Título: Linha emergencial de € 100 bi deixa BC grego na mão do BCE
Autor: Atkins, Ralph
Fonte: Valor Econômico, 22/05/2012, Finanças, p. C14

Não houve nenhum anúncio oficial. Termos ou condições não foram revelados. Mas o sistema bancário da Grécia está sendo escorado por estimados € 100 bilhões em liquidez emergencial fornecida pelo banco central do país - uma operação aprovada em segredo pelo Banco Central Europeu (BCE) em Frankfurt. Se a Grécia abandonar a zona do euro, a causa imediata poderá ser uma decisão do BCE de puxar a tomada.

O uso abrangente da "assistência emergencial de liquidez" (ELA, na sigla em inglês) para ajudar os bancos nas economias mais fracas tem sido uma das características menos noticiadas da crise na zona do euro. Separada dos estoques normais de liquidez e pretendida originalmente como uma linha de crédito temporária para as autoridades nacionais usarem quando bancos tivessem problemas, a ELA mostrou-se um salva-vidas para o sistema financeiro irlandês e agora ainda mais no caso da Grécia. Como tal, vem dando ao BCE - que tem o controle final sobre a linha - um poder considerável na determinação do destino dos países.

Se esse poder será ou não exercido não está claro. A ELA é um assunto sobre o qual o BCE reluta muito em fornecer informações - mesmo sobre onde e quando ela será fornecida. "Você não diz quando está em uma situação de emergência, porque aí você piora a situação. Portanto, realmente não vejo proveito em ser mais transparente", explicou Luc Coene, presidente do banco central da Bélgica, ao "Financial Times".

A proteção do BCE chegou um pouco tarde no mês passado. Relatório financeiro semanal, publicado em 24 de abril, mostrou um aumento inesperado de € 121 bilhões no tópico inocentemente intitulado "outras reivindicações sobre instituições de crédito da área do euro", resultado da colocação de todas assistências emergenciais de liquidez sob o mesmo item. Por definição, € 121 bilhões foram o montante mínimo de ELA fornecida pelo "eurosystem", a rede de bancos centrais da zona do euro.

Desde então, ao vasculhar os relatórios do BCE e dos bancos centrais nacionais, os analistas agruparam mais detalhes. Analistas do Barclays, por exemplo, calculam que a Grécia está agora usando € 96 bilhões em dinheiro da ELA, enquanto a Irlanda responde por outros € 41 bilhões e Chipre por € 4 bilhões. Se estiver correta, a ELA total em uso supera os € 140 bilhões - mais de 10% do total emprestado para os bancos da zona do euro em operações padrão de política monetária.

Por causa do risco de a liquidez extra criar inflação, assistências emergenciais de liquidez de mais de € 500 milhões exigem a aprovação do conselho diretivo do BCE, formado por 23 membros: seu uso pode ser barrado se dois terços do conselho se opor a um pedido.

O importante é que os riscos recaem sobre o banco central nacional, em vez de serem espalhados pelos bancos centrais do bloco, como acontece com a liquidez normal - mas haverá um golpe generalizado se um país deixar a zona do euro. Todavia, não é um limite teórico ao volume de assistências emergenciais de liquidez que podem ser fornecidas - e nenhuma informação, como por exemplo, quais garantias os bancos recebedores terão de fornecer ou as taxas de juros que eles vão pagar. O exemplo da Irlanda mostra que o uso supostamente temporário da ELA pode também ser prolongado.

Coene disse que a ELA precisa ser cortada assim que os bancos se tornam insolventes. "Trata-se de uma ajuda emergencial de liquidez, não um auxílio de solvência", diz ele. O sigilo em torno da ELA cria, no entanto, áreas nebulosas.

Na semana passada, o conselho do BCE excluiu quatro bancos gregos das operações normais de liquidez - forçando-os a voltar para a ELA. O motivo não-oficial foi a incerteza política em relação ao plano de recapitalização bancária da Grécia após as eleições inconclusivas de 6 de maio.

Mas como o conselho estabelece essa fronteira? Mario Draghi, presidente do BCE provavelmente vai buscar cobertura política antes da ELA da Grécia ser retirada. O BCE tem "uma grande preferência" pela permanência da Grécia na zona do euro, mas o futuro do país deve ser decidido pelos políticos, disse ele na semana passada. "Cortar a ELA seria a maneira de empurrar a Grécia para fora da zona do euro. Mas acho que o BCE não vai tomar tal decisão", diz Laurent Fransolet, analista do Braclays. "Acho que o BCE recorreria ao poder político para tomar tal decisão."

Mesmo assim, a ambiguidade em relação a como o BCE realmente agiria lhe dá influência sobre os políticos da zona do euro. Uma ameaça de puxar a tomada feita pelo BCE no fim de 2010 ajudou a convencer a Irlanda a aceitar um plano internacional de socorro financeiro. Não há dúvidas de que seu conselho diretivo espera concentrar as mentes de maneira parecida em Atenas.