Título: Cultura do consumo explode na Venezuela
Autor: Sanchez, Fabiola
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2007, Internacional, p. A11

Cirurgias plásticas no rosto e implantes de silicone nos seios cresceram a um ritmo acelerado. As vendas de BMWs dispararam. E novos shopping centers brotam nas áreas abastadas da capital da Venezuela.

Apesar dos apelos do presidente Hugo Chávez para que os venezuelanos adotem valores socialistas mais ascéticos, uma cultura de consumo está florescendo no país. Venezuelanos estão comprando tudo, de celulares a uísque escocês, à medida que a economia sente os benefícios dos altos preços do petróleo e à medida que a competição por clientes já levou os bancos a cortarem pela metade os juros para empréstimos.

Os venezuelanos compraram 343 mil carros em 2006, um aumento de 50% em relação a 2005. "Tudo está vendendo muito - utilitários esportivos, pickups, ônibus, tudo", diz Jorge Garcia Tunon, que dirige uma das maiores revendedoras de Caracas. "A demanda é impressionante. O mercado cresceu como louco."

Outras áreas experimentaram demanda semelhante. Os gastos dos consumidores cresceram históricos 20% no ano passado em relação ao ano anterior, segundo estimativas do instituto privado de análises econômicas, Datanalisis.

Sete novos shoppings foram construídos em 2006 e neste ano outros 13 devem ficar prontos.

Cirurgias plásticas também se tornaram um negócio pujante. O país registrou um recorde no ano passado: 30 mil mulheres - de uma população de 26 milhões de venezuelanos - submeteram-se a cirurgias para aumento dos seios, 80% a mais do que 2005, segundo a Sociedade de Cirurgia Plástica Venezuelana. É uma das maiores proporções entre os países da região.

O aquecimento econômico está baseada no petróleo, que representa 78% das importações e 14% do Produto Interno Bruto (PIB). Este ano 45% das receitas do Estado devem vir do petróleo.

A onda de consumo chegou a todas as camadas sociais, incluindo aos venezuelanos de baixa renda. O aumento do número de funcionários públicos, os novos benefícios oferecidos pelo governo e os reajustes do salário mínimo têm ajudado a pôr dinheiro no bolso da população - ainda que a inflação alta morda parte dos ganhos.

No domingo, Chávez classificou o aumento de consumo entre os mais pobres como um sinal de uma mudança econômica positiva. "Faz parte da nossa política buscar a equidade." A expansão das linhas de crédito também contribuíram para a disparada nos gastos. O portfólio de empréstimos cresceu 118% atingindo US$ 6 bilhões no ano passado, segundo a consultoria Softline.

Para os ricos, novas revendedoras abriram suas portas com BMWs, Audis e Hummers - este último um esportivo vendido em média por US$ 93 mil.

Chávez diz regularmente que o capitalismo é um mal e defende que os venezuelanos abandonem sua gana por riqueza. "O consumismo leva em si uma célula que poderíamos chamar de cancerígena: a corrupção. Qual é a raiz da corrupção? O desejo de possuir bens materiais", ensinou o presidente a milhares de simpatizantes num evento recente no qual cobrou a adoção de ideais socialistas.

Mas para alguns, encorajar os venezuelanos a mudarem seus hábitos é algo difícil. "Estamos acostumados a um estilo de vida livre, à sensação de ter somente por ter", explica Antonio Garcia, de 49 anos, enquanto procura um novo aparelho de TV. "Tentar nos enquadrar no socialismo não vai funcionar aqui."