Título: Câmbio acelerou expansão no exterior
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2007, Brasil, p. A3

A valorização do real está acelerando a internacionalização das empresas brasileiras. Companhias líderes como Marcopolo, Embraco e Embraer apostam suas fichas nos mercados emergentes, principalmente China e Índia, onde acreditam que estão os maiores potenciais para crescimento futuro das vendas. A internacionalização se tornou a única maneira de romper as barreiras protecionistas dos países e também um mecanismo para se defender da Rodada Doha, da Organização Mundial de Comércio (OMC), que promete baixar as tarifas de importação do Brasil.

"A internacionalização deixa de ser uma opção para ser uma estratégia de sobrevivência", afirmou José Martins, vice-presidente do conselho de administração da Marcopolo, ontem, em São Paulo, durante o seminário "Desafios Emergentes", organizado pelo Conselho Empresarial Brasil-China. Ele conta que a empresa decidiu acelerar a entrada nos mercados indiano e russo, respectivamente, o segundo e terceiro maiores fabricantes de ônibus do mundo, por conta da valorização do real.

Na Índia, a Marcopolo firmou joint venture com o conglomerado Tata, na qual detém 49%, contra 51% dos indianos. O investimento inicial foi de US$ 13,5 milhões, e prevê produção de 4 mil ônibus no primeiro ano. Mas o objetivo é atingir 25 mil unidades. Será a maior operação da Marcopolo no mundo, superando as vendas totais da empresa hoje. Em 2006, a companhia gaúcha, com sede em Caxias do Sul, produziu 15,7 mil ônibus, 5 mil no exterior. A Marcopolo possui fábricas em Portugal, México, Colômbia e África do Sul.

Na China, maior mercado mundial de ônibus com 70 mil unidades, a experiência da Marcopolo não é tão bem sucedida. A empresa ainda está em busca de um parceiro local, provavelmente uma empresa privada, diz Martins. "A concorrência é muito forte", explica. A companhia chegou a ter um contrato de transferência de tecnologia com a Iveco, mas o negócio não prosperou por desavenças com o parceiro chinês do negócio. Hoje a Marcopolo possui na China apenas uma empresa para importação de componentes. Martins considera importante produzir no país asiático como estratégia de defesa. "Se os chineses exportarem para nossos mercados cativos na América Latina, temos que contra-atacar de onde eles estão", afirma.

O diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Antônio Barros de Castro, explica que o real forte aumentou a capacidade das empresas brasileiras de adquirir ativos no exterior. Ele considera a internacionalização benéfica, quando a companhia sai do país para conseguir acesso a mercados ou para adquirir tecnologia.

"As empresas brasileiras estão convivendo com uma nova onda de internacionalização, que é uma estratégia de acesso a mercado para romper a barreira protecionista, inclusive na China", avalia Carlos Geraldo Langoni, diretor do centro de economia mundial da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.

É o caso de Embraco e Embraer, fabricantes de compressores para refrigeração e aviões, que estão produzindo na China para driblar o protecionismo, mas acreditam em um imenso potencial de lucro. "A China será o local de crescimento mais rápido da empresa", diz Ernesto Heinzelmann, presidente da Embraco. A Embraco investiu US$ 65 milhões e inaugurou uma nova fábrica na China em maio de 2006 com capacidade para 4,5 milhões de compressores.

"O foco ainda é o mercado doméstico. Tem sobrado pouco para a exportação na região", diz Heinzelmann. Quando fechou uma joint venture com a chinesa Snowflake em 1995, antes da China "virar moda", o mercado chinês de compressores estava em 8 milhões de unidades/ano. Hoje subiu para 35 milhões/ano.

Para Henrique Rzezinski, vice-presidente sênior de relações externas da Embraer, a estimativa "conservadora" é que a China vai precisar de 630 aviões de 30 a 120 lugares. Esse tipo de jato hoje representa apenas 12% da frota do país, enquanto nos Estados Unidos, que também possui dimensões continentais, chega a 43%.

"Para atuar na China, é preciso ter nervos de aço", afirma. Ele conta que a Embraer abriu escritório na China em maio de 2000 e vendeu 10 jatos em junho e 30 jatos em novembro. Só que em 2001 o governo chinês elevou a tarifa de importação de 7% para 23%, aumentando bruscamente os custos.

Após negociar com Pequim, a Embraer firmou um acordo de cooperação tecnológica com a chinesa Avic II. Mesmo assim, quatro aeronaves que deveriam ter sido entregues em dezembro de 2001 não puderam entrar no país. Pressionada a ir mais fundo no negócio, a Embraer fechou uma joint venture com a Avic II, na qual detém 51%, e inaugurou uma fábrica em Harbin em janeiro de 2003. No final daquele ano, produziu seu primeiro avião chinês. E em dezembro de 2006, a Embraer finalmente entregou 100 aeronaves na China, 50 feitas no país e 50 no Brasil.

Em discurso lido no início do evento, o embaixador do Brasil na China, Luiz Augusto de Castro Neves, afirmou que o dragão asiático não deve ser visto como "ameaça". Ele admitiu que a China "assusta", mas afirmou que o país compra as commodities brasileiras e fornece insumos industriais baratos.