Título: UE propõe cortar subsídio agrícola de país gastador
Autor: Fidler , Stephen
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2010, Internacional, p. A13

A União Europeia apresentou propostas ontem para disciplinar os governos mais gastadores do bloco, incluindo o corte dos subsídios à agricultura e à pesca, que normalmente somam bilhões de euros por ano.

As sanções propostas pela Comissão Europeia (CE, o órgão executivo da UE) têm como objetivo melhorar a fraca coordenação dos orçamentos dos governos e de outras políticas econômicas entre as 16 nações que usam a moeda única. A avaliação é que essas fraquezas permitiram o surgimento de uma crise da dívida pública na Grécia, gerando uma perturbação financeira mais ampla que pode ameaçar o futuro da zona do euro.

Os subsídios à agricultura e à pesca consomem bilhões de euros anuais - a França, o país mais beneficiado, recebeu quase ¿ 10 bilhões (US$ 12 bilhões) em subsídios agrícolas só em 2008. A ideia de que eles possam ser suspensos ou cancelados é muito delicada para os governos da UE. Entre outros pagamentos que poderiam deixar de ser feitos estão o apoio regional e financiamento de projetos, que também podem somar bilhões de euros.

As propostas representam o início de um longo debate que toca o coração da soberania nacional, suscitando questões sobre quanto poder os governos nacionais estão dispostos a ceder à UE em prol da moeda única.

Chegar a esse ponto seria um remédio amargo para alguns governos. "Sempre que alguém usa a palavra sanções, cria-se uma agitação aqui. E, se aí você toca na política agrícola ou nas verbas regionais, a agitação se torna muito grande", diz uma autoridade da comissão.

A ideia é que cada governo submeta à comissão um rascunho do seu provável orçamento e programa de política econômica para o ano seguinte. Depois de uma avaliação da comissão, o Conselho Europeu - um painel dos governos da UE - faria recomendações, caso o programa fosse visto como arriscado ou potencialmente desestabilizador. Se os governos não seguissem as recomendações, os subsídios agrícolas e outras ajudas seriam suspensos e até cancelados. Os produtores ainda receberiam os subsídios dos seus próprios governos nacionais, mas os governos perderiam o financiamento.

A comissão quer impor mais rigor ao limite já existente para os déficits orçamentários, de 3% do PIB, e reforçar os esforços para reduzir a dívida total dos governos para o teto de 60% da PIB, que muitos países atualmente excedem por uma grande margem. "A dívida excessiva precisa ser atacada mais seriamente do que no passado", disse Olli Rehn, o comissário de Economia da UE, que lançou as propostas.

A avaliação econômica anual incluiria outros elementos, tais como reformas estruturais, e daria alertas para potenciais problemas, como o acúmulo da dívida privada, que até agora não foi levado em conta.

Uma grande questão é se as regras poderiam valer tanto para as grandes quanto para as pequenas economias. Tentativas passadas de fazer cumprir os limites existentes para as dívidas e déficits dos governos fracassaram porque outros países membros não se dispuseram a multar violações cometidas pela França e pela Alemanha.

"Existe sempre espaço para substanciais distinções políticas, mas na minha opinião (...) deveria haver um tratamento igual para todos os Estados membros, independentemente de seu tamanho ou qualquer outra característica", disse Rehn.

O planos discutidos ontem poderiam ser realizados, disseram as autoridades, sem mudar tratados. Sanções mais duras, como a suspensão do direito de voto dos Estados membros, exigiriam a mudança de tratados da UE, disseram representantes da comissão, um longo e incerto processo que a maioria dos governos gostaria de evitar.

As ideias terão de competir com outras, inclusive sugestões de uma força-tarefa liderada por Herman Van Rompuy, o presidente do conselho, que devem ser apresentadas em setembro.

Ao fazer suas propostas, Rehn não conseguiu atacar uma questão que alguns economistas acreditam ser um componente essencial das dores de parto da zona do euro: superávits em países como a Alemanha. A Alemanha gera grandes superávits comerciais com países deficitários da zona do euro, tais como Espanha, Itália, Grécia e Portugal. Simon Tilford, do Centro para a Reforma Europeia, de Londres, disse que o plano da comissão "parte do princípio de que todos os desequilíbrios podem ser resolvidos pelos países que têm déficits".

A Alemanha precisa participar também, estimulando o seu consumo, disse Tilford. "Qualquer sistema de governo da zona do euro que ignore problemas estruturais que vemos nos países com superávit está fadado ao fracasso", disse ele.

Rehn sugeriu que os superávits da Alemanha não fossem levados em conta no plano. "Ninguém está querendo enfraquecer o desempenho de exportação de nenhum país", disse ele.