Título: Ao apagar das luzes
Autor: Silveira, Igor
Fonte: Correio Braziliense, 16/09/2010, Brasil, p. 12

Em meio a uma das piores secas do país, governo lança plano de controle do cerrado a menos de quatro meses do fim da administração Lula. Projeto consiste em trabalho de convergência dos órgãos e na ampliação do monitoramento

O microfone instalado no púlpito do Salão Leste, no Palácio do Planalto, falhou três vezes, na tarde de ontem, durante o discurso da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. A pane foi causada por quedas de energia na Esplanada dos Ministérios, culpa de um incêndio que atingiu a subestação Brasília Norte, na região do Parque Nacional de Brasília. Ironicamente, a ministra anunciava, ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o lançamento do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado). A medida tem o objetivo de reduzir a degradação no bioma, que ocupa 24% do território nacional, além de procurar alternativas de uso sustentável dos recursos naturais.

Lançado a pouco menos de quatro meses para o término da gestão de Lula, o plano não só traça metas para o próximo ano, mas também traz um projeto para a redução das emissões provenientes do desmatamento em, pelo menos, 40% até 2020. De acordo com a ministra do Meio Ambiente, as áreas prioritárias de atuação do PPCerrado incluem os municípios mais desmatados entre 2002 e 2008, regiões consideradas de alta prioridade para a biodiversidade e as localidades de maior relevância para a conservação dos recursos hídricos.

Para isso, Izabella Teixeira anunciou a capacitação de 4,5 mil brigadistas do Instituto Brasileiro no Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), fiscalizar mais rigorosamente rodovias e entroncamentos. A importância do plano é a convergência de vários órgãos. É um passo para a implementação do compromisso da Política Nacional de Mudanças Climáticas. A partir de agora, como é feito na Amazônia, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) também vai monitorar o desmatamento no cerrado e estamos ampliando a rede de combate às queimadas neste bioma, afirmou Izabella.

Prevenção

A ministra criticou os proprietários de terra que ainda utilizam queimadas para a renovação da área de plantio e a falta de fiscalização dos donos de propriedades no sentido de evitar incêndios. De acordo com a ministra do Meio Ambiente, o PPCerrado vai apertar o cerco contra esse tipo de crime ambiental.

Vamos ter uma nova estratégia de fiscalização das queimadas no cerrado, com equipe de inteligência. O plano vai funcionar com uma coordenação de combate a crimes ambientais contando com a ajuda de órgãos como a Força Nacional de Segurança, a Agência Brasileira de Inteligência e a Polícia Federal, ressaltou a ministra. Os que forem pegos provocando queimadas serão punidos. Para isso, vamos utilizar os laudos periciais feitos pelo Corpo de Bombeiros. Além das multas, eles serão processados criminalmente, completou.

Os investimentos do PPCerrado também serão direcionados, segundo Izabella, para programas de agricultura familiar e para os assentamentos por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

"Vamos ter uma nova estratégia de fiscalização das queimadas no cerrado. O plano vai funcionar com uma coordenação de combate a crimes ambientais

Izabella Teixeira, ministra do Meio Ambiente

Nos eixos

Para o pleno funcionamento do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado), o governo vai trabalhar com ações em três eixos temáticos e um tema transversal.

a) Monitoramento e controle

Aprimorar o monitoramento da cobertura florestal no bioma cerrado

Fortalecer a fiscalização integrada do desmatamento em áreas especiais (UC e TI) e prioritárias para a conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos

Aprimorar a prevenção e o controle das queimadas e incêndios florestais

Fortalecer o Sisnana para a gestão florestal

b) Áreas protegidas e ordenamento territorial

Criar e consolidar Unidades de Conservação, e demarcar e homologar as terras indígenas

Fomentar o planejamento territorial do bioma

c) Fomento às atividades produtivas sustentáveis

Fomentar a plantação de florestas energéticas, como meio de reduzir a pressão sobre a vegetação nativa do cerrado para produção de carvão vegetal (a ser alcançado em sinergia com o Plano da Siderurgia carvão vegetal)

Fomentar o manejo florestal de espécies nativas e ampliar o plantio de florestas para fins produtivos (a ser alcançado em sinergia com o plano da agricultura)

Aumentar a produtividade das áreas subutilizadas, degradadas e abandonadas, evitando a abertura de novas áreas (a ser alcançado em sinergia com o plano da agricultura)

Ampliar e qualificar a assistência técnica e a extensão rural em modelos de 77 produções sustentáveis

Estimular a comercialização e o consumo de produtos da sociobiodiversidade

Recuperar áreas degradadas, contando inclusive com o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto

Tema transversal: educação ambiental

Fortelecer a educação ambiental e a valorização do bioma cerrado

Cerimônia esvaziada

A ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, era uma das representantes do Poder Executivo mais entusiasmadas com o PPCerrado antes do início das denúncias por tráfico de influência. No início da manhã de ontem, a agenda da chefe da pasta confirmava a presença dela na cerimônia à tarde, que, incialmente, seria fechada, em uma sala de audiências no Palácio do Planalto. No entanto, depois que a assessoria da Presidência da República confirmou a realização do evento no Salão Leste, aberta para o público e para a imprensa, uma nova versão da agenda de Erenice foi divulgada: no lugar do compromisso com Lula e com a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, apareceu uma reunião com o secretário executivo executivo da Casa Civil, Carlos Eduardo Esteves Lima.

Izabella Teixeira foi questionada sobre a ausência de Erenice Guerra no lançamento do PPCerrado. A ministra do Meio Ambiente informou que não sabia o porquê de a ministra-chefe da Casa Civil não ter aparecido, mas defendeu a participação de Erenice no projeto. Eu lamento (a ausência da ministra). Erenice foi uma grande parceira nesse projeto. Não sei o motivo da ausência, mas é importante registrar que ela se dedicou muito. Lula também parecia incomodado no evento. O presidente não discursou e deixou a cerimônia apressadamente, sem falar com a imprensa. (IS)