Título: Brasileiros vão às compras e PIB cresce
Autor: Malta , Cynthia
Fonte: Valor Econômico, 06/11/2009, Especial, p. F11

Os brasileiros foram às compras neste ano e ajudaram as empresas que operam na ponta final do consumo a registrar vendas e lucros crescentes e ações em alta na bolsa de valores. Gastos mais robustos das famílias também fizeram o país a ser o primeiro da América Latina a sair da recessão, já no segundo trimestre do ano, e animam analistas a prever um aumento expressivo do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010, na casa dos 5%.

O ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, da Quest Investimentos, chegou a prever expansão de 6% para 2010, em entrevista recente ao Valor. Para este ano, que começou carregando uma recessão criada no último trimestre de 2008, a previsão do Ministério da Economia é de um aumento de 1% do PIB em relação a 2008. E nesse cenário, algumas das maiores empresas do varejo e da indústria de bens de consumo final já conseguem mostrar resultados positivos.

Companhias como Pão de Açúcar, a maior rede brasileira de supermercados, AmBev, líder do mercado nacional de cerveja, e Natura, fabricante de cosméticos cujos papéis em bolsa estão mais caros do que os da gigante americana Avon, estão nesse grupo - ao lado da operadora de shopping centers BR Malls, da varejista de moda Lojas Renner, e da Hypermarcas, empresa fundada há menos de três anos e que vem crescendo rapidamente no setor de bens de consumo, por meio de aquisições. Todas elas apresentam balanços no azul, com expansão de receita líquida e ações em alta na Bolsa de Valores de São Paulo.

O consumidor brasileiro já vinha colocando mais a mão no bolso, antes mesmo do estouro da crise financeira mundial, há pouco mais de um ano, quando o banco americano Lehman Brothers quebrou, e continuou a gastar mesmo quando a indústria e o varejo puseram o pé no freio no final de 2008. O país registrou, então, dois trimestres consecutivos de queda no PIB (de 3,4% nos últimos três meses de 2008 e de 1% nos primeiros de 2009), mas as famílias continuaram indo às compras e no segundo trimestre deste ano o PIB voltou a crescer (ver gráfico no quadro acima).

Analistas do governo e do setor privado são unânimes em apontar os fatores que impulsionaram o consumidor a comprar mais alimentos, bebidas, cosméticos, eletrodomésticos e carros: redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos e produtos da linha branca (lavadoras de roupas e geladeiras, por exemplo); o programa do governo federal Bolsa Família, que aumenta a renda de famílias mais pobres; o desemprego menor do que o esperado; a aposentadoria atrelada ao reajuste do salário mínimo e o aumento deste, que costuma ter um efeito cascata nos demais salários pagos pelo setor privado.

Estudo recente divulgado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostrou que o Brasil é um dos poucos países onde os salários crescem em termos reais - na maior parte dos outros países, eles caem. A taxa média de crescimento mundial dos salários, que em 2007 foi de 4,3%, caiu para 1,4% no ano passado, em termos reais.

O Brasil, segundo a OIT, teve um aumento real dos salários de 2,8% no ano passado (acima de Canadá, Austrália, Reino Unido, Estados Unidos, África do Sul, Alemanha e Japão). No México, país com o qual a economia brasileira costuma ser comparada na América Latina, houve queda de 3,5% nos salários no mesmo período. O salário mínimo no Brasil subiu 12% neste ano, para R$ 465, e chegou ao bolso dos trabalhadores em março, um mês antes do que em 2008.

Esse aumento de renda aliado a uma maior segurança na manutenção do emprego - a taxa de desemprego foi de 7,7% em setembro - anima em especial a classe C, que representa mais da metade da população brasileira. A indústria e o varejo vêm ampliando a oferta de produtos e serviços desenhados para ela.

Essa massa de brasileiros, com renda entre R$ 912 e R$ 1,4 mil, já compra quatro de cada dez computadores vendidos no país, tira da carteira sete de cada 10 cartões de crédito em circulação e responde por 70% dos apartamentos financiados pela Caixa Econômica Federal (CEF), informa André Torreta no livro "Mergulho na Base da Pirâmide", lançado neste ano pela editora Saraiva. Mas há ganhos também para as classes D e E, com renda média mensal de até R$ 846. No carrinho do supermercado desses consumidores há hoje, segundo pesquisa da Latin Panel, achocolatados, leite longa vida, iogurtes e salgadinhos.