Título: Mauá está fora do próximo leilão
Autor: Capela, Maurício e Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Empresas, p. B8

A usina hidrelétrica de Mauá (PR), com capacidade de 362 megawatts (MW), está momentaneamente impedida de participar do próximo leilão de energia, marcado para terça-feira. É o segundo revés sofrido pelo governo federal, que esperava licitar até seis novos empreendimentos até o mês passado, mas agora só terá condição de disponibilizar três usinas.

A suspensão, que deverá ser alvo de questionamento por parte do governo do presidente Lula, foi concedida pela Justiça Federal do Paraná a pedido do Ministério Público Federal. O motivo é que existem estudos mostrando que o empreendimento a ser construído no rio Tibagi provocaria danos ao meio ambiente.

A primeira baixa do governo aconteceu já no fim de setembro, quando vencia o prazo para apresentação das licenças ambientais. Naquela oportunidade, os empreendimentos de Baixo Iguaçu e Salto Grande, ambos localizados no Estado do Paraná, não conseguiram o documento. Isso significou 400 MW a menos de potência à disposição para este leilão, energia suficiente para iluminar uma cidade com 2 milhões de habitantes.

Sendo assim, por ora, só três projetos de energia nova têm condição de ir à leilão. São eles: Dardanelos (MT) com capacidade de 261 MW; Barra do Pomba (RJ), com 80 MW; e Cambuci (RJ), com 50 MW.

Diante de tanta incerteza quanto ao sucesso do novo leilão, o Valor procurou algumas companhias que se credenciaram a disputar as usinas novas e também conversou com especialistas do setor. Para eles, portanto, é consenso que, dos três novos empreendimentos, a hidrelétrica de Cambuci provavelmente não deverá atrair interessados. O motivo é a diferença entre o preço de referência e o preço-teto permitido pelo Ministério de Minas e Energia. Segundo o edital, o valor-limite para energia de fonte hídrica é de R$ 125 por megawatt/hora (MWh) e de R$ 140 por MWh de térmica.

É justamente aí que reside o problema na usina de Cambuci. Seu preço de referência é de R$ 152,24 por MWh. "Apesar de ser positivo o governo reconhecer que essa usina teria que ter um valor mais alto, o fato é que o teto é de R$ 125. Portanto, acho muito difícil ter algum interessado neste empreendimento por conta dessa diferença", afirma Antonio Sellare, vice-presidente de Relações com Investidores da Energias do Brasil, controlada pela portuguesa EDP. "Cambuci, a princípio, é um projeto inviável", completa José Lázaro Rodrigues, diretor da Alusa.

As duas companhias estão inscritas no bloco de geração nova de energia, mas têm visões diferente sobre o leilão. Para Sellare, o pregão será mais competitivo que os anteriores, enquanto que Rodrigues acredita em uma menor disputa entre os inscritos. "Os valores são muito apertados", diz o diretor da Alusa, que tem disposição em investir perto de R$ 500 milhões em geração.

Já a estatal Eletrobrás informou que pretende entrar na disputa pela concessão das usinas de Barra do Pomba, Cambuci e Dardanelos. No primeiro leilão de energia nova, em dezembro do ano passado, a estatal teve participação em cinco das sete hidrelétricas licitadas e responderá por cerca de 67% de toda a energia gerada por elas.

No pregão de 2005, a Eletrobrás arrematou, por meio da subsidiária Furnas, sozinha a concessão das usinas de Simplício (MG/RJ) e Paulistas (GO/MG). Já a Eletrosul ganhou a disputa por Passo São João (RS).

Além disso, a Eletrobrás vai construir a usina de Baguari (MG), em parceria com o setor privado, e ajudará na construção de Retiro Baixo (MG).

Se a Eletrobrás está disposta a participar fortemente neste leilão, a Energias do Brasil, apesar de manter a discrição, não deve ficar atrás. Isso, porque a companhia tem um audacioso plano de duplicar sua capacidade de geração em até quatro anos e para isso tem só de recursos próprios algo como R$ 1 bilhão. Nos últimos anos, a empresa investiu sozinha R$ 960 milhões para subir sua capacidade de 530 MW para 1,043 mil MW.

Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), reconhece que a participação de 45 empresas na disputa por geração e mais 24 na distribuição está dentro da expectativa, mas reitera que esse modelo não atrai o investidor privado. "Esse modelo não remunera o capital privado, porque se não houver retorno de 15% sobre o investimento que é necessário para se construir uma usina, ninguém faz", afirma Pires.

O diretor do CBIE considera que o gargalo principal do setor é o preço, que está abaixo do mercado e que foi criado de forma artificial. Tanto que acredita que a tarifa para fontes hídricas deveria girar, no mínimo, acima de R$ 140 por MWh.

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que o leilão está em linha com a sua expectativa. A EPE é uma companhia do Ministério das Minas e Energia.

Segundo relatório de análise dos empreendimentos divulgado pela EPE, os custos de construção das hidrelétricas, incluindo obras civis e as despesas para reparar danos ambientais, reduziu entre 17% e 26% o valor do investimento total nas usinas que havia sido proposto nos estudos de viabilidade econômica.

O valor de Barra do Pomba caiu de R$ 347,8 milhões para R$ 256,5 milhões; Cambuci foi reduzida de R$ 263,4 milhões para R$ 217,7 milhões; e Dardanelos diminuiu de R$ 728,4 milhões para R$ 585,9 milhões. Outros dados são comuns a todos os empreendimentos: vida útil de 30 anos, seguro operacional no valor anual de 0,5% do investimento total e custo do capital próprio de 13,20%.