Título: Matemática do lucro
Autor: Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2006, EU & Investimentos, p. D1

A turbulência dos mercados financeiros provocou perdas para muitos gestores de fundos multimercados, mas alguns conseguiram tirar proveito das idas e vindas dos preços de ações, dólar e juros. Entre eles estão os fundos quantitativos, que usam modelos matemáticos para definir suas aplicações. Alguns fundos - como o Santander Dinâmico, o Princípia Hedge Plus, o WestLB Absolut - apresentavam até quinta-feira rentabilidade bem acima dos 11,19% do CDI no ano, segundo levantamento feito pelo Valor com base nos dados do site financeiro Fortuna. Segundo a Arsenal Investimentos, os fundos de arbitragem acumulam variação média de 12,01% até dia 20, para 11,15% do CDI. No mês, a alta é de 0,67%, para um CDI de 0,68%.

A volatilidade do mercado traz oportunidades, afirma Marcello Paixão, sócio da gestora independente Princípia Capital Management. "Se tem mais oscilação, tem maior distorção de preços, algumas ações que são muito boas caem demais e outras nem tão boas sobem e o modelo identifica esses movimentos", afirma. O fundo da Princípia acumulava, até dia 21, ganho de 14,30% no ano.

O Princípia Hedge Plus trabalha principalmente com estratégias de arbitragem, também chamadas de long/short, comprando uma ação e vendendo outra. A decisão do que comprar e vender, porém, é dada por um modelo matemático-estatístico, diferentemente da maioria dos outros fundos da categoria que usam análise fundamentalista, projetando o desempenho da empresa para decidir. "Nosso modelo identifica as ações que descolaram muito umas das outras ou com tendência muito forte de se descolar e aí montamos a operação", diz Paixão. O resultado é que o fundo acaba não sendo tão influenciado pelos movimentos gerais do mercado. Dentro do long/short há ainda duas subestratégias, uma de distorções e outra de tendências entre pares de ações.

Outra estratégia do fundo é de tendência em geral, que busca identificar nos movimentos de papéis ou do mercado indícios de queda ou alta por um período mais longo. "A diferença com relação ao long/short é que, no momento de tendência, são aplicações individuais, não fazemos pares, não há sincronismo entre compra e venda", diz ele, lembrando que o modelo também não usa análises de cenário ou dos resultados das empresas para definir a tendência.

Há ainda uma terceira estratégia: de arbitragem de volatilidade. Nesses casos, o fundo busca ganhar com distorções entre o preço de uma ação no mercado à vista e sua opção. "Verificamos qual a oscilação embutida na ação em relação ao preço da opção e, se houver distorções, compramos ou vendemos a ação e a opção", afirma Paixão. Nesses casos, o fundo opera protegido ao comprar o papel caso haja uma oscilação maior. Em outras ocasiões, o fundo compra uma opção cara de um vencimento e outra barata de outro e ganha no diferencial entre elas. O mesmo acontece com o mercado futuro de juros, onde o fundo aplica uma parcela dos recursos sempre que percebe uma distorção entre as taxas projetadas de um mês para outro. "Mas nosso foco principal é na arbitragem de ações".

Paixão explica que o gatilho para o fundo entrar em uma aplicação é o modelo matemático e estatístico. Mas depois são aplicados filtros qualitativos para aceitar ou não a indicação. Essa limitação se deve ao fato de que o mercado brasileiro é muito menor que o internacional, o que restringe o universo de operações. "Conseguimos ter cerca de 30 opções diferentes de investimento enquanto, lá fora, um fundo quantitativo pode ter 200 em mercados extremamente líquidos", afirma o gestor. Entre os filtros estão a liquidez do papel, ou seja, se a ação que vai ser vendida pelo fundo tem liquidez e não vai sofrer uma corrida (squeeze) que puxaria seus preços e traria fortes perdas para a carteira. O gestor olha ainda se há riscos de fusão ou aquisição ou um grande investidor estratégico interferindo na ação, o que poderia mudar radicalmente o cenário e não seria detectado pelo modelo.

O ambiente de instabilidade é bom para os fundos quantitativos e de arbitragem, afirma Luís Fernando Lopes, sócio da Pátria Hedge Funds, lembrando que essas carteiras costumam não estar ligadas tão diretamente à tendências gerais do mercado como outros fundos. "Há muitas carteiras macro perdendo dinheiro neste mês com a alta do dólar, dos juros e a queda da bolsa, mas os fundos de arbitragem acabam tendo ganhos ou, pelo menos, perdas menores", diz.

No caso do fundo do Santander Banespa, o Dinâmico, que apresenta a melhor rentabilidade entre os quantitativos, são quatro estratégias diferentes, cada uma com seu modelo matemático-estatístico, explica Márcio Appel, superintendente da Santander Banespa Asset Management. "São quatro modelos diferentes, para dólar, taxa de juros, tendência de bolsa e long/short", diz. O Dinâmico é o maior fundo quantitativo do mercado, com R$ 240 milhões de patrimônio e um histórico de quase três anos. "Acumulamos desde o início do fundo rentabilidade equivalente a 114% do CDI até dia 22 de setembro e, neste ano, de 137% do CDI, um desempenho bastante consistente."

Os modelos sempre sofrem um pouco quando há um aumento muito forte na volatilidade, afirma Appel. Por isso, antes de decidir aplicar em um mercado, o modelo analisa todos os demais e busca aplicações que tenham pouca relação entre si, para diversificar ao máximo. "E mantemos limites curtos, assim, mesmo que tenhamos perdas em um mercado, conseguimos sair rapidamente, o que reduz as perdas e permite manter os ganhos obtidos", diz.

Entre os grandes fundos quantitativos, destaque para os do BankBoston, hoje ItauBank (IB). As carteiras Quant e Expert acumulavam no ano, até dia 21, rentabilidade de 10,36% e 10,18% no ano, respectivamente.

Alguns quantitativos não estão tendo, porém, um ano muito bom. Um exemplo é o Singular Quant, que acumulava 6,68% no ano até dia 21. Segundo Paulo Siqueira, gestor da Zoom Asset Management, a carteira teve perdas a partir de fevereiro, mas já está se recuperando e, neste mês, acumulava alta de 2,26%. "É natural um período de perdas, nada fora do planejado", afirma. Ele diz que o fundo deve ser visto como aplicação de mais longo prazo e, para manter as estratégias longas, acaba sofrendo perdas em períodos mais curtos. A carteira da Zoom usa modelos quantitativos com base em estudos de finanças comportamentais aplicados ao mercado de ações.