Título: Time dos puxadores de voto
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 27/08/2010, Política, p. 3

O capital político de uns e a ação de protesto de outros fazem com que candidatos tenham boas chances de eleger aliados na Câmara por tabela

Sobre uma parcela pequena de candidatos repousa grande parte das esperanças de partidos políticos elegerem bancadas expressivas nas eleições de outubro. Os chamados puxadores de votos costumam ter os melhores números, recursos abundantes para campanha, apoio político irrestrito. Tudo isso para encararem o crivo das urnas e, com suas votações individuais pujantes, carregarem para a Câmara dos Deputados vários outros colegas de coligação bem menos votados.

Na lista dos potenciais puxadores de 2010 há ex-governadores e ex-prefeitos, celebridades, fichas sujas. Cada um pode representar um número indefinido de assentos a mais no parlamento para as coligações que os acolheram. Em 2006, por exemplo, o campeão de votos para a Câmara foi o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), que amealhou 739.827 votos e carregou consigo, entre outros, Aline Corrêa (PP-SP), que conseguiu um lugar na Casa com apenas 11 mil votos. Sem Maluf, que foi impossibilitado de concorrer este ano pela Lei da Ficha Limpa, o PP deve ter desempenho pífio em São Paulo.

Os partidos fizeram apostas variadas para tentar multiplicar as bancadas. O PT deve ter como puxador mais expressivo o ex-prefeito de Recife João Paulo. Inicialmente candidato ao Senado, ele teve de abandonar a disputa, preterido pelo partido. Candidato à Câmara dos Deputados, deve ser o mais votado de Pernambuco. Também com carreira política consolidada, ACM Neto (DEM-BA) carrega a expectativa do Democratas em montar uma bancada forte no estado. A legenda espera que ele repita o desempenho de 2006 e seja o mais votado do estado.

No Rio de Janeiro, o campeão dos votos será, possivelmente, o ex-governador Anthony Garotinho (PR-RJ), caso se confirme a expectativa dos partidos. Ele teve os direitos políticos cassados por abuso de poder político nas eleições de 2008, foi condenado a dois anos e meio de prisão por formação de quadrilha durante a semana, mas, por meio de recursos judiciais, segue no páreo. Logo atrás dele, deve vir o atacante do tetra Romário, celebridade que é esperança do PSB para tentar eleger parlamentares em massa no Rio de Janeiro.

Além do apoio dos fãs, o ex- atacante da Seleção pode receber o chamado voto de protesto, que costuma provocar fenômenos eleitorais. Nessa mesma onda, Enéas Carneiro (Prona) conseguiu 1,5 milhão de votos em 2002 e trouxe consigo mais cinco deputados da legenda. Pior, um rinoceronte, apelidado de Cacareco, foi o mais votado para vereador de São Paulo em 1958 embora não fosse candidato por motivos óbvios. Amparados pelas votações de protesto, políticos com ficha pouco limpa acabam conseguindo lugar na Câmara.

Mensalão

Maior candidato a deputado de protesto nas atuais eleições, Tiririca (PR-SP) pode acabar carregando, com uma votação expressiva, personagens célebres do mensalão, como Valdemar da Costa Neto (PR-SP) e José Genoíno (PT-SP) os dois coligados com o humorista. Para especialistas políticos, o fenômeno dos puxadores tem raiz no sistema eleitoral capenga do país. Medidas como o voto por distrito ou as listas fechadas ajudariam a reduzir essas ocorrências, mas isso só pode ser discutido em um debate mais amplo, que evite não apenas essa, mas várias patologias da política brasileira, aponta a cientista política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Rosemary Segurado.

O voto distrital regionalizaria ainda mais eleições, já que dividiria o número de vagas no parlamento não por estado, mas por bairro e cidade no caso das menores. Eleições como as do Brasil são raras no planeta, porque nosso voto é aberto, não há qualquer regionalização e a representação da população no parlamento fica irreal. Agora, querer consertar isso sem reformar o sistema político como um todo é simplesmente impossível, atesta o cientista político da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas.

Mercadante tenta enquadrar Tiririca Aloizio Mercadante perdeu a paciência com o descompromisso de Tiririca. O candidato do PT ao governo de São Paulo se incomodou com o uso de sua imagem no programa eleitoral do humorista, que concorre a vaga na Câmara. O petista afirmou que não admitirá seu nome vinculado a candidaturas sem proposta. Ou o candidato tem discurso sério ou o meu nome sai da tela, disse. No horário eleitoral, Tiririca pergunta: O que faz um deputado federal? Na realidade, não sei. Mas vote em mim que eu te conto.

O voto por distrito ou as listas fechadas ajudariam a reduzir essas ocorrências

Rosemary Segurado, cientista política da PUC-SP

O número 1,5 milhão Número de votos que elegeram Enéas Carneiro e mais cinco deputados do Prona em 2002

Força nas urnas

Conheça o perfil de alguns políticos que, com votação expressiva, podem eleger outros colegas de coligação

ACM Neto (DEM-BA) Único herdeiro direto do ex-senador Antônio Carlos Magalhães na política, foi o deputado federal mais bem votado da Bahia em 2006. A expectativa é de que amealhe cerca de 500 mil votos.

Anthony Garotinho (PR-RJ) Se a Justiça permitir, caminha para ser o mais bem votado entre os que disputam uma vaga na Câmara dos Deputados pelo Rio de Janeiro.

João Paulo (PT-PE) O ex-prefeito de Recife perdeu a indicação do partido para o Senado, mas deve ser recompensado com a maior votação do estado para a Câmara.

Rodrigo Maia (DEM-RJ) Deve receber parte dos votos de Índio da Costa (DEM) e Fernando Gabeira (PV), que deixaram a disputa. Com o pai, César Maia (DEM), favorito ao Senado, é a aposta dos democratas no Rio de Janeiro.

Romário (PSB-RJ) Como toda celebridade, o artilheiro do tetra ainda tem uma incógnita sobre o seu desempenho. O mais provável é que seja um dos grandes puxadores de votos das eleições.

Tiririca (PR-SP) O humorista entra na campanha como um dos maiores candidatos a Cacareco destas eleições. Faz piadas, se autodeprecia e pode repetir o fenômeno do voto de protesto, que elegeu Clodovil Hernandes em 2006.