Título: Gurgel diz à CPI que protelação de inquérito foi estratégica
Autor: Magro , Maíra
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2012, Política, p. A6

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enviou ontem, no limite do prazo, seu depoimento escrito à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Cachoeira, com respostas às perguntas feitas por parlamentares. O documento, de sete páginas, repete o argumento de que a decisão de segurar o inquérito da Operação Vegas, em 2009, fez parte de uma estratégia do Ministério Público Federal para permitir novas investigações. Mas não entra na guerra de versões entre a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre quem teria solicitado a paralisação do inquérito.

Gurgel diz que, ao receber da PF o inquérito da Vegas em 15 de setembro de 2009, constatou "que não havia fato penalmente relevante que pudesse ensejar a instauração de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF)" em relação ao senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), os deputados federais Sandes Júnior (PP-GO) e Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO). Ele ressalta que o STF é "especialmente rigoroso na exigência de indícios concretos da prática de crime para autorizar a formalização de procedimento investigatório e diligências invasivas da privacidade do cidadão."

A opção da PGR de segurar o inquérito da operação Vegas em 2009 evitou, na época, a abertura de investigação contra os parlamentares - o que só poderia ser feito a pedido da procuradoria e com autorização do Supremo Tribunal Federal, devido ao foro privilegiado. O inquérito contra Demóstenes e os demais políticos só foi aberto este ano, depois do vazamento de notícias pela imprensa revelando o relacionamento deles com Carlinhos Cachoeira, já na Operação Monte Carlo.

O procurador explica que, em 2009, levou em conta somente o relatório de análise enviado pela PF, justificando que "não seria viável empreender às cegas análise de milhares de áudios". Ele ressalta que essa prática é usual.

Gurgel também diz que os fatos mencionados no relatório da PF em relação aos políticos eram "graves, uma vez que indicavam uma relação no mínimo promíscua com os então investigados, notadamente com Carlos Cachoeira." No entanto, de acordo com ele, as situações descritas "não adentravam a seara penal, situando-se, ainda, no campo ético".

O procurador acrescenta que a remessa do inquérito ao STF para arquivamento em relação aos detentores de prerrogativa de foro "certamente revelaria a existência da investigação" - pois, de acordo com ele, os dados ficariam acessíveis até mesmo via internet. Por isso, ele diz que decidiu sobrestar o inquérito "no intuito de possibilitar a retomada das interceptações telefônicas e da investigação", que, em sua opinião, "se afigurava extremamente promissora."

Gurgel também relata que, em março de 2011, foi informado de que uma investigação continuava, desde o ano anterior, para apurar a exploração de jogos de azar por Carlos Cachoeira e seu grupo, com o prosseguimento da interceptação telefônica dos investigados. "Com essa informação, não poderia deixar de manter o sobrestamento do inquérito [da operação Vegas], no aguardo da sequência das investigações e da deflagração de futura operação policial, o que veio a acontecer em 29 de fevereiro último" - já na operação Monte Carlo.

Em 27 de março, 19 dias depois de receber o inquérito da operação Monte Carlo, Gurgel pediu ao STF a instauração de inquéritos contra Demóstenes, Leréia, Sandes Júnior e Stepan Nercessian. De acordo com ele, esses inquéritos usaram como prova exclusivamente o relatório dos grampos extraídos da Monte Carlo. As evidências vindas da operação Vegas "tiveram por objetivo apenas contextualizar os fatos".

Gurgel também nega que os casos tenham sido distribuídos a qualquer subprocurador, e afirma que o pedido de abertura de inquérito contra autoridades no STF é de competência exclusiva do procurador-geral da República.

Ele finaliza o depoimento dizendo que não poderia acrescentar "nada mais de útil" aos trabalhos da CPI "em face das restrições a que estou submetido por força especialmente de normas processuais penais."

Embora a CPI tenha convidado Gurgel a depor pessoalmente, as explicações foram feitas por escrito para evitar possíveis impedimentos jurídicos no futuro, pois, no papel de acusador, Gurgel entendeu que não poderia também atuar como testemunha.

Também a Delta já entregou sua defesa à Controladoria-Geral da União (CGU) no processo que vai apurar irregularidades em contratos com o governo federal e que pode declarar a empresa inidônea.

A construtora havia solicitado ao órgão, pela segunda vez, a prorrogação do prazo. Diante do indeferimento do pedido pelo ministro Jorge Hage, que argumentou que a solicitação tinha "clara intenção protelatória", a Delta apresentou sua defesa na terça-feira, no fim da tarde.

O processo para declaração de inidoneidade da empresa foi aberto pela CGU em 23 de abril, a partir de denúncias de operações da Polícia Federal. A empreiteira é suspeita de ter ligações com o empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, preso pela PF acusado de chefiar um esquema de jogos ilegais, e está no centro das investigações da CPI do Cachoeira. De acordo com a assessoria da CGU, a decisão será dada até o fim de junho.