Título: Brasil é o segundo país que mais ganha com mudanças no FMI
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Fonte: Valor Econômico, 25/10/2010, Internacional, p. A11

O Brasil será o segundo maior beneficiário com o aumento do poder de voto para os emergentes no Fundo Monetário Internacional (FMI), pelo acordo histórico alcançado pelo G-20 no fim de semana, refletindo a crescente mudança de poder na economia global. O país ficará atrás somente da China em termos brutos. O Valor apurou que o direito de votos do país passará a 2,32%, quase duplicando sua influencia na instituição desde o começo da crise financeira global em 2007.

A hierarquia dos países no FMI ficará agora mais alinhada ao peso relativo deles na economia internacional, como o Brasil e outros emergentes vinham pedindo há anos. A fatia das nações em desenvolvimento como grupo aumentou pouco, de 42,1% para 44,7%, mas subiu bem mais para os emergentes com maior dinamismo e maior ranking na economia global.

Para o G-20, o acordo tornará o fundo "mais efetivo, com mais credibilidade e legítimo", quando terá reforçado seu papel de monitoramento da economia mundial e na avaliação das políticas econômicas nacionais.

Pelo acordo acertado na Coreia do Sul, mais de 6% das cotas - a contribuição que determina o poder de voto - serão transferidas para os emergentes mais dinâmicos, beneficiando Brasil, China, Índia e Turquia. A Europa perderá dois de seus nove assentos entre os 24 do conselho de administração. O recuo da representação europeia é menor do que os EUA cobravam. Em troca, Washington, com 17,67% da parte das cotas, conservará seu direito de veto sobre as decisões mais importantes.

Agora, o fundo será comandado na prática por seis países avançados (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália) e pelo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). A China se tornará o terceiro maior acionista na entidade chave nas operações do sistema financeiro e monetário global.

O Brasil, nona maior economia em paridade de poder de compra, pulou de 18º para 14º maior em 2008 e agora é o 10º cotista, desta vez superando países como Canadá, Holanda, Bélgica, Arábia Saudita e Coreia do Sul. Na primeira reforma de cotas do fundo, em 2008, o poder de voto do Brasil tinha pulado de 1,3% para 1,78%, mas esse aumento nem chegou a ser implementado. E agora alcançará 2,32%, numa alta de 78,4% em três anos e de 30% em relação ao aumento de 2008, ilustrando o ritmo da mudança de poder na economia mundial.

"Os dez maiores acionistas do FMI serão agora os 10 países sistemicamente mais importantes na economia global", afirmou o diretor-geral do FMI, Dominique Strauss-Khan. "Recriamos a ordem normal, que agora representa a realidade da economia mundial."

O aumento da importância do Brasil e outros emergentes não virá necessariamente com uma fatura mais salgada, segundo participantes. Ficou acertada a duplicação das cotas do FMI para US$ 500 bilhões, que será feita em paralelo à diminuição na mesma proporção dos recursos do Novo Mecanismo de Empréstimo (NAB, New Arrangement to Borrow).

A contribuição do Brasil para o NAB equivalia a US$ 14 bilhões, que passa para as novas cotas e a princípio sem comprometimento adicional ao fundo. Em todo caso, o aumento nas cotas pelo Brasil faz parte das reservas internacionais do país.

A transferência de cota dos países desenvolvidos para os emergentes mais dinâmicos será de 2,6%. A Arábia Saudita, que tinha um poder desproporcional por causa de sua acumulação de petrodólares, foi o emergente que mais perdeu cotas. Entre os desenvolvidos, foi a França.

"Essa reforma, esperada há muito tempo, constitui uma verdadeira mudança no equilíbrio de poderes e dá espaço a todas as economias, incluindo os emergentes", afirmou a ministra de economia da França, Christine Lagarde.

Sem surpresa, o secretário de Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, avisou rapidamente que o reconhecimento do maior papel dos emergentes deve vir com "maiores responsabilidades" na economia mundial e nas instituições internacionais, numa alusão ao plano americano que inclui poder exportar mais.

A reforma entrará em vigor em 2013. Até lá, os emergentes querem uma nova fórmula para calcular as cotas, já que em 2014 haverá nova redistribuição de direitos de votos na entidade. Como os países emergentes cresceram quase cinco vezes mais que os ricos na atual década, e a tendência é de que esse ritmo continuará, a mudança de poder poderá se ampliar.

Para observadores na Coreia, a participação do Brasil foi importante nas negociações, respaldada também pelo desempenho de sua economia. Na ausência do ministro Guido Mantega e do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, o país foi representado pelo secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Marcos Galvão, e pelo diretor da Área Internacional do BC, Luiz Pereira.