Título: Magnata do aço brilha como um 'pop star' em Buenos Aires
Autor: Ribeiro, Ivo
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2006, Empresas, p. B8

Lakshmi Mittal, que controla o maior grupo siderúrgico da atualidade, foi o "pop star" do mundo do aço no fim-de-semana na capital argentina. À frente de um conglomerado responsável por quase 10% de todo o aço produzido em 2006, o bilionário indiano chamou a atenção em sua rápida passagem pela reunião organizada pelo Instituto Internacional do Aço e Ferro (IISI, na sigla em inglês), que ocorre uma vez por ano sempre em um país diferente.

No próximo ano será na Alemanha, em Berlim. O empresário chegou a ser cogitado para assumir o cargo de presidente do conselho do IISI, nomeado no domingo para o período de um ano, até outubro de 2007. O escolhido, no entanto, foi John P. Surma, presidente do conselho e principal executivo da siderúrgica americana United States Steel Corp. (US Steel). Mas Lakshmi foi eleito vice-presidente, o que o qualifica para ser o novo presidente do conselho na reunião de Berlim.

O comitê do IISI é formado por 12 membros, entre os quais o brasileiro Jorge Gerdau (que tem mandato até 2007), Surma e o próprio Mittal. O instituto reúne 62 países-membros, que são responsáveis por 98% da produção mundial de aço - 1,13 bilhão de toneladas em 2005. Para este ano, a previsão é alcançar 1,2 bilhão. A China, país cuja produção cresce ao ritmo de 17% ao mês, deve responder por pelo menos um terço desse volume.

Surma era um dos vice-presidentes do IISI. No novo cargo ele substitui o francês Guy Dollé, ex-principal executivo do grupo Arcelor, que travou com o bilionário indiano um acirrado embate durante cinco meses para evitar que a companhia fosse engolfada pela Mittal Steel. Não teve sucesso.

Dollé, licenciado do IISI e longe da Arcelor desde o fim de junho, quando foi efetivada a compra da companhia que dirigia pela Mittal, por US$ 34 bilhões em dinheiro e ações, esteve ausente da 40ª reunião do IISI, que começou no domingo.

Lakshmi, presidente do conselho da Arcelor Mittal, chegou a Buenos Aires no sábado à noite. Havia reservada em seu nome a suíte 2350 do hotel Sheraton Park Tower. Era aguardada também a presença de seu filho Adytia Mittal, diretor financeiro e responsável por outras atividades da Arcelor Mittal.

Dollé capitulou na reta final do embate com Lakshmi, mas deixou duas pedras no caminho do indiano. Uma delas - que envolve a Arcelor Brasil - pode custar uma fatura de mais de US$ 5 bilhões para o grupo do indiano, caso tenha de fazer a oferta pública de ações aos acionistas minoritários da empresa. Para a área técnica e o colegiado da CVM, a Mittal fez uma aquisição de controle da Arcelor. A direção da Mittal argumenta que a operação com Arcelor foi uma "fusão de iguais" e que nenhum acionista dos dois grupos originais terá mais de 50% das ações da nova empresa, gigante que deverá produzir 115 milhões de toneladas de faturar próximo de US$ 90 bilhões neste ano.

A Arcelor Brasil é uma criação engendrada por Dollé desde meados de 2004. Foi anunciada em julho de 2005, em Paris, França, e oficializada em dezembro do mesmo ano na Bovespa. Tem capacidade para produzir 11 milhões de toneladas por ano e faturou mais de R$ 13 bilhões no ano passado. Seu valor de mercado na bolsa paulista é superior a US$ 10 bilhões.

Mas quem chamou a atenção no evento foi Lakshmi. A todo momento, no Palácio San Martin, era abordado por executivos japoneses que queriam lhe apresentar suas esposas. Sorridente e afável, o indiano atendia com muita simpatia. Circulou em vários aposentos do palácio e conversou com seus pares, como o brasileiro Jorge Gerdau que, como ele, tem tido importante papel na consolidação do setor, com aquisições de empresas.

A outra herança deixada por Dollé ao novo homem forte da Arcelor Mittal é o entrave que envolve a siderúrgica canadense Dofasco, adquirida pela Arcelor no início deste ano. Como Lakshmi acertou, no processo de oferta hostil de compra da Arcelor, vender a Dofasco para a alemã ThyssenKrupp, Dollé, em uma de suas inúmeras manobras para se livrar das garras da Mittal, blindou a empresa em uma espécie de "trustée". Agora, está difícil para o indiano desatar esse nó.

A Mittal tem prazo das autoridades americanas até 28 de novembro para vender a Dofasco, de forma a evitar exagerada concentração no mercado americano, onde é dono de 36% das vendas de aços planos. Caso contrário, terá de se desfazer de uma de suas atuais usinas. Duas delas são apontadas: Weirton Steel ou Sparrow Point.

Dollé, que liderou a maior usina de aço do mundo por três anos e sonhava ser consolidador do setor em uma rota paralela à de Mittal, um predador por natureza, virou caça da noite para o dia. Mas a avaliação é que vendeu caro sua derrocada. (IR)