Título: Governo eleva alíquota para proteger calçados e vestuário
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 26/04/2007, Brasil, p. A3

Os prejuízos causados pelas importações asiáticas aos fabricantes de calçados e itens de vestuário, aliados à demora dos processos de defesa comercial, levaram o governo a elevar de 20% para 35% o imposto de importação desses produtos. A decisão foi tomada ontem pelos sete ministros que integram a Câmara de Comércio Exterior (Camex) e será submetida às instâncias superiores do Mercosul. A expectativa do secretário-executivo da Camex, Mário Mugnaini, é a de que a medida terá efeitos práticos no final de maio ou início de junho. O aumento de alíquota foi autorizado sem o governo exigir contrapartidas - em investimento, manutenção do emprego ou modernização tecnológica - dos setores beneficiados.

A alíquota de 35% é a máxima consolidada pelo Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC) e a proteção aos fabricantes nacionais foi justificada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, pela necessidade de proteger a indústria nacional da concorrência desleal. "Notamos a entrada volumosa de produtos estrangeiros, alguns subfaturados. Temos de criar alguma barreira de modo que o produto brasileiro possa sobreviver. Esses setores empregam muita gente e são competitivos. O Brasil não manipula câmbio e não dá subsídios aos exportadores, como fazem alguns países", explicou.

Mantega recusou-se a citar a China como um dos países responsáveis por importações desleais, mas deixou claro que, se o Brasil não reagisse, as indústrias de calçados e vestuário corriam o risco de "perecer". O ministro disse que o governo quer manter os milhões de empregos. Segundo ele, os fabricantes de confecções empregam 1,6 milhão de pessoas.

Para o ministro da Fazenda, medidas antidumping, que visam proteger contra o comércio desleal, demoram mais de um ano para serem efetivadas. Nesse tempo, os prejuízos somente aumentariam e as perdas dos produtores nacionais poderiam ser irreversíveis. "A balança comercial está cada vez mais desfavorável nesses setores. Somos favoráveis à livre concorrência e à redução de barreiras tarifárias. Defendemos isso na Rodada Doha da OMC, mas a decisão que tomamos é uma exceção. Se tem gente fazendo malandragem ou usando instrumentos ilícitos, temos de reagir. Se não, serão milhões de trabalhadores sem emprego", justificou Mantega.

Mugnaini disse que o governo não espera dificuldade para aprovar a medida no Mercosul. Isso porque a Argentina já adota tarifa de importação de 35% para bens de consumo. Conversas prévias com representantes argentinos, uruguaios e paraguaios já foram realizadas.

O secretário-executivo da Camex reconheceu que há "alguma preocupação" no âmbito da Rodada Doha da OMC . Em maio, serão retomadas as negociações para acesso aos mercados não-agrícolas. Com a elevação das tarifas de importação desses dois setores, o corte, necessariamente, será menor. Mas Mugnaini ponderou que representantes dos Estados Unidos e da União Européia conhecem bem o impacto das importações asiáticas nestes setores.

Atendendo a pedidos de empresários que vêm sendo prejudicados pelo comércio desleal, a Receita Federal liberou, em março, o acesso aos dados das importações dos setores mais sensíveis. Por meio de consulta à sua página na internet, já pode ser identificada uma única operação de compra de mercadorias estrangeiras. Os importadores ficam preservados, mas é possível saber o país de origem e outras informações que indiquem pirataria, subfaturamento, dumping e sonegação fiscal.

Desde 2005, a Receita vem apertando o cerco e registrando um número maior de irregularidades. Naquele ano, 80% das importações de têxteis foram controladas por meio do Canal Vermelho, que indica conferência física das mercadorias. Nos anos seguintes, esse percentual foi reduzido, mas Medina garante que o rigor do controle aduaneiro aumentou.

Há três anos o percentual de irregularidades era de 2%, e neste ano foi para 7%. No segmento têxtil, o preço médio por quilo das importações era de US$ 2,09 em 2004. Em 2007, subiu para US$ 2,69. No vestuário, o preço médio foi de US$ 5,34 por quilo em 2004 para US$ 8,71 neste ano.