Título: Canais para a eficiência
Autor: Cezar, Genilson
Fonte: Valor Econômico, 10/12/2010, Especial, p. F1

A demanda de recursos para universalização do acesso aos serviços de saneamento básico no Brasil é fantástica. Projeções mais otimistas indicam valores que podem alcançar R$ 270 bilhões para atingir metas de universalização de água, em 2039, e esgoto, por volta do ano 2060. Esses objetivos podem ser encurtados para 2017 (água) e 2024 (esgotos) se os patamares de investimentos forem duplicados, situando-se em torno de R$ 150 bilhões, com incremento de 30% de produtividade, admitem dirigentes de companhias estaduais de saneamento, empresários, consultores e outros agentes do setor. Para isso, há necessidade de remover alguns obstáculos que impedem um aumento no ritmo de investimentos em inovação e tecnologia, peças fundamentais para ampliação do movimento de universalização dos serviços.

"O setor de saneamento enfrenta desafios importantes que podem tornar essa trajetória para universalização muito melhor. É preciso superar o excesso de tributos, a falta de gestão e planejamento e aumentar o volume de investimentos", diz Gesner Oliveira, presidente da Sabesp, principal concessionária de serviços de saneamento do país, no seminário Tecnologia e Eficiência em Saneamento Ambiental, realizado pelo Valor, em São Paulo, dia 8 de dezembro, em parceria com a empresa. "O Brasil avançou nos últimos anos na aplicação de recursos para saneamento, mas é preciso avançar mais em tecnologia e inovação, com foco na redução de perdas, ênfase na gestão de projetos, desburocratização e planejamento no setor privado e sua articulação com o planejamento público."

As empresas privadas estão dando sua parcela de contribuição, segundo ele. Hoje, participam com 10% (14,5 milhões de habitantes) do atendimento total da população urbana brasileira, devendo atingir 30% em 2017. Mas é preciso progredir mais. "Todas as empresas de saneamento necessitam de um estímulo básico, que vem de duas fontes: de política tributária, com desoneração de impostos, e mais subsídios para investimentos com baixo retorno, privado, mas com alto retorno social. Isso propicia aumento de investimentos das empresas públicas e privadas", afirma Gesner.

Há outros desafios a vencer, de acordo com os agentes do setor de saneamento. "É preciso uma política pública nacional para o setor de saneamento", defende Dilma Pena, secretária de saneamento do Estado de São Paulo, também presente na abertura do seminário. Segundo ela, nos últimos anos, o país vivenciou muitas mudanças na área de saneamento. Foi criado o Ministério das Cidades, com uma Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, que administra os recursos provenientes do FGTS, enquanto o Ministério da Saúde cuida da gestão dos recursos do Orçamento Geral da União (OGU), e, recentemente, foi aprovada a Lei do Saneamento nº 11.445.

"A partir dessa lei e de uma decisão política de universalização é preciso construir uma política publica de saneamento, que indique qual é o subsídio que vamos praticar, quais são os incentivos que serão definidos para que os prestadores de serviços se tornem mais eficientes, com acesso a todas as fontes de financiamento, e quais as políticas de maximização de todos os recursos, a começar pela água."

Não se trata de pura retórica. O déficit do país em saneamento é imenso. Mais da metade da população continua sem acesso à coleta de esgotos, 8 milhões de brasileiros não têm acesso a banheiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Instituto Trata Brasil. Mais de 40 milhões de pessoas estão sem rede de abastecimento de água.

Além de problemas recorrentes, como os encargos tributários (o setor paga R$ 2 bilhões por ano, quase um terço do total de investimentos declarado pelas empresas), os prestadores de serviços convivem com perdas incalculáveis por conta dos precários níveis de tecnologia e gestão. "Os números de perdas são estarrecedores", diz Gesner Oliveira. "O ideal seria aumentar a produtividade dos investimentos. Projetos melhores, com tecnologia avançada e boa gestão para aumentar a eficiência do investimento. O cenário seria mais alvissareiro e poderíamos pensar em universalizar na próxima década, com a combinação de investimento e aumento de tecnologia."

Os investimentos em saneamento caíram nos últimos anos. A média anual passou de R$ 6,1 bilhões entre 1995-2002 para R$ 5,36 bilhões em 2003-2009. Grandes companhias de saneamento, como Sabesp, Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) ainda possuem melhor capacidade de investir, mas a grande maioria das concessionárias encontra dificuldade para novos projetos de expansão.

A Sabesp é a quinta maior concessionária de serviços de saneamento do mundo, com 25,6 milhões de clientes. A empresa mais do que duplicou seu volume de investimentos, passando de R$ 860 milhões em 2004 para R$ 1,7 bilhões em 2009. Só para reduzir as perdas de água, de 32% em 2006 para 26% este ano, a Sabesp está investindo R$ 300 milhões por ano.

A Sanepar também trilha com sucesso o caminho da universalização do atendimento na área de saneamento, diz Hudson Calefe, presidente da companhia. Por ano, a empresa investe R$ 500 milhões (foram R$ 3 bilhões nos últimos três anos), mas a Sanepar já atende 100% da população urbana (9,5 milhões de pessoas) com água tratada e 62% da população com coleta e tratamento de esgotos.

A empresa aposta na capacitação técnica e na especialização para aumentar a eficiência e vencer o desafio de universalizar do atendimento. Calefe considera que existem obstáculos a superar como a indisponibilidade de financiamento do governo federal para saneamento em localidades com população inferior a 50 mil habitantes e a elevada carga tributária.