Título: Com alta do consumo e queda da indústria, PIB sobe 0,3% no 4º tri
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Fonte: Valor Econômico, 07/03/2012, Brasil, p. A3

A economia entrou em trajetória de recuperação no último trimestre do ano passado. Sustentada pelo consumo das famílias, a retomada não foi acompanhada pela indústria. No quarto trimestre de 2011, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,3% sobre o terceiro trimestre na série que desconta fatores sazonais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na mesma comparação, o consumo das famílias aumentou 1,1%, enquanto a indústria recuou 0,5%, com queda de 2,5% no setor de transformação, maior retração entre todos os componentes do PIB.

No conjunto da economia brasileira, a alta de 0,3% no último trimestre de 2011 mostra tímida recuperação em relação ao terceiro trimestre, quando o PIB recuou 0,1%, em dado corrigido pelo IBGE (o primeiro resultado, divulgado em dezembro, apontava crescimento zero). No ano, o PIB cresceu 2,7%, mostrando forte desaceleração em relação ao crescimento de 7,5% registrado em 2010. Em valores, o PIB somou R$ 4,1 trilhões em 2011.

Enquanto a demanda das famílias mostrou forte recuperação em reação ao aumento da renda, da ocupação e do desmonte das medidas de controle da demanda - alta de juros e contenção de crédito adotadas pela autoridade monetária para desacelerar a economia após o forte ritmo do fim de 2010 -, o investimento ainda não mostrou reação. Depois de cair 0,4% no terceiro trimestre (também dado revisado pelo IBGE), a formação bruta de capital fixo (componente do PIB que mede o consumo em máquinas, equipamentos e construção civil) avançou só 0,2% no quarto trimestre.

Para economistas, o ciclo de aperto monetário já revertido, que vigorou no início do ano passado em um cenário de câmbio valorizado e crise externa, afetou o desempenho da indústria, setor que já sofria com falta de competitividade, derivada de outros custos. Em 2012, a recuperação fraca da economia mundial e um dólar ainda barato vão impedir que a indústria tenha participação maior na retomada da economia, que seguirá apoiada no consumo e no setor de serviços, dizem os economistas. Para que a indústria acompanhe mais de perto o consumo das famílias este ano, acrescentam, apenas reduzir a taxa de juros pode ser insuficiente. As projeções para o crescimento do PIB de 2012 variam de 3% a 4%.

Julio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), diz que é preocupante a perda de importância que a indústria de transformação vem apresentando no PIB. Em 2011, a participação do setor recuou para 14,6%, ante 16,2% em 2010. "Sem dúvida, há uma substituição da produção nacional pela importação. Nos Estados Unidos, um símbolo de desindustrialização nas últimas décadas, a participação da indústria circula pouco abaixo de 14%, índice próximo ao brasileiro."

O avanço dos importados pode ser constatado no detalhamento do PIB. Apesar da queda na indústria de transformação, o consumo das famílias cresceu 1,1% na passagem do terceiro para o quarto trimestre, descontadas as sazonalidades, período em que as importações de bens e serviços aumentaram 2,6%, maior variação entre os cinco componentes da demanda. Na mesma medida, as exportações cresceram 1,9%.

Mariano Laplane, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita que as medidas para o desaquecimento da economia, adotadas pelo governo, foram subestimadas pelo mercado. "As macroprudenciais funcionaram muito mais do que se imaginava. Curiosamente, nem todo mundo desacelerou com a mesma intensidade." Ele aponta a restrição ao crédito e a taxa de câmbio como principais razões para a dificuldade de expansão da atividade industrial.

Com a demanda global reprimida e capacidade ociosa na produção mundial, a concorrência com os importados também deve dar o tom em 2012 e limitar o crescimento da indústria doméstica, afirma Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil. "A queda da taxa de juros até ajuda alguma coisa, porque ajuda a reduzir custos, mas não é suficiente para tornar nossos produtos competitivos, porque, com o enfraquecimento da economia mundial, os importados ficam ainda mais baratos". Assim, diz Leal, para um PIB de 3,7% em 2012, a produção e o PIB industrial devem crescer, no máximo, cerca de 2%.

Frente ao quadro de fraqueza vivido pela indústria, o governo deve acenar com mais medidas para incentivar a produção, diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, como novas taxações sobre derivativos para tentar impedir a entrada de dólares no país e mais desonerações e subsídios para setores específicos. Nada disso, no entanto, será suficiente para dinamizar a produção, que, na melhor das hipóteses, crescerá 2,5% em 2012, frente à projeção de 3,5% para o PIB. "O governo parece não perceber que o problema da indústria é muito mais grave do que o câmbio. O tipo de solução mais adequada seria atacar a questão dos custos industriais ao invés de privilegiar alguns setores", diz.

Ao contrário de Vale, Gomes de Almeida não acredita que a indústria brasileira tem baixa produtividade ou é pouco competitiva. "A questão é que nossa política econômica é anti-industrial, e isso tem um preço". Em nota, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) apontou a alta carga tributária e o custo de energia entre os problemas que tiram a competitividade da indústria nacional.

O Iedi projeta um crescimento de até 3% da indústria neste ano, puxado principalmente pela liberação de estoques, que acontece no primeiro trimestre, e por medidas do governo de incentivo à atividade. "O aumento do salário mínimo vai expandir a demanda. O setor de alimentos e bebidas, em que a participação dos importados é fraca, é muito afetado pelo aumento dos salários", diz Gomes de Almeida.

Atenção frente ao câmbio, uma estratégia mais ativa de defesa comercial e medidas mais abrangentes para reduzir os custos de produção são apontadas como decisivas para o fortalecimento da indústria. "Temos que continuar reduzindo os juros e evitar um fluxo de recursos que vêm ao Brasil explorar o diferencial da nossa taxa", afirma Laplane. "A indústria está muito mais apta para crescer do que os números dizem, mas a conjuntura não está permitindo que ela ganhe impulso pelo mercado doméstico".

De acordo com Roberto Olinto, coordenador de Contas Nacionais, departamento do IBGE responsável pelo cálculo do PIB, a indústria de transformação é o "núcleo central da economia". Segundo ele, sistematicamente, o que se vê em todas as taxas é a indústria de transformação com o pior desempenho do PIB. Segundo dados do IBGE, os destaques negativos do setor foram vestuário e acessórios, artigos de plástico e metalurgia, entre outros. Ainda assim, a indústria de transformação teve também destaques positivos, como máquinas e equipamentos, produtos de metal, caminhões e ônibus.

No ano e no último trimestre, agropecuária e serviços ajudaram o PIB pelo lado da oferta. Na comparação com o terceiro trimestre, estes setores subiram 0,9% e 0,6%, respectivamente. Em 2011, agropecuária cresceu 3,9% e serviços acompanhou a alta de 2,7% do PIB.