Título: Hollande assumirá com onda de demissões
Autor: Fernandes , Daniela
Fonte: Valor Econômico, 14/05/2012, Internacional, p. A11

A euforia da vitória do novo presidente francês, o socialista François Hollande, poderá durar pouco. Ele tomará posse amanhã em um país que registra as mais altas taxas de desemprego dos últimos 13 anos. Como se não bastasse, ele corre o risco de enfrentar nos próximos meses uma onda de demissões em massa na França.

O próprio Hollande já temia que isso pudesse ocorrer e havia declarado em campanha que muitas empresas estariam esperando o término das eleições para cortar vagas, como têm afirmado sindicatos de diferentes setores.

Diariamente, a imprensa francesa tem acrescentado nomes à lista de companhias que estariam preparando reduções de mão de obra. A General Motors informou que têm planos de vender sua fábrica em Estrasburgo, no leste da França, a única da marca no país e onde trabalham cerca de mil funcionários. O grupo PSA Peugeot Citroën também poderá fechar uma unidade na periferia de Paris.

Um dos nomes que mais circulam atualmente é o do Carrefour, maior empregador privado da França, que poderá demitir, na estimativa dos sindicatos, três mil funcionários de hipermercados do país em razão da queda nas vendas nesse tipo de loja. Outras empresas, como a Air France e a operadora de telefonia celular SFR (grupo Universal) ou ainda o varejo em geral e grandes indústrias do setor agroalimentar integram a lista de possíveis cortes no curto prazo.

Se confirmadas, essas demissões vão agravar a já problemática situação. O desemprego na França - que registra alta pelo 11º mês consecutivo - explodiu e já atinge quase 10% da população ativa, cerca de 3 milhões de pessoas. Se forem somadas as pessoas que fazem "bicos" ocasionais, o número chega a 4,3 milhões de franceses. Nos últimos 5 anos, cerca de 700 mil pessoas perderam o emprego na França, alta de 35% no período.

Bastam alguns instantes em um agência de seguro desemprego em Paris para constatar rapidamente o desafio que Hollande terá pela frente. O vai e vem de pessoas é contínuo. Uns são jovens, outros passaram dos 50 anos. Alguns são contadores ou arquitetos, outros faziam faxina em empresas. Há os que asseguram ter enviado centenas de currículos jamais respondidos e os que fazem "bicos" temporários.

Mas há um elemento comum nas diferentes histórias desses desempregados: o receio de que a situação precária continue por muito tempo. É o caso de Pascale Écoffey, 51 anos, que perdeu o emprego em julho passado, após uma carreira de 22 anos em um instituto de pesquisas de opinião. Formada em sociologia, ela conta ter sido demitida depois que a empresa perdeu um cliente. "Não consigo achar vagas para me candidatar e estou pensando em mudar de área. Mas na minha idade é difícil arrumar trabalho", diz ela.

E os números provam: a taxa de desemprego das pessoas acima de 50 anos na França aumentou 15,6% no último ano. A socióloga diz ter votado em Hollande, mas não acredita que a situação irá mudar. "Ele está com as mãos e os pés amarrados por causa da crise e não poderá fazer muita coisa", afirma.

Sua opinião é compartilhada por muitos especialistas. Para Éric Heyer, diretor do Observatório Francês de Conjuntura Econômica, "o pior estaria por vir" na área do desemprego. Por uma razão simples: o fraco crescimento econômico do país, estimado em 0,5% neste ano pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelo próprio Hollande em sua campanha.

"Com crescimento baixo, será difícil conter o aumento do desemprego", diz Heyer. Ele calcula que para criar 150 mil vagas, o PIB francês teria de crescer 1,7%. Essa é justamente a previsão de Hollande para 2013, mas ela é considerada superestimada por órgãos internacionais e economistas.

O FMI prevê que o PIB francês deverá crescer apenas 1% no próximo ano. Na sexta-feira, foi a vez da Comissão Europeia jogar uma ducha de água fria nas projeções do novo presidente ao estimar que o crescimento francês deverá ser de 1,3% em 2013. "Hollande terá o desafio de respeitar os compromissos fixados de redução do déficit público e, ao mesmo tempo, fazer com que o crescimento econômico não seja tão fraco", diz Heyer.

Benjamin Carton, economista do Centro de Estudos, Perspectivas e Informações Internacionais (Cepii), em Paris, também acredita que o desemprego vai se agravar na França e acha que as propostas feitas na campanha nessa área terão "efeito modesto".

O programa de governo de Hollande prevê a criação de 60 mil vagas no funcionalismo (quase a totalidade para professores) e 150 mil contratos em empresas para jovens - categoria fortemente afetada pelo desemprego - financiados em boa parte pelo Estado. Ele anunciou ainda exonerações fiscais para companhias que contratarem um jovem e mantiverem, ao mesmo tempo, um funcionário com mais de 55 anos no trabalho.

Michel Sapin, cotado para ser o novo ministro francês da Economia, declarou que o futuro governo deverá tornar "extremamente onerosas" as demissões que serviriam apenas para "melhorar a rentabilidade das empresas", o que ele chama de "demissões motivadas pela bolsa". Sapin já advertiu que Hollande não deverá beneficiar, em razão da situação econômica do país, do "estado de graça" - expressão comum na França que define o período de calmaria social e política após as eleições. Muitos já estimam que poderá haver protestos nas ruas nos próximos meses.