Título: Levar mais água para grandes municípios até 2015 custa R$ 9 bi
Autor: Borges, André
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2011, Especial, p. A16

As restrições de abastecimento de água, problema crônico do semiárido, poderão virar rotina nos grandes centros urbanos do país caso não seja feito um investimento pesado em infraestrutura hídrica e em redes de esgoto nos próximos quatro anos. O diagnóstico é do Atlas Brasil, estudo da Agência Nacional de Águas (Ana) que mapeia a gestão da água no país, suas limitações e as obras necessárias para garantir o abastecimento da população nos próximos anos.

Hoje, quase a totalidade dos principais aglomerados urbanos do Brasil - capitais e regiões metropolitanas com população superior a 1 milhão de habitantes - precisa de investimentos para a ampliação da oferta de água, incluindo o aproveitamento de novos mananciais e a adequação dos atuais sistemas produtores. O levantamento mostra que, até 2015, 55% dos municípios brasileiros (3.059 cidades) poderão ter problemas com abastecimento. O investimento total para evitar o transtorno nessas cidades é de R$ 22,3 bilhões. Boa parte desse recurso - R$ 9,6 bilhões (43% do total para o país) - teria de ser destinado a obras de 256 cidades que hoje concentram quase a metade da população do país.

O peso dos projetos dos grandes centros urbanos, afirma Sérgio Ayrimoraes, superintendente-adjunto de Planejamento da Ana, está atrelado à necessidade desses municípios em terem de buscar mananciais cada vez mais distantes para alimentar seus sistemas, o que amplia a complexidade da infraestrutura hídrica para atender a população. "Os grandes centros têm recursos financeiros, mas falta tomada de decisão. Acessar um novo manancial é uma ação de longo prazo, que depende de estudos ambientais e de negociações políticas, por isso é necessário acelerar os projetos", comenta.

A busca por novas fontes de água, segundo o relatório, é mais comum nas regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e Baixada Santista, além de capitais como Curitiba, Fortaleza, Recife, Natal, João Pessoa, Maceió e Palmas, além do Distrito Federal. Nessas áreas, o investimento atinge R$ 4,3 bilhões (19% dos recursos) para obras em 67 municípios.

A região Sudeste, que concentra as cidades mais populosas do país, consome hoje 47% do abastecimento nacional de água. Dada a situação atual da infraestrutura hídrica na região, 44% de seus 1.668 municípios terão problemas de acesso à agua até 2015 caso não haja uma intervenção pesada no setor. Ao todo, 647 municípios da região requerem ampliação de infraestrutura. Outras 83 cidades só poderão ser abastecidas com a abertura de novos mananciais.

O Estado de São Paulo, que responde sozinho por 50% do consumo da região Sudeste, precisa de R$ 5,4 bilhões de investimento, cifra equivalente a 24% de todos de recursos previstos para todo o país. Desse total, R$ 4 bilhões precisam ser injetados na região metropolitana do Estado. Com 39,5 milhões de habitantes e 645 municípios, o Estado paulista tem 414 cidades em condições satisfatórias de fornecimento de água, mas 154 requerem adequação dos sistemas de produção. Em outras 74 cidades, a única saída são novos mananciais.

Do total de municípios brasileiros, 47% são abastecidos exclusivamente por mananciais superficiais, 39% por águas subterrâneas e 14% por uma rede mista, com os dois tipos de mananciais. Entre os grandes centros do país, 73% são abastecidos predominantemente por mananciais superficiais. Entre as capitais, apenas Boa Vista, em Roraima, Maceió, em Alagoas, Natal, no Rio Grande do Norte, e São Luís, no Maranhão, têm a maior parte do abastecimento dependente de poços.

"Olhando para os dados nacionais, o que percebemos é que, desde 2005, o panorama ficou estável, ou seja, não melhorou", diz Sérgio Ayrimoraes. "Com as projeções de crescimento do país para os próximos anos, os problemas de abastecimento tendem a se agravar se nada for feito", alerta Ayrimoraes.

Em 2005, segundo a agência, a demanda média de água para abastecimento urbano no Brasil era de 494 metros cúbicos (m3 /s) por segundo. Em 2015, esse volume deverá saltar para 570 m3 /s, atingindo 630 m3 /s em 2025.

Além dos gastos previstos para obras de melhoria de estrutura e ampliação de mananciais, a Ana mediu o custo de obras para coleta e tratamento de esgotos relacionadas diretamente aos mananciais. A conta soma outros R$ 47,8 bilhões. Isso significa que, se o país quiser ter uma estrutura adequada para tratamento e oferta de água à população até 2015, terá de desembolsar R$ 70 bilhões. A execução dessas obras, no entanto, depende de uma profunda articulação política.

O estudo da Ana não é um plano de governo. Embora chegue a detalhar as necessidades de cada município do país e quais seriam as ações para saná-las, o relatório limita-se a ser um diagnóstico do setor. "O objetivo central do estudo é induzir à ação, à execução dos projetos, é um instrumento de estímulo que agora depende de entendimentos entre os diferentes níveis de governo, agências e empresas públicas e privadas", diz Ayrimoraes.

Por meio de nota, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, informou que o estudo vai ajudar o país a "identificar os gargalos e carências de várias regiões, os conflitos vivenciados nos grandes centros urbanos pelas mesmas fontes mananciais e a avaliar suas infraestruturas para atender adequadamente ao abastecimento público".

"O que estamos propondo, ainda, é a ação articulada e integrada entre União, Estados e municípios, e entre os setores de recursos hídricos e de saneamento, para o sucesso das alternativas propostas, das quais dependem, em grande parte, a sustentabilidade urbana, econômica e ambiental das cidades, grandes e pequenas", disse Izabella.