Título: Disputa eleitoral acirra debate político no Senado
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2006, Política, p. A10

Com os ânimos acirrados pelo processo eleitoral, senadores governistas e da oposição ocuparam quase duas horas da sessão plenária de ontem com um bate-boca que começou com troca de ofensas pessoais, passou por ataques ao comportamento ético do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e se transformou num debate ideológico, a partir de críticas ao modelo de privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso.

Um dos diálogos mais tensos, embora cheio de ironias, ocorreu entre o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), e o senador Saturnino Braga (PT-RJ). O petista disse que, na gestão FHC, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) "financiou grupos privados para tomarem o patrimônio público a preços absolutamente aquém do valor real".

Saturnino falou de "benesses para grupos privados", "atentados ao patrimônio público" e defendeu a "retomada da ação do Estado no desenvolvimento". Por fim, fez um prognóstico eleitoral: "Agora querem retornar. E não vão retornar, porque a consciência nacional vai falar mais forte do que tudo".

O presidente do PSDB reagiu dizendo que o petista estava repetindo o mesmo discurso de 40 anos atrás e o desafiou a citar nomes. "Quem quer voltar, cara pálida?", perguntou. "Os privatizadores, os mercadistas", respondeu Saturnino. A reação de Tasso foi citar o programa do governo Lula de parceria público-privada (PPP).

"Por favor, senador Saturnino, exalte-se. PPP é um projeto de privatização? Meu querido, vossa excelência, que é tão fiel a seus compromissos originais, diga-me: PPP é um projeto de privatização?"

O cearense citou também o pedido enviado pelo governo ao Senado e aprovado a toque de caixa pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), em 48 horas, de autorização para ampliar a capacidade de endividamento da Transpetro em R$ 5,6 bilhões. O objetivo é que a subsidiária da Petrobras possa levantar empréstimo junto ao Fundo de Marinha Mercante (FMM) para financiar programa de modernização e expansão de sua frota. A Transpetro é presidida pelo ex-senador Sérgio Machado, do PMDB do Ceará, adversário de Tasso. A oposição suspeita de uso eleitoral.

"Esse é um projeto de privatização do risco, meu querido senador", afirmou a Saturnino. Segundo o tucano, ninguém pode defender hoje o projeto de desenvolvimento que foi implantado no país nos anos 30.

Retomando o discurso da ética, o presidente do PSDB disse que os governistas estavam fazendo uma "verdadeira exaltação aos sanguessugueiros (parlamentares envolvidos no esquema de corrupção da venda superfaturada de ambulâncias a prefeituras) e mensaleiros (beneficiados pelo esquema do publicitário Marcos Valério) deste país".

A turbulência no plenário começou quando a líder do PT, Ideli Salvatti (SC), criticou protesto feito na véspera pelo presidente do PFL, Jorge Bornhausen (SC), seu adversário político no Estado, contra suposta censura do programa de rádio "Voz do Brasil". O programa teria deixando de transmitir ataques feitos pela oposição ao governo.

"Alguém que foi governador biônico e ministro da ditadura militar não tem moral para falar de censura", afirmou Ideli. No discurso, ela homenageava o filme "Zuzu Angel", sobre a estilista que teve o filho morto pela ditadura. Foi o mote para ela lembrar o passado de "violência, morte, tortura e censura".

Bornhausen, que não estava no plenário, chegou na hora e acusou a adversária de "falar pelas costas". O pefelista reafirmou seu discurso da véspera, no qual considerou "abuso" o fato de Lula ter defendido dignidade, honra e ética em viagem a Santa Catarina, seu Estado, "já que não tem autoridade moral, porque permitiu o valerioduto, o mensalão, os vampiros e os sanguessugas". Esse teria sido o discurso censurado na "Voz do Brasil", segundo Bornhausen.

Ideli pediu à Mesa direito de responder, mas o pedido foi negado pelo senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que presidia a sessão. Ela insistiu e o tucano também partiu para o ataque: "Vossa excelência não tem autoridade moral e política para questionar decisão da Mesa".