Título: TRE barra Roriz com base na Ficha Limpa
Autor: Taffner, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/08/2010, Cidades, p. 29

Por 4 votos a 2, Justiça Eleitoral nega registro da candidatura do ex-governador, que vai recorrer e mantém campanha

O Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF) negou, na tarde de ontem, o registro de candidatura de Joaquim Roriz (PSC) ao Palácio do Buriti. Por quatro votos a dois, os juízes eleitorais resolveram enquadrar o ex-governador na Lei da Ficha Limpa. É o primeiro caso da capital da República. A defesa ingressará nos próximos dias com recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e promete recorrer até o Supremo Tribunal Federal (STF), se for preciso, para garantir a candidatura de Roriz, que promete manter sua campanha nas ruas.

O caso de Roriz foi o primeiro a ser julgado. O espaço destinado ao público no plenário estava lotado de advogados, jornalistas e curiosos. Todos interessados na primeira decisão da Corte eleitoral brasiliense sobre a aplicação da Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, que alterou a Lei Complementar nº 64, de 1990, responsável por tratar dos casos de inelegibilidade. Do lado de fora do tribunal, manifestantes cobravam a aplicação da nova norma (leia mais na página 30).

A ação de impugnação do pedido de registro de candidatura de Roriz teve três autores: o Ministério Público Eleitoral, o PSol e Júlio Cárdia (PV). A alegação era de que o candidato teria renunciado ao cargo de senador, em 2007, para fugir de cassação. A situação está prevista na alínea K do artigo segundo da lei e prevê a proibição da candidatura dos membros do Congresso Nacional que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos oito anos subsequentes ao término da legislatura.

A defesa de Roriz elencou três argumentos-base. Os advogados Pedro Gordilho e Eládio Barbosa lembraram que, de acordo com o artigo 16 da Constituição Federal, a lei que alterar o processo eleitoral só poderá entrar em vigor a um ano das eleições. Segundo eles, a norma também não poderia retroagir para condenar o candidato. A renúncia formalizada em 2007 é um ato jurídico lícito e não teria sido praticada se seu autor (Roriz) tivesse a percepção extrassensorial de que, após três anos, ela seria considerada um ato ilícito, pontuou Gordilho. Os advogados também alegaram a inconstitucionalidade do trecho em destaque da Lei da Ficha Limpa. Ele fere o princípio da presunção de inocência, disse o defensor. Houve abuso no poder de legislar, porque ele renunciou antes mesmo de ser acusado.

Corte Os argumentos da defesa foram desconstruídos um a um pelos quatro primeiros a apresentar o voto: o juiz Luciano Vasconcellos (relator); o desembargador federal Hilton Queiroz; o juiz José Carlos Souza e Ávila e o desembargador Mário Machado. Segundo os magistrados, a Lei da Ficha Limpa não altera o processo eleitoral, como prevê o artigo da Constituição, mas cria regras para autorizar a candidatura. As condições de elegibilidade são analisadas no momento do pedido de registro com base na lei vigente. Seria um contrasenso exigir algo diferente, disse Queiroz.

A maioria da Corte também afastou a possibilidade de a norma não poder ser aplicada para casos ocorridos antes de ela existir. A lei trata de renúncia após o oferecimento de representação que ofereça perigo de cassação e não exige a abertura de processo, disse o procurador regional eleitoral, Renato Brill de Góes. Nenhum parlamentar renuncia ao cargo se não for por motivos contundentes, ponderou o Mário Machado. Para ele, Roriz deve ser considerado inelegível até 2022 oito anos após o fim do mandato no Senado.

Em outro momento, o relator lembrou que a presunção de inocência só vale para ações criminais. Ninguém é considerado culpado, porque não há a aplicação de pena, afirmou Vasconcellos. Também não se pode falar de inconstitucionalidade, porque a lei complementar foi devidamente aprovada e deve ser respeitada, completou. Os juízes eleitorais Evandro Pertence e Raul Sabóia votaram a favor da aprovação da candidatura do ex-governador. A renúncia foi legítima e, agora, o caso não pode ser revolvido para aplicar a inelegibilidade, argumentou Sabóia.

Não se pode falar de inconstitucionalidade, porque a lei complementar foi devidamente aprovada e deve ser respeitada

Luciano Vasconcellos, juiz-relator da ação de impugnação contra Joaquim Roriz

Memória

O cheque e a bezerra

Em 28 de junho de 2007, o PSol apresentou representação contra o então senador Joaquim Roriz (na época no PMDB) no Senado Federal. O partido se baseou no vazamento de uma conversa telefônica, interceptada pela Operação Aquarela, na qual o ex-governador tratava com o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB) Tarcísio Franklim de Moura sobre a partilha de um cheque de R$ 2,2 milhões, emitido pelo empresário Nenê Constantino. A alegação foi de suspeita de negócios espúrios. Para fugir de uma possível cassação devido a um clima político desfavorável a ele, Roriz deixou o mandato em 4 de julho do mesmo ano. Segundo o ex-governador, a conversa particular tratava de um empréstimo pessoal para a compra do embrião de uma bezerra. (RT)