Título: Dia de votar? Nem pensar
Autor: Torres, Izabelle; Rizzo, Alana; Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 01/11/2010, Política, p. 6

Com índice de 21,5%, abstenção no segundo turno de ontem bate o recorde no país desde a redemocratização, que pertencia ao primeiro turno de 1998. Presidente do TSE diz que ausência de Marina foi uma das razões

Os apelos dos candidatos e a campanha da Justiça Eleitoral para que os eleitores comparecessem para votar não surtiram efeito. Um em cada cinco brasileiros não compareceu às urnas ontem. Foram mais de 29,1 milhões de pessoas fora do processo de escolha do novo presidente da República. Para se ter uma ideia, seria como se todos os eleitores do Distrito Federal, de Minas Gerais e do Rio de Janeiro não tivessem votado. O índice de 21,5% de abstenção foi o maior desde a redemocratização do país (leia quadro ao lado). Até ontem, o recorde de ausências havia sido registrado no primeiro turno de 1998, com 21,49%. No segundo turno de 2006, os faltosos somaram 18,9%, enquanto em 2002 chegaram a 20,5%.

Tiago Queiroz/AE Seção eleitoral em São Paulo sem fila: ausência foi quase o dobro de 1989 Apesar do índice histórico, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, afirmou que a ausência dos eleitores não é preocupante, em face à extensa lista de peculiaridades que envolveu o pleito de ontem. Entre elas, ele inclui a ausência de Marina Silva na disputa. Creio que um dos fatores para a abstenção foi a ausência de outra candidata forte como Marina. Podemos especular que grande parte do eleitorado dela não compareceu. Isso, claro, somado a todos os outros fatores, disse. Pouco mais de 4,5 milhões de eleitores que votaram no primeiro turno deixaram de comparecer às urnas ontem.

São muitas as justificativas para a ausência recorde de eleitores aos locais de votação. Além do feriado prolongado, cada região registrou uma peculiaridade. No Nordeste, por exemplo, há as romarias por conta do Dia de Finados, quando os nordestinos deixam suas cidades com destino principalmente a Juazeiro do Norte, no Ceará.

A exemplo do primeiro turno, houve também outros dois fenômenos comuns: a seca no Norte do país e as migrações sazonais, que levam milhares de eleitores do norte de Minas para o corte de cana no interior de São Paulo. No Rio Grande do Sul, as chuvas fortes de ontem também atrapalharam o deslocamento dos eleitores.

Na Amazônia, a principal dificuldade foi a seca na região, que dificulta o trajeto dos moradores por conta da baixa vazão dos rios. Mais de 72 mil famílias no estado já foram atingidas pela estiagem. Tradicionalmente, entre o primeiro e o segundo turno há um aumento da abstenção. Houve a ocorrência de um feriado prolongado, em que muitos eleitores decidiram viajar, avaliou Lewandowski.

Para o ministro do TSE Arnaldo Versiani, a solução para reduzir o número de faltosos é a implantação do sistema biométrico de identificação de eleitores em todo o país. A urna biométrica pode mudar a partir de 2018 toda essa questão. Vai ser possível reduzir a abstenção com a possibilidade de o eleitor votar no local onde estiver, diz. Ideia semelhante tem outro ministro da Corte, Henrique Neves. A solução é a atualização do cadastro, como já está sendo feito nas cidades onde a votação é biométrica. A tendência também para combater a abstenção é o aprimoramento do voto em trânsito, iniciado este ano, completa.

NO EXTERIOR,AUSÊNCIA DE 57% Se no Brasil o índice de abstenção passou pouco dos 21%, entre os brasileiros que votam no exterior ela passou dos 50%. Por volta das 20h30, quando a votação de eleitores no exterior havia sido concluída em 101 cidades de 71 países, o número era de 57,22% ou seja, mais pessoas faltaram do que compareceram à votação. Os últimos locais a terem seus votos contabilizados foram Vancouver (Canadá), Los Angeles e São Francisco (Estados Unidos), por conta do fuso horário. Entre os eleitores que moram fora do país, José Serra vencia com 54% dos votos válidos contra 46% de Dilma Rousseff, isso com 65% das urnas apuradas.

Os que não foram

1989 » 1º turno - 9.793.809 (11,9%) » 2º turno - 11.814.017 (14,4%)

1994 » 1º turno - 17.460.699 (17,8%) » Não houve segundo turno

1998 » 1º turno - 22.802.823 (21,49%) » Não houve segundo turno

2002 » 1º turno - 20.448.233 (17,7%) » 2º turno - 23.589.188 (20,5%)

2006 » 1º turno - 20.818.234 (16,76% ) » 2º turno - 23.914.714 ( 18,9% )

2010 » 1º turno - 24.610.296 (18,12%) » 2º turno - 29.187.525 (21,50%)*

* Às 23h57, com 99,97% das urnas apuradas

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Pesquisas na mira

O resultado da eleição presidencial deu sobrevida à credibilidade dos institutos de pesquisas. Depois de errarem previsões no primeiro turno e de serem questionados sobre critérios adotados e margens de erro elevadas, os índices apontados nos últimos levantamentos referentes ao segundo turno chegaram muito perto dos números de votos obtidos pelos candidatos. Na véspera da eleição, pelo menos quatro dos institutos apontaram diferença entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) que variavam entre dez e quinze pontos (leia o quadro nesta página). Ontem, as urnas colocaram a petista 12 pontos percentuais à frente do seu adversário. A proximidade dos dados com o placar da votação diminuiu as críticas de políticos e especialistas à atuação dessas empresas.

Ainda assim, o retorno das atividades do Congresso deve trazer à tona todas as divergências em torno das pesquisas eleitorais. Há pelo menos 12 projetos de lei que tramitam no Congresso sobre a divulgação desses levantamentos às vésperas da eleição. A maior parte deles propõe prazo superior a 30 dias para que veículos de comunicação publiquem previsões.

Berlinda Na Câmara, metade das 10 propostas sobre o tema já foi aprovada nas comissões. Uma delas, de autoria do deputado Vicentinho Alves (PR-TO), está pronta para ser votada em plenário e tramita em regime de prioridade. O projeto radicaliza o assunto e proíbe a publicação de pesquisas. Na justificativa, o parlamentar afirma que a ideia é frear a influência desses levantamentos na preferência do eleitorado. Na verdade, há uma verdadeira farra de pesquisas. Colocam insistentemente que determinado candidato vence a eleição, mas não conhecemos a metodologia dessas pesquisas. Por isso, defendo a proposta. Caso contrário, vão continuar fazendo política de uma forma grosseira, tentando induzir o eleitorado, avalia.

Em maio deste ano, o deputado Colbert Martins (PMDB-BA) propôs projeto de lei que ganhou a simpatia da oposição na reta final da campanha. A proposta não proíbe a divulgação de pesquisas eleitorais, mas só autoriza o registro de levantamentos cuja margem de erro seja inferior a 1%. O peemedebista acredita que, se a proposta for aprovada, será possível evitar erros grosseiros nas previsões, como o que aconteceu em São Paulo, há quatro semanas, quando o senador eleito Aloysio Nunes (PSDB) terminou a disputa como o mais votado, apesar de as pesquisas o colarem em terceiro lugar até a véspera do pleito.

Os oposicionistas são os maiores defensores de mudanças e da imposição de normas mais rigorosas para a divulgação de levantamentos sobre intenções de votos eleitorais. Na avaliação de aliados de José Serra, as pesquisas serviram como cabos eleitorais de Dilma Rousseff, já que durante meses mostrou a vitória da candidata já no primeiro turno. Com o argumento de que chegaram perto do cenário real, os institutos agora terão o que dizer em resposta à ofensiva que começou a se desenhar no Congresso. (IT)

QUASER LÁ

Depois de terem a credibilidade colocada em xeque no primeiro turno, os institutos chegaram perto do resultado neste segundo turno, com o Ibope muito próximo dos índices oficiais. Veja os números do último levantamento de cada um deles:

CNT/Sensus Dilma - 57,2% Serra - 42,8%

Ibope Dilma - 56% Serra - 44%

Datafolha Dilma - 55% Serra - 45% Vox Populi Dilma - 57% Serra - 43%