Título: Barrados no baile
Autor: Durão, Vera Saavedra e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2007, EU & Investimentos, p. D1

Um grupo de acionistas minoritários, detentores de ações preferenciais (PN, sem direito a voto), já se articula para contestar pontos da operação de aquisição da Ipiranga pelos grupos Ultrapar, Petrobras e Braskem. A primeira insatisfação dos minoritários foi com o preço na relação de troca proposta aos detentores de preferenciais em relação ao valor pago aos controladores nas operações anunciadas ontem. O sócio da gestora Hedging-Griffo Luis Stuhlberger confirmou ao Valor que o grupo, composto por diversos fundos que detêm ações das empresas do Grupo Ipiranga envolvidas na reestruturação, já está contratando advogados para analisar a operação e as medidas que podem ser tomadas. O grupo também se reúne na próxima quinta-feira com a Associação Nacional dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec). "Querem que nós troquemos um gato por meia lebre", disse Stuhlberger. "O preço é pelo menos três vezes mais vantajoso para os controladores."

Pela operação divulgada ontem, a Ultrapar vai adquirir numa primeira etapa os papéis dos acionistas controladores da Refinaria de Petróleo Ipiranga (RIPI), da Companhia Brasileira de Petróleo Ipiranga (CBPI) e da Distribuidora de Produtos de Petróleo Ipiranga (DPPI). Num segundo estágio, a Ultrapar terá 30 dias após o fechamento da primeira etapa para ingressar com pedido de registro de oferta pública para aquisição de ações ordinárias (ON, com direito a voto) dos minoritários dessas empresas. Os preços para esta oferta são de R$ 58,1 para a Petróleo Ipiranga, de R$ 106 para a ação da refinaria e de R$ 112 para a distribuidora. Numa última etapa, ocorrerá uma incorporação de ações dos preferencialistas, cujo cálculo tem como base o valor econômico das empresas. Para cada ação da Petróleo Ipiranga, o minoritário de PN receberá 0,41846 de Ultrapar; da distribuidora recebe 0,64048; e da refinaria, 0,79850.

Segundo análise da Hedging-Griffo, com o preço de sexta-feira das ações da Ultrapar, o ágio das ONs com relação às PNs variava entre 170% no caso da refinaria e de 255% no caso da distribuidora. Ontem, com o preço das ONs da Ultrapar em R$ 52, a relação de troca seria de 2,55 vezes maior para os detentores de ordinárias no caso da Refinaria Ipiranga; de 2,6 vezes maior no caso da Petróleo Ipiranga; e de 3,36 vezes na distribuidora. Segundo a gestora, os prêmios variam entre 155% (RIPI) e 236% (DPPI) para os detentores de ON.

O sócio da Hedging-Griffo disse que ainda não sabe qual estratégia vai seguir. "As informações vieram a público hoje (ontem), estamos analisando, é prematuro falar qualquer coisa, é sempre bom avaliar tudo mais profundamente antes de destacar os problemas. Mas o que nos salta aos olhos são aspectos que nos desagradam", afirmou.

Stuhlberger lamentou que questões opondo minoritários e controladores continuem ocorrendo. "É um lado triste do capitalismo brasileiro, essa operação não é a primeira, tivemos casos como os de Tele Centro Oeste Celular e Ripasa, que foram semelhantes, e o de Telemar, que embora diferente suscitou muita polêmica", analisou Stuhlberger, que se mostrou mais esperançoso ao avaliar o resultado dessas últimas disputas.

Segundo um advogado ouvido pelo Valor, o problema é a operação de incorporação de ações para os preferencialistas. "Se a empresa optasse pela OPA e não pela incorporação, poderia evitar disputas com os minoritários, como vem acontecendo em outros casos semelhantes", disse.

A primeira reclamação de investidores minoritários chegou ao conhecimento das empresas logo durante a apresentação aos analistas, ontem, em São Paulo. Um investidor, sem se identificar, desabafou, por telefone, reclamando da operação de troca de ações entre Ultrapar e Ipiranga. "Há uma desvalorização muito prejudicial para os preferencialistas", disse, mostrando-se indignado com o valor da relação de troca entre ações PN da Ipiranga e da Ultrapar. "Os controladores da Ipiranga só aceitaram a oferta porque receberam um prêmio de 6,5 vezes a 7 vezes o valor dado aos preferencialistas", disse. "É muito discrepante."

A queixa criou um constrangimento aos presidentes das três empresas compradoras. Em defesa, Pércio de Souza, da Estáter Gestão e Finanças, empresa que assessorou Ultra, Braskem e Petrobras, intercedeu: "As avaliações das empresas foram feitas com isenção e a mais justa na troca de ações", disse. Aparentemente, a resposta não ajudou a convencer o investidor. Ele reclamou, apontando que as ações PN despencavam na bolsa naquele momento enquanto os papéis da Ultrapar subiam.

Apesar de admitir a existência de minoritários desfavoráveis à operação, o empresário Paulo Cunha, presidente do conselho de administração da Ultrapar, disse que via o negócio como uma boa oportunidade. "Vamos fazer com que os ativos gerem valor para todos os acionistas: não só aos que chegam com a Ipiranga, mas também para os demais acionistas da Ultrapar."

Segundo os últimos dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) é uma das maiores detentoras de ações preferenciais das empresas do grupo Ipiranga, como a refinaria e a distribuidora. Procurado pelo Valor, o fundo de pensão do BB preferiu não comentar o assunto e disse ainda estar analisando.