolvimento de negociações. No fim da década de 1970, as medidas contra a venda de armamento à África do Sul, então sob o regime de segregação do apartheid, tiveram um grande impacto no processo que conduziu à democracia racial, consumada em 1994 com a eleição de Nelson Mandela. ¿É claro que cada caso é um caso. Mas, no quadro geral, a ONU não tem tido sucesso. A capacidade de imposição é mínima e nem sempre objetiva. No exemplo do Irã, se fossem atingidas as importações de petróleo, as sanções seriam duras¿, afirma Eduardo Viola, professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade de Brasília.

Para Janina Onuki, do Instituto de Relações Internacionais da USP, o grande objetivo das sanções está em fazer uma diferenciação política. ¿Eu não diria que as medidas na Coreia do Norte e no Irã não tiveram efeito, pois o constrangimento moral sobre esses países já é um feito. É claro que acontecem discussões, não cumprimento de sanções, elas têm o sentido político e prático de expor os países e os constranger.¿