Título: Para analistas, vazamento foi "descuido" de diretor
Autor: Camba, Daniele e Vieiram Catherine
Fonte: Valor Econômico, 04/09/2006, Finanças, p. C4

Apesar do tom de perplexidade com o fato, a maioria dos profissionais de mercado ouvidos pelo Valor ressalta a idoneidade do diretor afastado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Sérgio Weguelin, e acredita que a sua atitude tenha sido muito mais um descuido do que um vazamento intencional de informação. Os profissionais também acreditam que isso não irá manchar o trabalho que a atual gestão da autarquia tem feito em prol dos minoritários, em casos como da própria Telemar e da Mittal e Arcelor.

"Conheço o Weguelin há muitos anos, é um servidor público da maior competência e posso testemunhar sobre a sua correção e honestidade", disse o ex-presidente da autarquia, Luiz Leonardo Cantidiano, que acredita totalmente na inocência do diretor.

"Weguelin é um profissional experiente, que veio do BNDES e com uma grande sensibilidade sobre o mercado de capitais", afirma o primeiro presidente da CVM, Roberto Teixeira da Costa. Ele afirma, no entanto, que ao ser questionado sobre a operação da Telemar pelo investidor estrangeiro, o diretor da autarquia devia se limitar a responder apenas que a CVM estava acompanhando o caso e não falar sobre o que estava sendo feito. "Mesmo involuntário, ele falou mais do que devia e até por causa disso foi acertada a atitude da autarquia de ser transparente e tornar público tudo o que aconteceu", diz Teixeira da Costa. "A gestão do Marcelo Trindade está muito acima desse contratempo e não será manchada por isso", completa ele.

O chefe de análise do Pactual, Ricardo Kobayashi, reforça o coro dos que aprovaram a postura da CVM de vir a público contar o ocorrido. "Assim como a mulher de César, não basta a CVM ser correta, ela precisa mostrar que é correta e foi exatamente isso que ela fez, o mercado gostou", diz. "A autarquia continua sendo admirada, até por essa postura de se antecipar a qualquer problema", afirma.

Mesmo acreditando que Weguelin não agiu de má fé, alguns não pouparam críticas. "Um diretor da CVM não pode ser ingênuo, ele precisa ter muito claro que qualquer coisa que faça pode trazer conseqüências enormes para o mercado", diz o presidente da Associação dos Profissionais do Mercado de Capitais (Apimec) nacional, Milton Milioni. Ele também faz uma crítica ao tratamento dado ao investidor estrangeiro. "Como deve ser um grande investidor, o diretor da CVM se apressou para responder em minutos, já com os brasileiros as coisas são muito mais demoradas", completa. "Todo mundo erra na vida", diz Alfried Plöger, presidente da Abrasca, que reúne as companhias abertas. "Só precisamos ver se foi de boa fé".

O presidente da Amec, Luiz Fernando Figueiredo reconhece que a carta anônima que circulou no mercado dizendo que os investidores que venderam as ações da Telemar faziam parte "de uma confraria recentemente formada para defender seus interesses" tinha o objetivo de atingir a entidade. "Não vou discutir com alguém que sequer se identifica, só digo que a nossa postura de lutar pelo mercado deve estar incomodando", diz.

Detentora de 8,75% das ações preferenciais da Telemar e crítica de primeira hora da operação proposta pela companhia, a gestora americana Brandes Investment Partners negou ser a contraparte do e-mail que originou o afastamento do diretor da CVM. "Não temos nada a ver com isso, não falamos direto com a CVM", disse ao Valor Luiz Guilherme Sauerbronn, analista sênior da Brandes, que administra mais de US$ 100 bilhões.

Segundo Sauerbronn, depois do fato relevante que a Telemar havia divulgado na manhã do dia 17, o fundo já começava a acionar advogados locais para representá-los, provavelmente numa reclamação junto à autarquia. "Estávamos analisando o que podia ser feito, mas no meio desse processo veio o parecer", conta Sauerbronn.

Perguntado se o fundo montou operações de aluguel com papéis da empresa, Sauerbronn explicou que a Brandes possui como uma de suas políticas não ficar devedor ("short", ou vendido) em um papel, a exemplo do que fez a Hedging-Griffo nos dias 17 e 18 de agosto. "Não podemos ficar 'short', nossa política é de ser um fundo que compra e fica com os papéis", diz o executivo. Segundo Sauerbronn, a Brandes é a favor da migração da Telemar para o Novo Mercado e da pulverização, mas não pode concordar com os termos de troca. "São prejudiciais para os nossos clientes e podem abrir um precedente terrível no mercado brasileiro, estamos conversando com outros acionistas minoritários e certamente vamos votar contra a operação", diz ele.

Esse problema, na visão dos analistas, pode servir para a CVM encontrar uma alternativa mais formal de consultas à autarquia, assim como já faz nas instruções, com as audiências públicas. "Pode-se criar uma espécie de fórum de discussão em casos polêmicos", sugere Kobayashi, do Pactual. Teixeira da Costa lembra que a SEC (a CVM americana) torna público todos os questionamentos que recebe e que não envolvem um assunto ou operação que ainda não esteja no mercado. "A CVM podia adotar isso", afirma ele.