Título: Lula despede-se do Conselhão
Autor: Silveira, Igor
Fonte: Correio Braziliense, 03/12/2010, Política, p. 8

Na última reunião com lideranças econômicas, presidente defende a importância do grupo e critica medidas tomadas na área por governos anteriores

Na contagem regressiva para deixar o cargo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem passado por despedidas bastante simbólicas. Ontem, a 36ª plenária do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) marcou mais um desses atos. Criado em 2003 e formado por cerca de 150 lideranças, o grupo conhecido como Conselhão nasceu com a desconfiança de uma parcela dos participantes, que chegou a realizar uma reunião paralela antes do primeiro encontro, com o receio de que alguns assuntos pudessem ser manipulados à revelia dos principais interessados. No último discurso feito como presidente da República no CDES, Lula agradeceu o apoio dos integrantes ao longo dos dois mandatos e ressaltou a união do conselho nos momentos mais difíceis dos últimos oito anos, especialmente, na crise mais grave da gestão petista, em 2005, durante o auge do mensalão.

O presidente classificou o episódio como ¿uma tentativa de golpe¿. Lula se referia às acusações de pagamentos de mesadas a parlamentares para que matérias de interesse do governo federal transitassem sem grandes entraves. Ainda no âmbito das relações políticas do mandato petista, Lula alfinetou os parlamentares que se posicionaram contra a criação do Conselhão.

¿Quando estávamos para nos reunir pela primeira vez, houve uma ciumeira danada no Congresso. Algumas pessoas lá achavam que a criação do conselho, de alguma forma, iria diminuir o poder da Câmara e do Senado¿, disse o presidente.

Lula também criticou, mais uma vez, medidas tomadas em governos anteriores. De acordo com ele, o Brasil paga, até hoje, as contas de planos econômicos que não deram certo. O presidente citou nominalmente Maílson da Nóbrega, economista que foi ministro da Fazenda na gestão de José Sarney. ¿Eu achei aquilo (o plano) uma catástrofe. Hoje, estamos pagando esqueletos de vários planos porque havia um hábito de tratar a Economia como se fosse uma questão de mágica. Ou seja, um cidadão tinha uma tese que, depois, não dava resultado e ninguém assumia a culpa pelos erros. O ministro caía, o país ficava com o prejuízo e entrava outro ministro. Era uma coisa maluca¿, disparou Lula.

Herança bendita Ainda durante a reunião do Conselhão, Lula lembrou que a presidente eleita, Dilma Rousseff, receberá uma herança bendita do atual governo. Ele citou, como exemplo, que o Brasil tem as três maiores hidrelétricas em construção do mundo ¿ Belo Monte, Jirau e Santo Antonio ¿, falou da revitalização de ferrovias e destacou a importância da descoberta do pré-sal.

¿Dilma não vai receber herança maldita, diferentemente do Barack Obama, que pegou uma impagável do Bush. Até porque ela fez parte da construção dessa herança e sei que é uma herança bendita¿, brincou.

Papo com radialistas A iniciativa de conceder entrevistas coletivas a grupos de minorias também está se transformando em praxe na rotina de despedidas do presidente Lula. Há pouco mais de uma semana, o petista abriu espaço na agenda para receber blogueiros. Ontem, foi a vez de representantes de rádios comunitárias. No Palácio do Planalto, Lula e oito radialistas conversaram por cerca de uma hora. Entre os assuntos, o presidente defendeu a necessidade de uma nova lei de regulação da mídia porque, de acordo com ele, a legislação de 1962 está ¿atrasada¿.

O presidente adiantou que está preparando uma proposta para ser apresentada, ainda neste ano, para que sirva como ponto de partida de um debate no governo Dilma Rousseff. Lula disse que a presidente eleita vai escolher alguém para o Ministério das Comunicações que tenha afinidade com a democratização dos meios de comunicação.

¿Esse debate (regulação das mídias) tem de acontecer agora porque nós temos um conjunto de regras de 1962. É muito antiga: não tinha fax, telefone celular, internet ou TV digital. Eu acho que nós chegamos a um ponto de equilíbrio no debate com a sociedade porque existe uma pluralidade maior atualmente¿, concluiu. (IS)