Título: Acordo para a dívida grega pode ser apenas transitório
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Fonte: Valor Econômico, 14/02/2012, Opinião, p. A10

É uma questão em aberto estimar quanto tempo de relativa calmaria terão os mercados após a dramática aprovação pelo Parlamento grego do novo plano de austeridade na madrugada da segunda-feira.

Alguns pontos duvidosos no acordo não autorizam uma aposta cega em um final feliz. Um problema sério é a resistência dos gregos, previsível diante da impopularidade das medidas mas que surpreendeu pela combatividade, que culminou com os protestos do domingo. A economia grega está no quinto ano de recessão e o desemprego chega perto de 20%. O plano aprovado prevê mais austeridade e sacramentou ajuste de € 3,3 bilhões. Seus pontos mais polêmicos são o corte de € 300 milhões em pensões e a redução de 22% no salário mínimo. Cerca de 150 mil empregos serão extintos nos próximos três anos.

O primeiro-ministro Lucas Papademos tentou convencer o Parlamento e o povo gregos apelando para o bem e para o mal. Se o plano não fosse aprovado, disse, a alternativa seria o calote desastroso. Com o plano, prometeu, a economia deverá voltar a crescer no próximo ano; terá uma expansão de 2,5% a 3% em 2014; e o emprego voltará a aumentar por causa da redução do salário mínimo.

Fora do Parlamento, uma multidão estimada em 25 mil pessoas pela polícia não parecia confiar nesses números a julgar pelas depredações feitas. Dentro do próprio Parlamento, a votação mostrou que o apoio político ao plano é instável. Esperava-se que tivesse aprovação integral da bancada dos dois partidos da coalizão do governo, os socialistas do Movimento Socialista Pan-Helênico e os conservadores da Nova Democracia, que somariam 236 votos do total de 300 assentos do Parlamento. O plano acabou aprovado, mas por 199 votos a favor, 74 contra e 22 abstenções. Houve defecções de todos os lados e o apoio inesperado de dois membros do nacionalista Laos, que deixou a coalização na sexta-feira.

Os dois partidos da coalizão terão que se comprometer por escrito a implementar o programa integralmente, independentemente de quem ganhar as eleições gerais de abril. A exigência da assinatura reflete a desconfiança da troica, formada pela União Europeia, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Central Europeu (BCE), em relação à Grécia, que já maquiou contas fiscais e mostrou dificuldade em cumprir as reformas fiscais e estruturais acertadas no pacote anterior. Aprovado em 2010, o primeiro pacote de ajuda garantiu € 110 milhões para Atenas e seria suficiente para cobrir as necessidades de financiamento do país até 2015. Não foi. Desta vez, o pacote é maior, de € 130 bilhões, mas há quem diga que também será insuficiente.

Os líderes da zona do euro vão se reunir amanhã para discutir os pré-requisitos a serem cumpridos pela Grécia para a liberação dos recursos, o que só deve ocorrer em março. Isso significa que a pressão continuará alta porque o governo grego terá que resgatar € 14,4 bilhões em títulos soberanos e não tem nenhum centavo para isso.

Espera-se que a aprovação do novo acordo permita a retomada da negociação com os credores privados, que ficou empacada há algumas semanas e envolve a reestruturação voluntária de € 200 bilhões em dívidas soberanas, com o apreciável desconto de 50% que políticos gregos desejariam que fosse maior.

Mas a troica também gostaria que o ajuste grego fosse maior. Na quinta-feira quase todo o esforço de negociação foi posto a perder quando se exigiu da Grécia mais € 325 milhões em cortes.

Apesar de os presidentes da zona do euro insistirem no discurso de que os países da região precisam continuar unidos, está cada vez mais disseminado em outros escalões que a saída de algumas maçãs podres não seria um desastre. O ministro das finanças alemão, Wolfgang Schäuble, parece personificar essa corrente. Neste fim de semana, em entrevista ao jornal alemão "Welt am Sonntag", afirmou que a Grécia precisa decidir se quer ficar ou não na zona do euro e que, ainda que saísse, continuaria na Europa. A Grécia será salva de um jeito ou de outro, mas "precisa fazer sua lição de casa para se tornar competitiva", disse. Schäuble afirmou também que a ajuda à Grécia não pode se tornar "um buraco sem fundo".

A falta de boa vontade começa a ficar evidente, mas os europeus precisam ser cautelosos ao esticar a corda para que ela não se rompa. Talvez por temer ser colocado no mesmo lugar que Papademos, o primeiro-ministro italiano, Mario Monti, já disse que a Alemanha precisa ser mais solidária com os parceiros da zona do euro.