Título: Alckmin afirma que enfrenta uma 'organização criminosa'
Autor: Costa, Raymundo e Vilella, Janaina
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2006, Política, p. A10

Numa decisão tomada na véspera, os tucanos decidiram ignorar o programa de governo, lançado ontem no Rio pelo candidato Geraldo Alckmin, para atacar a corrupção no governo Lula. Essa é a estratégia a ser adotada a partir de agora, especialmente na semana final da campanha, que deve se tornar "sangrenta", segundo a expressão de um dirigente do PSDB. O marqueteiro de Alckmin, o jornalista Luiz González, é refratário à idéia, mas os políticos que integram a campanha do ex-governador paulista avaliam que ela é decisiva para assegurar o segundo turno.

A decisão tomada na noite de terça-feira por Geraldo Alckmin só não foi inteiramente implementada devido aos desencontros na campanha. Além dele, deveriam discursar também o candidato a governador de São Paulo, José Serra, e o governador de Minas Gerais, Aécio Neves. Seria uma manifestação de unidade tucana. Estavam presentes também os presidentes do PSDB, Tasso Jereissati, e do PFL, Jorge Bornhausen, o candidato a vice José Jorge e um governador pemedebista, Luiz Henrique, de Santa Catarina - o principal implicado na negociação de um suposto dossiê (Jorge Lorenzetti) contra tucanos é catarinense.

Todos deveriam falar no mesmo tom. Ocorre que o coordenador da campanha tucana, João Carlos Meirelles, escalou uma série de oradores, alguns sem nenhuma expressão, o que retardou o evento. Diante da iminência da dispersão da platéia - funcionários públicos liberados do trabalho pelo prefeito Cesar Maia -, os próprios Aécio e Serra julgaram melhor que Alckmin falasse logo. E o candidato falou duro contra o governo, deixando claro que, na eventualidade de ser eleito, é improvável que ocorra uma transição "civilizada" de poder em Brasília, como foi a passagem de Fernando Henrique Cardoso para Lula: Caso seja eleito, o tucano afirmou que pretende fazer auditorias nas empresas estatais, além de criar, na Advocacia-Geral da União (AGU), um grupo especializado para "recuperar o dinheiro roubado", em operações de desvio de recursos públicos.

Em discurso, Alckmin afirmou que o Brasil vive hoje uma questão maior e mais grave do que a própria corrida eleitoral: a corrupção. Segundo o candidato, os postulantes ao Palácio do Planalto não estão enfrentando candidaturas e sim "uma sofisticada organização criminosa incrustada no Estado brasileiro", disse, referindo-se ao PT de Lula. "Esse é um governo autoritário, como todo governo que tem corrupção", disse o candidato. "Ao lançar o programa de governo, quero dizer que o assunto (aqui) é outro. Quero deixar de lado a questão eleitoral. A questão hoje no Brasil é muito maior. É dever de todos nós brasileiros combater a corrupção".

Para Alckmin, é impossível que o presidente Lula não soubesse do envolvimento de integrantes do seu partido na compra de um dossiê contra ele e o candidato do PSDB ao governo do Estado de São Paulo, José Serra. "Lula dizia que os problemas que ocorreram no governo, ele não podia ver porque um era no segundo andar e outro era no quarto andar. Agora é no terceiro andar (onde fica o gabinete presidencial), nem isso ele pode mais dizer. Assessor direto da Presidência da República envolvido novamente nesse vale-tudo pelo poder. Os fins justificam os meios. (...) O país está envergonhado, mas eles não têm vergonha, perderam a vergonha", disse.

Mestre-de-cerimônias do evento, o prefeito Cesar Maia referiu-se ao presidente Lula, em seu discurso, como um "idiota" e disse que "um mar de lama escorre debaixo da porta dele (Lula), entra, ele pisa e pensa que é chocolate". "Se ele (Lula) é idiota (por não saber das irregularidades), não pode ser presidente. E, se não é idiota (e sabia), também não pode ser presidente".

Ao comentar o suposto envolvimento de integrantes do PT na compra do dossiê, o presidente nacional do PFL, Jorge Bornhausen, afirmou que o partido "estabeleceu um novo item no programa do presidente, o capítulo do crime eleitoral organizado". Para o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, as últimas denúncias mostram que existe uma relação promíscua entre Lula, governo, PT e dinheiro público. "Todos estão no PT e têm cargo público", afirmou. "Lula, PT e governo viraram uma coisa só em família. Isso, a meu ver, apodrece a República".

Já o governador Aécio Neves evitou atacar diretamente o presidente da República, mas considerou que o PT "é um partido despreparado para o poder". Para ele, a situação é grave e cabe à oposição o papel de cobrar uma ação: "Dentro do PT, o comportamento dos últimos tempos é sempre esse, muito questionável do ponto de vista ético. São sucessivos escândalos e denúncias, envolvendo altíssimos dirigentes do PT. Isso para mim mostra, sem necessidade de qualquer outra comprovação, que o PT é um partido despreparado para o poder, para as grandes disponibilidades do país".

Serra, por sua vez, classificou a negociação do suposto dossiê de "baixaria eleitoral" para beneficiar seu adversário do PT, Aloizio Mercadante. "Isso foi organizado pelo PT, pelo presidente do PT, pelo candidato do PT em São Paulo e por outros integrantes desse partido. É algo que envolve dinheiro, milhão, cuja origem tem que ser explicada". Serra disse esperar uma ação eficiente da Polícia Federal e da Justiça. Para Aécio, o episódio vai "ficar conhecido como o maior tiro no pé já dado por um partido político e por um governo". (Colaborou Ana Paula Grabois, do Valor Online)