Título: FMI aprova primeira fase da reforma com ampla maioria
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 19/09/2006, Finanças, p. C4

A primeira etapa da reforma do sistema de divisão do poder no Fundo Monetário Internacional (FMI) foi aprovada ontem com ampla maioria, apesar das críticas que o projeto tem recebido do Brasil e de outros países em desenvolvimento, e das várias divergências que ele provoca entre os membros do Fundo.

A resolução apresentada pelo diretor-gerente da instituição, Rodrigo de Rato, recebeu 90,6% dos votos. Ela precisava de no mínimo 85% para passar.

A posição individual de cada país não foi divulgada pelo Fundo Monetário. Apenas Brasil, Índia, Argentina e Egito anunciaram publicamente ter votado contra a proposta.

Num discurso que pretende fazer hoje em Cingapura, na abertura formal da reunião anual do FMI, Rato dirá que a decisão de ontem "vai aumentar nossa efetividade e adicionar legitimidade" às reformas em andamento na instituição, de acordo com passagens selecionadas do pronunciamento que foram divulgadas na noite de ontem.

A reunião de Cingapura, que termina amanhã, servirá apenas para sacramentar decisões tomadas nas últimas semanas pelos países que integram o FMI. O processo de votação da resolução aprovada ontem estava em andamento há um mês e ninguém esperava um resultado diferente do que foi anunciado.

A resolução aumenta as cotas de quatro integrantes do Fundo Monetário, China, México, Coréia do Sul e Turquia, num reconhecimento do aumento de sua importância para a economia mundial. Eles eram os países mais prejudicados pelas fórmulas que definem o número de votos de cada sócio na instituição e a quantia que cada um pode tomar emprestada quando precisa de socorro.

Como resultado da mudança, as cotas de todos os outros 180 integrantes do Fundo foram recalculadas. O Brasil, que tinha 1,42% dos votos, agora ficou com 1,40%. Os Estados Unidos continuam com a maior cota, igual a 17,1% dos votos. Ela permite que os americanos sozinhos tenham poder de veto nas discussões mais importantes.

Também ficou acertado que haverá em breve um aumento do número de votos básicos que todos os integrantes do FMI possuem independente da sua importância econômica. O objetivo da medida é fazer um gesto de boa vontade com os países pobres da África, que participam do Fundo mas têm influência quase zero nas suas decisões.

A resolução aprovada ontem apresenta diretrizes para a próxima etapa da reforma, em que será discutida uma nova fórmula para medir a importância econômica dos países e estabelecer suas cotas no FMI.

Essa fase tende a se arrastar por um bom tempo, por causa das diferenças enormes que separam as opiniões dos vários países sobre a composição ideal da fórmula.

Países ricos como os Estados Unidos, o Japão e a Alemanha querem que o Produto Interno Bruto (PIB) seja o fator mais importante na fórmula, o que os favorece. Países europeus, como a Holanda e a Bélgica, querem peso maior para uma medida do grau de abertura das economias para o comércio e os fluxos de capital. É uma forma de garantir que suas cotas não diminuam.

O Brasil e outros países em desenvolvimento querem que o PIB seja calculado de acordo com um critério que os favorece e pedem que a fórmula leve em consideração também o grau de vulnerabilidade das suas economias a crises externas. Conforme a resolução aprovada ontem, a nova fórmula deve ficar pronta no segundo semestre de 2008.

A discussão sobre as cotas ocorre em meio a uma profunda crise de identidade do FMI. Países que viviam com o chapéu na mão à porta da instituição, como o Brasil e a Argentina, pagaram suas dívidas com o Fundo. A economia mundial vive uma fase prolongada de expansão e, apesar das várias incertezas existentes, não há nenhum incêndio fora de controle que exija a presença dos bombeiros do FMI.

As reformas em andamento na organização tendem a ocorrer de forma lenta. Idéias que vêm sendo debatidas, como a criação de uma nova linha de crédito de emergência para nações em desenvolvimento e o reforço dos mecanismos de monitoramento dos países, ainda estão longe de alcançar o consenso entre os integrantes do FMI.