Título: O acionista é rei
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, EU & Investimentos, p. D1

Atualmente, um quarto do volume da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) refere-se a negócios de pessoas físicas. Por isso, muitas empresas vêm tomando medidas para atrair o pequeno acionista. São crescentes as preocupações das companhias em garantir que suas ações tenham boa liquidez e valor acessível para potenciais investidores de menor porte. Assim, fica mais fácil mesmo para os pequenos investidores terem uma carteira diversificada e com papéis de fácil negociação.

Como amostragem dessa preocupação crescente com a pessoa física, apenas neste ano, dez empresas aprovaram desdobramentos de ações, que reduzem o valor mínimo para compra de um papel. Dezoito empresas criaram programas de recompra de ações pela própria companhia, para evitar quedas muito bruscas das cotações. A recompra também aumenta a demanda e reduz o número de papéis no mercado, ampliando o valor do dividendo para os minoritários.

Além disso, neste ano, mais dez ações passaram a ter formador de mercado, ou "market makers". Esses agentes, em geral corretoras, são contratados para negociar os papéis diariamente e cumprir qualquer oferta de compra e venda de ações dentro de uma banda de preço. Com isso, garante-se a liquidez das ações.

Há um maior número de medidas em favor dos acionistas este ano não só por conta da forte alta registrada até maio, mas também porque mais pessoas físicas estão interessadas, diz Ricardo Pinto Nogueira, superintendente de operações da Bovespa. E isso acaba beneficiando o mercado. "As empresas que ganharam mais liquidez ultimamente têm respeitado esses padrões de bom tratamento à pessoa física." Quem ainda não tem, mas quer ter mais pequenos acionistas, investe nessas medidas para atraí-los, completa Nogueira. "Para as empresas, a vantagem dos aplicadores locais é que eles costumam ser mais estáveis, o que reduz a oscilação das ações."

Um exemplo desse esforço é dado pela Lojas Renner, que desdobrou por cinco suas ações na terça-feira. Dessa forma, os papéis que rondavam R$ 125,00 e eram negociados em lotes de mil ações que custavam ao acionista R$ 12,5 mil, agora podem ser adquiridos por qualquer um que tenha R$ 2,5 mil, explica José Carlos Hruby, diretor de Relações com Investidores da rede varejista. "Esperamos crescer o percentual de pessoas físicas em nosso capital social, hoje em cerca de 1%."

A pessoa física que investe na bolsa quer diversificar, por isso é importante que as ações tenham valores baixos, diz Sergio Pedreiro, diretor de RI da ALL, que desdobrou suas ações em dez em setembro. "Com mais pessoas físicas, nossa ação será menos volátil." Segundo Nogueira, da Bovespa, para que a ação tenha mais liquidez, a bolsa recomenda preços entre R$ 10 e R$ 50. O ideal para a bolsa seria uma cotação entre R$ 20 e R$ 30 "Esse é o nível ótimo de negociação", diz.

Além do desdobramento, algumas empresas fazem o grupamento de papéis para facilitar a negociação por pequenos investidores. Nesse caso, ocorre o inverso, com cinco ações virando apenas uma, por exemplo. Neste ano, 13 empresas fizeram grupamentos. "Quando o papel é muito caro ou muito barato, o investidor não gosta muito", diz Nogueira. Além disso, a ação muito barata tende a oscilar mais, pois qualquer centavo no preço tem impacto grande.

Outra medida pró-acionista é a recompra de ações. Para reduzir a volatilidade por motivos conjunturais, a Company, por exemplo, aprovou em junho um programa desse tipo, diz Luis Rogélio Rodrigues Tolosa, diretor de RI. "A idéia não é mexer no preço, mas alterar uma percepção equivocada do mercado." No entanto, apesar da aprovação do programa de recompra, Tolosa afirma que ele não foi colocado em prática, por conta da recuperação do mercado.

Se a empresa achar que a ação está muito barata, seria economicamente atrativo para os acionistas que ela recomprasse papéis no mercado porque melhoraria a rentabilidade da ação, que cairia menos, e os dividendos dos demais acionistas, diz Nogueira, da Bovespa. "Não será manipulação de preço se a empresa divulgar o valor total de recompra e o prazo em que ela será feita." A operação pode ser uma maneira de elevar os dividendos porque reduz o número de acionistas pelos quais eles serão divididos, explica ele, lembrando que as ações recompradas, normalmente mantidas na tesouraria da empresa, não têm direito a dividendos. "Todos os acionistas ganham com a recompra de ações", diz Tolosa, da Company.

A maior parte das 18 empresas que aprovaram programas de recompra de ações neste ano o fizeram entre os meses de maio e junho. A rápida crise desse período fez com que as ações caíssem demais, por motivos conjunturais. Em maio, por exemplo, o Ibovespa recuou 9,5%. "A ação da Company caiu a um preço pelo qual achávamos que não valeria a pena negociá-la, por isso aprovamos o programa de recompra de até 1,76 milhão de ações", diz Tolosa.

Tanto o programa de recompra de papéis quanto o desdobramento ou grupamento de ações têm de ser aprovados em assembléia geral de acionistas. Portanto, nenhuma empresa brasileira pode arbitrariamente alterar seu capital social sem que tenha voto da maioria dos acionistas. A adoção do market maker, no entanto, pode ser decidida pelos controladores como por grupos de acionistas da empresa.

Maior liquidez é sinal de maior confiança do mercado na empresa, diz Tolosa. "Por isso, para empresas novas no mercado, a liquidez muitas vezes é mais importante do que o preço da ação." Nesse sentido, a Company contratou em maio também um market maker.

As atitudes são acompanhadas de medidas administrativas na maioria dos casos. Hruby, da Renner, diz que a empresa quer estar cada vez mais presente em apresentações feitas para analistas de investimentos ou mesmo diretamente para aplicadores. Tolosa, da Company, diz que a empresa tem distribuído e-mails e feito reuniões periódicas por telefone com agentes do mercado. A maior parte dos investidores pessoa física tem acessado o mercado pelo home broker, sistema de negociação eletrônica da Bovespa. Por isso a preocupação das empresas com divulgações eletrônicas é crescente.