Título: Brasil tenta acordo para cota de agrícolas
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 19/01/2007, Brasil, p. A3

Brasil e Estados Unidos estão tentando amarrar um acordo com a União Européia para garantir a expansão de cotas tarifárias para seus principais produtos agrícolas, que leve à retomada da Rodada Doha na Organização Mundial do Comércio (OMC). O subsecretário de assuntos econômicos do Itamaraty, Roberto Azevedo, confirmou ontem que, "como boa parte das exportações brasileiras e americanas vai cair na categoria de produtos sensíveis na Europa, é essencial tratar da expansão de cotas".

Azevedo reuniu-se nos EUA com o principal negociador agrícola americano, Richard Crowder. O diretor-geral de agricultura da UE, Jean Luc de Marti, também está na capital americana. As discussões, ou "consultas" no jargão negociador, vão prosseguir na semana que vem, à margem do Fórum Mundial de Economia, em Davos (Suíça).

A expectativa é de que um acordo entre Brasil, EUA e a UE sobre produtos-chave na agricultura possa diminuir as resistências dos lobbies dos agricultores americanos e europeus. Um avanço sobre o número de produtos que um país pode declarar como "sensível" e a tarifa a ser aplicada a tais produtos ajudaria outros membros da OMC a resolver as cifras mais importantes, que são a redução dos subsídios e das alíquotas agrícolas.

Como é grande a ambição dos exportadores para reduzir tarifas agrícolas na Rodada Doha, países protecionistas exigiram várias "flexibilidades". Os ricos serão autorizados a designar um limitado número de "produtos sensíveis"; países em desenvolvimento de "produtos especiais", que terão corte tarifário abaixo da fórmula geral.

Países que designarem "produtos sensíveis", como os europeus, têm de assegurar "melhora substancial" no acesso ao seu mercado para cada um dos produtos. A discussão entre Brasil, EUA e UE está focalizada na expansão dos volumes de cotas para esses produtos e redução das tarifas fora da cota. Importação dentro da cota é submetida a alíquota bem mais baixa. Às vezes, a tarifa sobre a importação que excede a cota (extra-cota) pode ser proibitiva. Em muitos casos, o Brasil é tão competitivo que exporta substancialmente tanto dentro como fora da cota.

Na atual negociação, as carnes estão entre os produtos de maior interesses do Brasil para ampliar o acesso ao mercado. A UE já acenou com aumento de importação entre 800 mil e 1 milhão de toneladas por ano para carne bovina. Também indicou oferta adicional de 250 mil toneladas para entrada de carne de frango, somando-se a cota atual de 400 mil toneladas.

Mas as cifras européias são contestadas. Americanos dizem que a UE só oferece 160 mil toneladas a mais para carne bovina. O resto não seria parte do acordo, mas resultado da redução de tarifa.

Roberto Azevedo ressalvou que vários outros elementos estão em discussões entre Brasil, EUA e UE, não apenas produtos sensíveis e expansão de cotas. O que está claro é que, em vez de só ficar discutindo fórmulas tarifárias, os principais países barganham firme. É o que Pascal Lamy, diretor da OMC, chama de "mundo real".

Mas persiste o pessimismo sobre os rumos da Rodada Doha. O comissário para o Comércio da UE, Peter Mandelson, previu ontem que uma solução satisfatória está "por um fio e há a possibilidade de sucesso à medida que passamos aos minutos finais do jogo nessas conversações cruciais, que ou serão bem-sucedidas ou fracassarão de vez nos próximos meses".

Segundo a Bloomberg, Mandelson alertou que se um acordo não for obtido este ano, "é provável" que as negociações na OMC só sejam retomadas "depois de 2009".

Em visita à Índia, Pascal Lamy insistiu na importância de concluir a negociação rapidamente. Alertou para a proliferação de acordos bilaterais de comércio, estimando que eles serão 400 até 2010 - o que significa um emaranhado de regras diferentes, com custo adicional para os exportadores.