Título: Acaba multa por atraso na importação
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 12/09/2006, Finanças, p. C1

As empresas brasileiras que levaram pesadas multas por atraso ou não-fechamento dos contratos de câmbio de importação desde 99 se preparam para reclamar o não-pagamento dessas multas, em decorrência do pacote cambial do governo. Cálculos informais do Banco Central publicados pelo Valor situavam o valor das multas aplicadas um total de R$ 24 bilhões.

Na verdade, a Medida Provisória 315, que institui o pacote cambial, determinou o fim da necessidade do fechamento do câmbio em 180 dias para importações a partir de 4 de agosto de 2006. Mas, pelo princípio da retroatividade da lei mais benéfica, esse benefício se estende aos casos anteriores, no entender de três escritórios de advocacia ouvidos pelo Valor - Lefosse, Levy & Salomão e L.O. Baptista Advogados. "Todas as infrações anteriores a 4 de agosto deveriam se beneficiar da dispensa da multa", diz Luiz Roberto de Assis, sócio da Levy & Salomão Advogados.

As multas pelo atraso no fechamento de câmbio para importação foram instituídas em 99, pela lei 9.817. Na época, atendeu a interesses de política cambial. A idéia era reduzir o volume de operações de arbitragem - as empresas tomavam financiamentos a juros baixos no exterior e atrasavam o pagamento das importações; nesse período, aplicavam os recursos no mercado interno, ganhando com a diferença dos juros.

Mas, as multas pelo atraso na contratação do câmbio para importação se tornaram uma verdadeira aberração. "Muitas vezes o cliente, por descuido, esquecia de entregar ou vincular ao processo de importação um simples documento que nem ele sabia muito bem qual era e recebia multas de mais de R$ 15 milhões por uma importação de valor de R$ 20 mil", conta Cássia Rangel Monteiro, sócia da L.O. Baptista Advogados. Filas imensas se formavam na frente da sede do BC na avenida Paulista, em São Paulo, de advogados de empresas querendo maiores informações e reclamando das multas.

As empresas, muitas delas pequenas e médias, abriam processos administrativos no Banco Central contra a multa. Diante do surrealismo da situação uma nova lei, de 3 de novembro de 2003, de número 10.755, determinou que o valor máximo das multas não poderia passar 100% do valor da importação e que caberia ao BC olhar caso a caso. Imediatamente, o BC fixou as multas em 0,5% do valor da importação. As multas aplicadas a partir de então, portanto, passaram a ter valor mais razoável.

Mas, as empresas que haviam sido punidas com multas de valor maior reclamaram, primeiro no BC e depois no Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o chamado Conselhinho. Argumentaram que, pelo princípio da retroatividade da lei mais benéfica, todas teriam direito a pagar multas de valor máximo de 0,5% do valor das importações. As averiguações sobre importações se tornaram o assunto que tomava mais tempo dos supervisores do BC. Em setembro de 2004, para se ter uma idéia, representavam 79,98% do universo dos processos administrativos em análise no BC.

Em novembro de 2005, o Congresso aprovou a lei 11.196, que torna retroativo o teto de 0,5% para as multas de todas as empresas que estão com processos em discussão na esfera administrativa. "A lei 11.196 foi a que trouxe o maior benefício para as companhias", diz Marcos de Carvalho, sócia da Lefosse. Um cliente seu que já teve o valor da multa recalculado, por exemplo, teve o valor da penalidade reduzido de R$ 376.000 para R$ 3.000.

"Muitas empresas passam agora a dever um valor menor e vão preferir pagar essa multa a continuar com um processo em andamento", acredita Carvalho. Cássia Rangel Monteiro concorda. "Devem pedir a anulação das multas só as empresas que ainda têm valores elevados para pagar", afirma a especialista. Afinal, um processo na esfera administrativa, que pode ter de chegar à esfera jurídica, tem um custo para as empresas que pode ser até maior do que o valor da multa. Fora a dor de cabeça envolvida.

(Colaborou Alex Ribeiro, de Brasília)