Título: Construtoras se armam para disputa de aeroportos
Autor: Pupo,Fábio
Fonte: Valor Econômico, 06/01/2012, Empresas, p. B1

A um mês da esperada concessão de aeroportos do governo federal, companhias de menor porte reúnem armas para enfrentar a força das grandes empreiteiras. Segundo especialistas, empresas com pouca experiência em grandes obras podem - de acordo com a forma com que se organizem - ganhar flexibilidade para surpreender ao dar lances no leilão que passará à iniciativa privada os aeroportos de Guarulhos, Campinas e Brasília em 6 de fevereiro. Enquanto percebem a movimentação dos concorrentes, grandes grupos temem a vitória do que já chamam de "aventureiros".Com R$ 733 milhões de receita líquida (o equivalente a 4,5% da receita da Construtora Norberto Odebrecht, a maior no Brasil), a construtora mineira Fidens Engenharia é um exemplo de empresa de menor porte que pretende disputar o processo. Para cumprir o requisito da experiência em operação aeroportuária, exigido pelo governo em edital, entrará no processo junto com a americana ADC & HAS - operadora que já trabalhou em conjunto com a Andrade Gutierrez em outros projetos e chegou a conversar com a Odebrecht.

Segundo Nilton Chaves, gerente de novos negócios da Fidens, a empresa pretende apresentar preços competitivos na disputa - vence o consórcio que ofertar o maior valor pago ao governo em troca da outorga do aeroporto. Perguntado sobre como conseguirá chegar às altas ofertas, Chaves responde que a empresa tem o diferencial de poder "economizar" nas obras. Mesmo assim, ele rejeita a definição de "aventureiro" afirmando que a companhia está reunindo os conhecimentos necessários. "Estamos nos preparando. Quando mineiro fica muito calado, é sinal de que está aprontando alguma".

Para injetar capital no negócio e poder oferecer boas propostas no leilão, a Fidens também negocia a entrada de um fundo de investimento da gestora sul-africana Old Mutual na sociedade.

Para o advogado e especialista em direito aeronáutico Guilherme Amaral, dependendo da forma como se articulam com outros grupos - como fundos de investimento -, empresas menores podem ganhar capital para ofertas mais ousadas. Também pode influir, comenta, o fato de empresas com mais experiência em grandes obras estarem mais limitadas por regras internas de risco e retorno sobre investimentos. Por isso, diz, é possível que haja surpresas no leilão. "Pode haver uma empresa grande, mas limitada pelas próprias regras, e outra pequena, ávida por risco e disposta a tomá-lo". Foi isso que ocorreu no Aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN), primeiro federal a ser concedido, quando empresas não tradicionais no cenário da infraestrutura dominaram a disputa - a maior em faturamento, a Triunfo, só ofereceu uma proposta. Três grupos de médio porte seguiram adiante em quase 90 lances (o ágio final sobre o valor mínimo ficou em 228%).

A advogada Cláudia Bonelli, sócia na área de direito administrativo, regulatório e PPPs do escritório TozziniFreire, concorda com a ideia. Para ela, empresas menores podem ter mais flexibilidade para a disputa. "As maiores se cercam de técnicos e consultores, têm um plano mais estruturado e buscam uma certa taxa de remuneração, dizendo que a partir de certo momento [dos lances] o negócio não compensa. Já as de menor porte podem ter mais flexibilidade para as propostas mais ousadas, caso tenham sociedades com força de capital", diz a especialista.

Entre os grupos menos tradicionais, está também o fluminense MPE (receita líquida de R$ 935 milhões) - que concorreu pelo leilão do aeroporto do Rio Grande do Norte. A companhia pretendia participar da nova disputa com a mineira ARG e a baiana Global, mas foi surpreendido por uma regra do edital que exige experiência de pelo menos cinco anos em aeroportos de grande porte. Agora, busca um operador para uma parceria.

O grupo Galvão, com um faturamento mais alto (R$ 2 bilhões, aproximadamente), mas com pouca experiência em concessões, é outro interessado. Em entrevista ao Valor em novembro, o presidente do conselho de administração, Dario Galvão, afirmou que há uma parceria para análise técnica dos projetos com a alemã Flughafen München GmbH, operadora do aeroporto de Munique. As duas ainda estudam as regras para a concessão dos terminais. Além disso, há o grupo Engevix (R$ 1,27 bilhão de receita líquida), que arrematou o aeroporto nordestino e estuda as novas concessões com a argentina Corporación América.

O que mais pode limitar a participação de grupos, menores ou maiores, é o alto valor de investimentos exigido pelos projetos. A Triunfo Participações e Investimentos já alavancada por um grande número de empreendimentos (a dívida líquida sobre Ebitda está em 3,32, o que chama atenção de analistas, embora alguns acreditem que 3,5 ainda seja tolerável), chegou a disputar o leilão do aeroporto nordestino - mas só ofereceu um lance. Carlo Alberto Bottarelli, presidente da Triunfo, disse, durante apresentação dos resultados da empresa do terceiro trimestre, que a empresa mantém o plano de participar de novas concessões, tanto em rodovias como aeroportos. No entanto, "sempre de maneira responsável" - ressalta em texto divulgado.

Ajudam as menores o fato de os investimentos na infraestrutura contarem com ajuda do BNDES, que financiará até 70% - segundo o próprio governo. Além disso, o valor da outorga poderá ser parcelado. O lance mínimo definido pelo governo é de R$ 3,42 bilhões para Guarulhos, R$ 1,47 bilhão para Campinas e R$ 582 milhões para Brasília.

Grandes empresas estão preocupadas especialmente com o que chamam de "aventureiros". Seria uma definição para companhias com pouca experiência que entram no processo a todo custo, mas que depois enfrentam dificuldades para entregar as obras e outras exigências do contrato com o governo. "É um demérito desnecessário chamar de aventureiro. Quem entrar no leilão, tem que comprovar uma série de especificações", diz Amaral.

Entre as empreiteiras tradicionais, é dada como certa no mercado a participação da Odebrecht Transport. Segundo o Valor apurou, a empresa está finalizando estudos e, se decidir disputar os projetos, participará com a Changi - operadora de Cingapura. Também é dada como certa a participação de grupos como Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa (via CCR) e CR Almeida (via EcoRodovias em parceria com Fraport).