Título: Palavra final caberá ao STF
Autor: Taffner, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/08/2010, Cidades, p. 29

Tendência é de que o Tribunal Superior Eleitoral confirme a decisão do TRE-DF, mas recurso do ex-governador subirá ao Supremo

Helena Mader e Adriana Bernardes

O desfecho da rejeição do registro da candidatura de Joaquim Roriz (PSC) ao Governo do Distrito Federal depende de uma decisão nacional sobre a aplicação ou não da Lei da Ficha Limpa nas próximas eleições. Na avaliação de advogados especialistas em direito eleitoral, a tendência é de que a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF) seja mantida pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que já se pronunciaram sobre a validade em outubro das regras de moralização das candidaturas como uma condição de elegibilidade.

O principal embate, no entanto, ocorrerá no Supremo Tribunal Federal (STF), onde os magistrados vão decidir basicamente entre o direito dos candidatos de concorrer e o interesse coletivo de excluir da vida pública quem está sob suspeita de irregularidades ou crimes. Na avaliação de advogados, o placar no STF será apertado. São dados como certos os votos a favor da Lei da Ficha Limpa de Carlos Ayres Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa, que é presença incerta nos julgamentos, uma vez que renovou licença médica por mais 60 dias em decorrência de problemas na coluna.

Os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Cézar Peluso, Celso de Mello e Toffoli Dias são apontados como prováveis votos contra a aplicação da Ficha Limpa nesta eleição. Ellen Gracie, que votou pela aplicação do artigo 16 da Constituição segundo o qual a lei que alterar processo eleitoral só pode ser aplicada se aprovada um ano antes do pleito quando o Supremo discutia a resolução que instituiu a verticalização nas eleições é considerada um provável voto contra a lei pelo mesmo motivo.

Para o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o TSE tem sido rigoroso. O TSE tem posição de buscar máxima efetividade da aplicação dessa lei e acredito que teremos pela primeira vez eleições em que muitas dessas pessoas que não se mostram com a menor condição de concorrer a esses cargos eletivos serão afastadas, disse Gurgel. Representantes de entidades que lutaram pela aprovação da Lei da Ficha Limpa comemoraram a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do DF.

OAB O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no DF, Francisco Caputo, disse que recebeu com muita alegria a notícia sobre a impugnação. Para ele, o mais importante agora é que o Supremo Tribunal Federal decida com rapidez sobre a constitucionalidade da lei. É essencial que o STF decida se essa lei viola ou não a nossa Constituição. Seria um grande serviço do Supremo para a sociedade. Esses recursos causam dúvidas na população, nos candidatos e nos partidos, afirmou Francisco Caputo. A segurança jurídica é um dos pilares do estado democrático de direito. A pacificação dessa questão vai economizar tempo e gastos do poder público. O MP e os tribunais perdem tempo analisando essas ações, finalizou o presidente da OAB-DF.

Para o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, Mozart Valadares, a impugnação do Roriz representa um fortalecimento da Ficha Limpa. O TSE e quatro ministros do STF já se manifestaram a favor da lei. Essa decisão deve ser comemorada por toda a sociedade. A partir de agora, as pessoas vão fazer uma avaliação mais rígida dos candidatos e os próprios partidos terão mais rigor na hora de oferecer a legenda aos concorrentes, explicou.

Acredito que teremos pela primeira vez eleições em que muitas dessas pessoas que não se mostram com a menor condição de concorrer a esses cargos eletivos serão afastadas

Roberto Gurgel, procurador-geral da República

Para saber mais

Origem popular

Diego Abreu

A Lei da Ficha Limpa surgiu a partir de um projeto de iniciativa popular, conduzido pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, que reuniu, até setembro do ano passado, mais de 1,6 milhão de assinaturas de eleitores de todo o país. Aprovada em maio pelo Senado e sancionada pelo presidente Lula no começo de junho, a nova lei prevê a inelegibilidade dos políticos condenados por órgãos colegiados. Também ficam impedidos de se candidatar aqueles que renunciaram para escapar da cassação. A inelegibilidade é de oito anos contados a partir do ano em que terminaria o mandato eletivo. A lei anterior não previa punição para casos de renúncia.

A regra também impede políticos que tiveram o mandato cassado pela Justiça Eleitoral de serem candidatos pelo período de oito anos, calculado a partir do ano em que a irregularidade foi cometida. Anteriormente, a inelegibilidade para esses casos era de apenas três anos. Em consulta respondida em junho, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definiu que a lei tem aplicação imediata e vale para casos ocorridos antes de a norma entrar em vigor.

Entre as situações que causam inelegibilidade estão listadas as condenações por abuso do poder político e econômico, em casos eleitorais; crimes contra a administração pública, contra o patrimônio privado, contra o mercado de capitais; crimes previstos na lei de falências, contra o meio ambiente e a saúde pública; abuso de autoridade, lavagem e ocultação de bens, tráfico de drogas, racismo, tortura e terrorismo; crimes contra a vida e a dignidade sexual, crimes praticados por organização criminosa; demissões de funcionários públicos após processo administrativo ou judicial e afastamento de profissionais por conselhos de classe.

Manifestações em frente ao TRE

Luiz Calcagno

Mais de 200 pessoas se reuniram ontem em frente ao Tribunal Regional Eleitoral para acompanhar a votação que barrou a candidatura de Joaquim Roriz (PSC) ao governo do DF. Apesar de a sessão só ter começado às 15h, por volta das 13h40 já havia manifestantes no local. De acordo com a Polícia Militar, o grupo era formado por aproximadamente 180 apoiadores do ex-governador e pouco mais de 60 contrários. Para conter os dois grupos, a PM enviou 52 homens. Houve tensão entre os integrantes da ala que pedia a permanência de Roriz na disputa e os que pediam a o indeferimento da candidatura. Após a decisão do TRE, um bate- boca entre membros dos dois lados precisou ser contido, mas não houve agressões.

Até as 17h, a maioria dos manifestantes era formada por rorizistas. Quando a votação começou, as informações que circulavam entre quem estava do lado de fora do prédio chegavam truncadas. Os apoiadores do ex-governador eram quase todos do Gama.

Entre os manifestantes que defendiam a candidatura de Roriz, poucos quiseram falar com a imprensa. Questionadas sobre quem teria organizado o transporte até o Tribunal Regional Eleitoral, as pessoas diziam não saber ou optavam por permanecer em silêncio. O estudante Jefferson Alves, 20 anos, morador do Gama, foi um dos poucos que concordou em falar com o Correio. O jovem estava com um grupo que gritava palavras de ordem em apoio ao ex-governador. A candidata em que eu voto está com o Roriz, por isso vamos votar nele também. Viemos dar uma força, agitar, afirmou.

Somente por volta das 16h é que os militantes e candidatos a deputado distrital do PSol e do PSTU, além de integrantes do Movimento Ficha Limpa e do movimento virtual Roriz Nunca Mais chegaram ao Memorial JK. Às 17h, o grupo saiu do monumento em direção ao tribunal munido de bandeiras, camisas e cartazes. O candidato ao Buriti pelo PSTU, Rodrigo Dantas, e Toninho do PSol, que também está na disputa, marcaram presença entre os que torciam para que Roriz tivesse o pedido indeferido.

O economista Francisco Carvalho, 30 anos, morador de Taguatinga e militante do Psol disse que o principal motivo da reunião em frente ao órgão era pressionar o TRE para que os ministros fizessem valer a Lei da Ficha Limpa.

Quando se encontraram, os grupos iniciaram um confronto de gritos pró e contra o ex-governador. Quando o julgamento chegou ao placar de três votos a zero contrários a Roriz, os ânimos se exaltaram pela primeira vez. A polícia precisou separar os dois grupos. No entanto, na terceira tentativa de conter o princípio de tumulto, foi montado um cordão de isolamento, que precisou ser mantido até ás 18h, quando os manifestantes que protestavam contra o ex-governador foram embora.

Os militantes decidiram deixar o local atendendo a um pedido do TRE para que fosse mantida uma distância mínima de 200m do órgão. O movimento foi escoltado por 13 policiais até o Eixo Monumental, para evitar confronto com os rorizistas. Enquanto comemoravam a decisão, os apoiadores do ex-governador tentavam manter o ânimo. Ainda acreditamos no Roriz. Ele vai apelar ao Supremo e vamos até o fim, garantiu o comerciante Marcos Pontes, 54 anos, morador do Gama.

A candidata em que eu voto está com o Roriz, por isso vamos votar nele também. Viemos dar uma força, agitar

Jefferson Alves, morador do Gama

Opinião do internauta

Kenneth Soares de Sousa e Silva Até que enfim a Justiça, pelo menos a eleitoral, foi feita.

Edson Silva Viva o TRE. Parabéns!

Sérgio Prado Decisão lamentável e covarde. Ganhar no tapetão é o mesmo que agredir alguém pelas costas. O que alivia neste momento é que ainda cabem recursos até chegar ao Supremo.

Antonio Seabra O TRE aplicou corretamente a Lei do Ficha Limpa.

André Ricardo Sousa É inacreditável. O TRE ser contra a democracia. Se a população quiser um candidato ou não, ela se manifestará com o voto.

Rosangela Farias Excelentíssimos senhores juízes, fico grata e ao mesmo tempo feliz, em poder acreditar que ainda há Justiça neste país. A lei tem que ser cumprida. Afinal foram milhões de brasileiros que a pediram.

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