Título: Meta de inflação para 2009 pode ficar abaixo de 4,5%
Autor: Ribeiro, Alex e Safatle, Claudia
Fonte: Valor Econômico, 26/03/2007, Brasil, p. A3

A meta de inflação de 2009 ainda não está definida e, ao contrário do que defendeu publicamente o ministro da Fazenda, Guido Mantega, poderá ser um percentual inferior a 4,5%. É o que dizem economistas oficiais com assento no Comitê da Moeda e do Crédito (Comoc), o órgão técnico que assessora o Conselho Monetário Nacional (CMN) nas suas decisões, incluindo a definição da meta de inflação para o país.

Há duas semanas, Mantega defendeu uma meta de 4,5% com o argumento de que essa seria a inflação ideal no país, considerando o grande peso das "commodities" e dos preços administrados na inflação brasileira. "Foi muito bom o ministro expressar a sua opinião porque coloca o debate na rua, mas o assunto só vai ser definido em junho", afirmou um economista do governo.

O secretário-adjunto de Política Econômica, Nelson Barbosa, disse que ninguém no governo discute o princípio de que no longo prazo é melhor ter uma inflação mais baixa com crescimento mais alto. "Agora, se vamos ter uma inflação de 4,5% em 2009, ainda é muito cedo para ter uma visão mais clara."

Para Barbosa, no longo prazo uma inflação de 4% pode ser considerada alta, pois está num patamar que incentiva a indexação da economia. O ideal, afirma o secretário, seria um percentual entre 2% e 3%.

Segundo Barbosa, o que está em debate é a velocidade ótima para conduzir o processo de desinflação. "Se (a inflação) converge muito devagar (para níveis mais baixos), corre o risco de ter um choque de oferta no meio do caminho, a inflação não cair e voltar a indexação, tornando a inflação mais rígida", pondera o secretário. "Se converge muito rapidamente, uma taxa de juros muito alta pode gerar problemas de uma valorização cambial excessiva e ainda prejudicar as finanças públicas."

O debate, afirma Barbosa, é se vale a pena crescer menos para desinflacionar mais rápido ou não. "Não se trata de ter mais inflação para ter mais crescimento", argumenta o secretário. "A questão é se vale a pena convergir para uma inflação de 2% em dois anos e crescer 3% ou convergir para uma inflação de 2% em quatro anos e crescer 4%."

Uma fonte que participa das discussões no governo diz que não há porque descartar, antecipadamente, a hipótese de a meta de inflação ser fixada em um percentual inferior a 4%. "Há algumas vantagens, que devem ser bem pesadas." Uma delas, disse, é o fato de que o mercado financeiro projeta para 2009 uma inflação de 4%. Como a política monetária ampliou sua credibilidade nos últimos anos, a própria definição da meta tem um papel importante na formação das expectativas.

O estrategista-sênior para a América Latina do Banco WestLB, Roberto Padovani, afirma que a seqüência recente de choques positivos de oferta, como a valorização do câmbio e a queda de preços agrícolas, deixa os preços da economia temporariamente fora do lugar e torna mais difícil apontar o nível ótimo de inflação. "Mas a inflação projetada pelo mercado para 2009, de 4%, é uma boa dica de onde a inflação está se acomodando", afirmou.

Na visão de Padovani, quando o ministro Guido Mantega faz a defesa de um percentual de 4,5%, ele não parece estar movido por uma preocupação técnica de achar o nível ótimo de inflação. Estaria, sim, agindo com a crença de que um pouco mais de inflação vai gerar mais crescimento. "É um equivoco essa visão de que os juros definidos pelo Banco Central limitam o crescimento", afirma. "O que segura o crescimento são os baixos investimentos na economia."

Um aspecto central nos debates é que, em tese, uma meta mais elevada pode dar uma margem de manobra adicional para o Banco Central acomodar eventuais choques de oferta.

A economista-chefe da Mellon Global Investment Brasil, Solange Srour, afirma que seria um erro aumentar a meta de inflação para acomodar eventuais choques. Ela sustenta, em primeiro lugar, que a economia brasileira ficou menos suscetível a choques negativos, depois que foram fortalecidos alguns fundamentos da economia, com medidas como a redução da dívida externa e o acúmulo de reservas internacionais.

Além disso, argumenta a economista, no sistema de metas de inflação já existe um intervalo de tolerância, hoje em dois pontos percentuais para baixo e para cima, justamente para acomodar esses desvios. "O intervalo de tolerância do sistema de metas já é bastante confortável hoje em dia", diz Solange Srour. "Mas, se o governo acha que deve ter uma margem ainda maior, pode-se discutir o intervalo de tolerância, mas nunca a meta de inflação em si", afirma.