Título: Marina de viés nuclear
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 12/08/2010, Política, p. 2

Eleições 2010

Concessão de licenças para ações relativas à geração de energia atômica foi recorde na gestão da candidata do PV no ministério

A gestão da candidata do PV à Presidência, Marina Silva, no Ministério do Meio Ambiente (MMA) foi a que mais concedeu licenças ambientais para atividades relacionadas à geração de energia nuclear, entre janeiro de 2003 e maio de 2008. O Correio analisou todas as licenças concedidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ¿ órgão subordinado ao MMA ¿ durante os dois governos de Fernando Henrique Cardoso (entre 1995 e 2002) e as duas gestões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (desde 2003). Durante os cinco anos e quatro meses da gestão de Marina, o Ibama liberou mais do que o dobro de licenças para empreendimentos nucleares, se comparadas aos oito anos de FHC, e cinco vezes mais do que as autorizações concedidas pelo ex-ministro Carlos Minc e pela atual titular da pasta, Izabella Teixeira, em dois anos e três meses.

As licenças para atividades ligadas de alguma forma à geração de energia nuclear são maioria durante a administração de Marina em termos absolutos e proporcionais. Na gestão dela, o Ibama concedeu 96 licenças para transporte de resíduos radioativos, para centros de pesquisa nuclear e para geração de energia nuclear. Esse quantitativo corresponde a 6,4% de todas as licenças ambientais do período. Os dois governos de FHC liberaram 43 autorizações ¿ 6,1% do total ¿ para o mesmo fim. Minc e Izabella, sucessores de Marina, concordaram com 18 licenças ambientais do Ibama ¿ 1,7% do total ¿ para transporte de resíduos, indústrias e geração de energia.

Grande parte das licenças concedidas pelo Ibama na gestão de Marina refere-se ao transporte de fontes radioativas, principalmente saindo e chegando das usinas nucleares de Angra 1 e 2, no Rio de Janeiro. Também foi autorizada a ampliação de depósitos de rejeitos radioativos.

Apesar de ter liberado empreendimentos de energia nuclear quando era ministra, Marina costuma se posicionar contrariamente à geração desse tipo de energia na campanha pela Presidência. Em entrevista em Salvador (BA), em 31 de maio, a candidata foi questionada sobre o ¿preconceito¿ em relação à energia nuclear. ¿Tenho uma posição contrária em relação a isso e não acho que seja preconceito¿, respondeu. Marina ressaltou que não há ¿alternativas tecnológicas¿ para os resíduos nucleares. É essa uma das principais preocupações dos ambientalistas em relação à energia nuclear. ¿É uma energia cara e não segura. É melhor investir em energias que ainda são caras, mas seguras, como a eólica, a da biomassa, a solar¿, disse a presidenciável.

Transgênicos Também durante a gestão de Marina no MMA, o Ibama concedeu licenças para nove usinas termoelétricas, as mais poluentes fontes de energia. A exploração de petróleo, outra fonte suja de energia, teve 237 licenças no período, quantidade maior do que as autorizações concedidas durante os governos de FHC e as gestões de Carlos Minc, que sucedeu Marina, e Izabella Teixeira, atual ministra do Meio Ambiente.

O período de Marina à frente do MMA foi o único em que oito licenças foram concedidas para a exploração de organismos geneticamente modificados, os transgênicos. Entre as empresas beneficiadas estão a Basf, a Syngenta e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Marina pediu demissão do governo Lula em maio de 2008, depois de embates com a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, candidata do PT à Presidência. As duas divergiam sobre as concessões de licenças ambientais. Atrasos nas concessões foram apontados como obstáculos para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), capitaneado por Dilma. O estopim foi a demora para as licenças das usinas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia.

Na campanha pela Presidência, Marina sustenta que sua saída do governo não se deu em razão da polêmica das licenças, mas por divergências quanto à política de combate ao desmatamento da Amazônia. Em média, Marina concedeu 23 licenças por mês. Após deixar o MMA, o índice passou a ser de 38,2 ¿ aumento de 66%.

Coerência Na opinião de um dos coordenadores da campanha presidencial de Marina, Bazileu Margarido Neto, as licenças ambientais concedidas na área nuclear durante a gestão da senadora não se referem só à geração de energia nuclear. ¿As licenças foram para indústrias que já estavam em funcionamento e, no caso das autorizações para transporte, não se tratava apenas de usinas nucleares¿, diz o ex-presidente do Ibama.

A atual titular do ministério, Izabella Teixeira, considera que o ministro não tem ¿influência¿ na concessão de licenças. Mas, segundo ela, o aumento das autorizações pelo Ibama nas gestões seguintes à de Marina é o resultado de uma ¿dinâmica de modelo gerencial mais eficiente¿.

Mensalão foi erro de ¿minoria¿ Depois de visitar uma ONG que oferece atividades esportivas a crianças órfãs em São Paulo, a candidata do PV à Presidência, Marina Silva, voltou a falar sobre o mensalão, tema abordado na entrevista que ela concedeu à TV Globo na terça. Questionada se teria demorado a se manifestar contra o episódio, a candidata disse simplesmente que houve ¿erro¿ de poucos. ¿Ali foi uma minoria que errou, está sendo investigada e deve ser punida¿, disse a senadora, que, na época do mensalão, era ministra do Meio Ambiente, ainda filiada ao PT. Os envolvidos no mensalão são réus em ação penal que tramita no STF.

Tenho uma posição contrária em relação a isso e não acho que seja preconceito¿

Marina Silva, candidata à Presidência, contra o foco nos investimentos na geração de energia nuclear