Título: Agnes, a nova estatal, vai cuidar do São Francisco
Autor: Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2010, Especial, p. A16

A transposição do rio São Francisco, uma das maiores obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) vai ganhar uma estatal. O projeto de criação da empresa está pronto e já foi entregue nas mãos do ministro da Integração Nacional, João Reis Santana Filho. O documento que estabelece a composição e a forma de atuação da nova empresa será apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A estatal do São Francisco, conforme apurou o Valor, foi batizada provisoriamente de "Agnes", sigla para Água de Integração do Nordeste Setentrional. A empresa terá um conselho formado por 13 membros: quatro deles virão dos governos dos Estados beneficiados pela transposição - Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba - dois de comitês das bacias doadoras e receptoras de água e sete do governo federal. O conselho será presidido pelo Ministério da Integração Nacional (MIN). A Agnes será alimentada com dinheiro da União e com uma taxa que será incluída na tarifa de água.

"A criação da estatal é adequada. Essa é uma obra de porte, que vai precisar de uma gestão direta", diz Francisco Lopes Viana, superintendente de outorga e fiscalização da Agência Nacional de Águas (Ana).

Segundo José Luiz de Souza, coordenador do conselho de gestão do projeto de integração do rio São Francisco, ligado ao Ministério da Integração, a proposta de criação da empresa deverá ser enviada ao Congresso e poderá ser votada em regime de urgência. Já há quem fale, no entanto, na possibilidade de o governo autorizar a criação da Agnes por meio de medida provisória. A expectativa inicial era de que a estatal estivesse em operação até o fim do mês passado, mas segundo uma pessoa próxima à Presidência, a crise na Casa Civil acabou adiando os planos.

A função da nova estatal do São Francisco será gerenciar as operações da transposição do São Francisco e o acesso à água por 12 milhões de habitantes. Anunciado em fevereiro de 2007, o plano de levar água para regiões secas do Nordeste está dividido em duas etapas e tem custo total estimado em R$ 6,6 bilhões.

O eixo Norte, de 420 quilômetros de extensão e transferência de água para quatro Estados (Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba), tem previsão de conclusão no fim de 2012. O eixo Leste, de 220 quilômetros, que beneficia os Estados de Pernambuco e Paraíba, tinha 41% de suas obras realizadas até abril deste ano e previsão de ser concluído até dezembro, mas está atrasado. Segundo o Ministério da Integração, a previsão agora é que o eixo seja concluído em junho de 2011.

Depois de uma intensa campanha contra as obras de transposição, os movimentos sociais que lutaram contra o projeto do governo estão enfraquecidos. Ruben Siqueira, sociólogo, membro da Comissão Pastoral da Terra e um dos integrantes da Articulação Popular do São Francisco, afirma que foi praticamente impossível encontrar apoio político para questionar o projeto. "Nesse período de eleições ninguém quis tocar no assunto e mesmo aqueles que estavam com a gente não foram eleitos", diz Siqueira. "Perdemos também o apoio da igreja, por isso estamos revendo nossas ações", complementa.

A Articulação Popular do São Francisco, segundo Siqueira, vai continuar a questionar a viabilidade da obra, mas também deve intensificar suas ações quanto ao preço que será cobrado do consumidor. "Temos todos os elementos para acreditar que vai ser mais um elefante branco. O custo é muito alto. Se essa água não for fortemente subsidiada pelo governo, ela não vai chegar a um preço viável ao cidadão", diz Siqueira.