Título: Empresas amadurecem suas estratégias
Autor: Czapski, Silvia
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2006, Caderno Especial, p. F4

Daqui a três anos, a Natura deverá estar apta a receber o selo de "carbono neutro", comprovando que neutraliza suas emissões de gases causadores do aquecimento global, como dióxido de carbono. Para tanto, trocará equipamentos que usam fontes de energia não renováveis e plantará árvores, como contrapeso às emissões que permanecerem.

Ao fazer o anúncio para os participantes do 3º Fórum Líderes Empresariais para o Desenvolvimento Sustentável, evento da Ecolatina 2006 - 6ª Conferência Latino-Americana sobre Meio Ambiente e Responsabilidade Social, promovida em Belo Horizonte (MG) nesta semana, o diretor de sustentabilidade, Marcos Egydio Martins, avaliou que o novo investimento ambiental favorece a meta da Natura de chegar a 22 países.

Criada em 2005, diz ele, a diretoria de sustentabilidade tem um departamento chamado de "Radar", que identifica o que de melhor se faz nesta área no Brasil e no mundo, visando eventual adaptação pela empresa. Em outubro, a Natura estreará também sua ouvidoria. Sinal de que a sustentabilidade é estratégia vitoriosa, segundo o diretor, é a taxa de crescimento anual da empresa, de 30%. Só que a expansão acelerada gera um dilema para este modelo de gestão, que equipara aspectos econômicos, sociais e ambientais.

"Criamos uma expectativa no mercado, de expansão constante. Nossos fornecedores deveriam se ajustar a este ritmo. Mas isto é difícil para comunidades tradicionais com que trabalhamos. Nosso desafio é conciliar diferenças, obtendo o equilíbrio entre a consistência teórica conceitual da sustentabilidade e o pragmatismo do dia a dia". Aprender com os erros, diz Martins, faz parte do processo.

Maria Luiza Pinto, diretora executiva do ABN-Amro, concorda. Ela lembrou para o mesmo público que, em 2001, o comitê do qual participava o presidente do banco visualizou uma divisão "biodegradável", que se dissolveria em cinco anos, quando o conceito da sustentabilidade estivesse incorporado na cultura da empresa. "Hoje, sabemos que o processo é longo e a área de desenvolvimento socioambiental não deverá desaparecer".

Duas medidas iniciais do ABN-Amro foram a criação do Fundo Ethical, de investimento em empresas social e ecologicamente mais corretas, e a introdução da análise de riscos socioambientais para a concessão de financiamentos. "Nossa postura foi inclusiva, de oferecer aos clientes a oportunidade de melhorarem enfoques sociais, ambientais e econômicos. Mesmo assim, tivemos de encerrar cerca de 45 relacionamentos com quem se recusou", relatou ela.

Outra barreira surgiu ao criar uma cadeia de valor com os fornecedores. "A primeira reação foi de desconfiança. Hoje, mais de 200 integram uma rede que debate periodicamente o progresso na área socioambiental".

Para a Fiat, a ecoeficiência - produzir mais com menos recursos naturais - pavimentou o caminho para a sustentabilidade, segundo o presidente para o Brasil e América Latina, Cledorvino Belini. Para cada carro produzido, o consumo de água caiu de 8 m, para 3,3 m. E a geração de resíduos decresceu de 400 kg por veículo para 210 kg. "Na fábrica de Betim (MG), o que ainda descartamos segue para a ilha ecológica, espaço cedido para empresas, que reciclam cerca de 400 toneladas diárias, ou seja, 93% de nossos rejeitos".

Isto inspirou o programa Fiat Auto Recicling (Fare) que focaliza a responsabilidade da empresa sobre o ciclo de vida do produto, do uso da matéria-prima ao destino final. Num exemplo de Belini: "Passados 12 anos de vida útil, o pára-choque de um veículo pode ganhar sobrevida, reciclado em caixa de ar. Mais 12 anos, em vez do descarte, a caixa se transforma em tubulação do veículo. Na fase 3, a tubulação será matéria-prima do tapete do veículo. Findo este ciclo de 48 anos, o material será incinerado, gerando energia".

Alguns resíduos fertilizam o programa Árvore da Vida, destaque da Fiat na área social. Moradores de comunidades carentes em Betim são capacitados para produzir brindes ecologicamente corretos, com retalhos de materiais descartados no processo produtivo.

Para Ernesto Heinzelmann, presidente da Embraco, que detém 20% da fatia mundial de compressores para refrigeração, elementos essenciais para a sustentabilidade são o investimento na Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e o apoio à educação. Depois de criar sua área de P&D em 1983, e aplicar 3% do faturamento nela, a Embraco ganhou mercado, com produtos inovadores exclusivos. "Hoje, empregamos 410 pessoas em P&D, das quais 240 no Brasil. Estabelecemos a carreira de pesquisador e, desde 1992, temos convênio com a Universidade Federal de Santa Catarina."

Presidente da Amanco-Brasil, Roberto Salas acredita que a opção pela sustentabilidade cria valor para clientes, a empresa e o mercado. Com base no conceito do Balanced Scorecard proposto por Robert Kaplan e David Norton da Universidade de Harvard, a empresa desenvolveu o Sustainability Scorecard (SSC), que incorpora as dimensões social e ambiental. "Introduzimos indicadores de ecoeficiência, saúde e seguridade", cita.

Também mudou o foco da Amanco. Em vez de discutir produção de tubos e conexões, discute-se o transporte de água, cuja abrangência social é maior. "Para cada inovação de produto ou serviço, realizamos estudo de impactos sociais e ambientais, mesmo que a lei não nos obrigue".

Outra decisão é que pelo menos 10% da produção atenda o mercado de baixa renda. "Tivemos de criar uma estratégia de vender menores quantias, com mais freqüência, a um público sem acesso aos bancos. E ampliamos o portfólio, com soluções adaptadas para este cliente. Uma delas é um kit de irrigação para a agricultura familiar, desenvolvido no Brasil, que proporciona economia de até 60% de água".