Título: Mantega quer mudança cambial sem perda de receita com CPMF
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 19/07/2006, Finanças, p. C2

O governo somente vai anunciar mudanças nas normas sobre cobertura cambial quando definir uma fórmula que evite perda de arrecadação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O ministro da Fazenda, Guido Mantega, quer divulgar essa reforma da legislação cambial na semana que vem, quando voltar da viagem à Argentina para a cúpula do Mercosul.

Ontem, ele se reuniu com técnicos da Receita Federal, Banco Central e com representantes da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. O encontro não foi conclusivo.

Mantega confirmou que as novas normas permitirão às exportadoras manter no exterior parte da receita obtida com suas vendas externas, mas sem diferenciação por setor produtivo ou pelo tamanho da empresa. O desafio jurídico é definir como continuar cobrando CPMF para esse dinheiro que deixará de entrar no Brasil. "As medidas são simples, mas têm de ser estudadas sob todos os ângulos para depois anunciarmos", explicou o ministro.

O ministro já tinha afirmado que, em uma estimativa "grosseira", as novas normas poderiam deixar fora do país aproximadamente US$ 10 bilhões por ano. O governo espera, em 2006, registrar exportações de US$ 132 bilhões. Com cobertura cambial mais flexível, o objetivo também é o de evitar entrada desnecessária de moeda forte, o que também afeta a taxa de câmbio.

A preocupação do governo é estabelecer regras que serão mantidas em eventuais disputas judiciais e Mantega confirmou que é para isso que os técnicos estão trabalhando.

Não perder receita é uma das dificuldades de fato. O objetivo do governo é diminuir determinados custos para o exportador, principalmente de intermediação financeira. Mas quer continuar recebendo a CPMF para manter a arrecadação. "Se a cada medida abrirmos mão de arrecadação, daqui a pouco os cofres públicos estarão debilitados e terei dificuldade em cumprir o superávit primário", avisou Mantega.

O modelo normativo que está sendo preparado, segundo o que revelou Mantega, é o de "perda zero" de arrecadação. De acordo com o que afirmou ontem o ministro da Fazenda, é de aproximadamente US$ 800 milhões a arrecadação da CPMF sobre essas transações.

Os que está sendo preparado é a mudança de uma regra da lei da CPMF. A empresa registra a exportação e, dessa maneira, tem um crédito cambial. O governo vai acompanhar tudo e, se houver necessidade, poderá revogar a medida que reduz a cobertura cambial. A lei vai delegar ao Conselho Monetário Nacional (CMN) essa responsabilidade.

Mesmo se prevalecer um modelo de adesão voluntária das exportadoras às novas regras de cobertura cambial, os juristas acreditam que haverá contestação judicial à cobrança da CPMF. O advogado tributarista Júlio de Oliveira afirma que o maior obstáculo é o princípio da territorialidade e as partes envolvidas (Estado e contribuinte) não podem abrir mão dele.

"O fato gerador da CPMF é a movimentação financeira no território brasileiro. Se isso não ocorre, a tributação pode ser contestada e a disputa pode ir ao Supremo", alertou.

Especula-se que o governo poderia estabelecer a tributação da CPMF promovendo uma espécie de "encontro de contas". Isso seria uma equiparação, por ficção, à entrada de recursos no país. Portanto, o dinheiro fica no exterior, mas, mesmo assim, paga CPMF.

O dirigente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, afirmou que essa cobrança virtual da CPMF é frágil e ainda pode provocar insegurança jurídica porque seria aberto um precedente perigoso: tributar recursos no exterior.

Castro elogiou a decisão do governo, de descartar diferenças setoriais ou por porte da empresa. Segundo ele, a entidade defende a racionalização dos custos do comércio exterior por meio de normas gerais, evitando assim benefícios pontuais ou o câmbio duplo, condenado pela Organização Mundial do Comércio.