Título: Argentina limita exportação de trigo para conter inflação
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 19/05/2006, Internacional, p. A9

O governo argentino informou ontem ter chegado a um acordo com exportadores para limitar as vendas do trigo ao exterior. A queda da safra este ano deve fazer com que a oferta não seja suficiente para atender à demanda interna e às exportações. E o governo quer evitar que o preço suba no país.

Segundo a Secretaria de Agricultura, os exportadores aceitaram "auto-regular-se", limitando os embarques de trigo ao máximo de 7 milhões de toneladas.

"Das 7 milhões de toneladas contratadas, já foram embarcadas 4 milhões, e acreditamos que os 3 milhões que faltam serão suficientes para atender a demanda externa", disse ao Valor Patricio Lamarca, chefe de Gabinete da Secretaria de Agricultura. Segundo as suas estimativa, mais de 90% do produto tem como destino o mercado brasileiro.

Para Lamarca, a "auto-regulação" foi proposta pelos próprios exportadores em reunião realizada ontem com a ministra da Economia, Felisa Miceli, e o secretário de Agricultura, Miguel Campos. Segundo ele, "o setor entendeu" que, ao menos por enquanto, não devem ser fechados novos contratos de exportação de trigo além dos que já foram concluídos. A situação será reavaliada em dois meses. Lamarca disse também que o cumprimento do compromisso será fiscalizado pela secretaria.

O acordo foi feito depois de a imprensa local ter dito ontem que o governo estudava medidas para limitar as exportações de trigo. As autoridades argentinas querem impedir uma queda na oferta, para evitar repercussões sobre os preços de produtos de consumo básico - como pão e macarrão - e, consequentemente, sobre o índice de inflação.

A estratégia oficial para evitar um crescimento da inflação, que no ano passado chegou a 12,3% e nos quatro primeiros meses do ano acumula 3,9%, tem sido pressionar produtores e comerciantes a aceitar acordos que mantenham o preço de seus produtos congelados. Uma das ações oficiais mais questionadas foi a proibição por seis meses das exportações de carne.

No caso do trigo, o governo entrou em estado de alerta depois de um aumento forte nas duas últimas semanas dos contratos de exportação. A cifra de 7 milhões de toneladas, o total dos contratos já concluídos, é considerada pelas autoridades como limite do saldo exportável para que o mercado interno não fique desabastecido e gere pressão de alta sobre o preço da farinha.

O maior comprador do trigo argentino é o Brasil. Espera-se que as restrições aos embarques não impacto sobre o abastecimento, mas devem provocar altas de preço (leia texto abaixo).

Nos últimos dias, os rumores de que as exportações sofreriam algum tipo de restrição vinham provocando alta no preço internacional do grão. Ao mesmo tempo, geraram uma "corrida" dos exportadores para fechar contratos antes que alguma restrição fosse de fato anunciada.

Neste ano, a Argentina teve uma quebra importante na safra de trigo por causa de problemas climáticos e da redução da área plantada. Estima-se que o país tenha colhido 12,5 milhões de toneladas, em comparação com as 16 milhões de toneladas obtidas na safra anterior.

Alguns analistas estimam que os sinais de interferência oficial sobre o setor podem desestimular os produtores, que estão iniciando nos próximos dias o plantio da próxima safra de trigo, o que diminuiria ainda mais a área cultivada e a produção.