Título: Serra e Aécio diferem na relação com o Planalto
Autor: Felício, César e Moreira, Ivana
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2007, Caderno Especial, p. F4

Os presidenciáveis tucanos adotaram rumos divergentes em sua relação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governador de São Paulo, José Serra, realiza um movimento de aproximação, enquanto o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, está paulatinamente adotando um tom mais crítico.

O pragmatismo demonstrado por Serra em suas relações com Lula já estava anunciado no primeiro dia de governo. Ao assumir, o governador paulista fez duras críticas à política econômica, mas avisou, entre várias frases de efeito, que não faria oposição radical: "Não esperem de mim o adesismo que não se respeita nem a agressão que não oferece respeito".

Desde então, o governador tucano convergiu com Lula várias vezes no plano político e econômico. Tentou levar o PSDB oficialmente a apoiar a candidatura do deputado petista Arlindo Chinaglia (SP) à presidência da Câmara e é um aliado do presidente na articulação para eliminar o instituto da reeleição. Paralelamente, negocia investimentos conjuntos com o governo federal na área de saneamento e avais para empréstimos multilaterais que somam cerca de R$ 7 bilhões. Derrotado por Lula para a Presidência em 2002 e preterido em favor do ex-governador Geraldo Alckmin na disputa interna do PSDB pela candidatura presidencial em 2006, Serra é um dos postulantes dentro do PSDB pela sucessão em 2010.

Na agenda de Serra com o Planalto, também está a transferência para o Estado de ativos federais, como o porto de Santos e o entreposto comercial do Ceagesp e mudanças legais, como a desoneração do setor de saneamento da cobrança da Cofins. A pauta foi apresentada pelo governador paulista ao presidente em uma reunião em abril, sem uma resposta do governo federal até agora.

O comportamento de Serra contrasta com o de seu antecessor, Geraldo Alckmin. Em seu governo, Alckmin, que buscou consolidar-se como nome nacional para disputar a Presidência, entrou diversas vezes em atrito com Lula.

Também presidenciável tucano, o governador mineiro Aécio Neves cultiva boas relações com o Planalto desde seu primeiro mandato, mas tenta assumir um papel de liderança entre os governadores. Nas últimas semanas, em comparação com Serra, adotou um tom crítico ao tratar da União.

Aécio tem reclamado publicamente de que o governo federal, segundo ele, não cumpriu ainda boa parte do que prometeu na histórica reunião com o governadores. Chegou a acusar o presidente Lula de "quebra de confiança" numa entrevista à imprensa. "É impossível se construir qualquer projeto de aceleração do crescimento tendo o governo federal como único ou como principal financiador do desse programa de crescimento", argumentou o tucano, em meados de abril.

O governador de Minas - que desde a reeleição em outubro de 2006 trabalha para se consolidar como líder dos governadores - elegeu três bandeiras de luta: Lei Kandir, Cide e CPMF. "As nossas propostas não têm um fundo regional, elas não atendem especificamente a Minas Gerais, todas elas têm a visão da federação", avisa.

O governador de Minas tem trabalhado também pela divisão dos recursos da CPMF entre União, Estados e municípios, uma hipótese já rechaçada pelo governo federal diversas vezes. O modelo que defende prevê que Estados fiquem com 20% da arrecadação da contribuição sobre a movimentação financeira, caso ela seja prorrogada. Municípios ficariam com 10% da receita.

O mineiro prefere não falar de renegociação das dívidas dos Estados, diz que não apóia nada que resulte em descumprimento da Lei Kandir. Mas, da mesma forma que Serra, cobra a ampliação do limite de endividamento dos Estados. Minas Gerais, reconhece ele, é um dos Estados que seria beneficiado com o aumento do limite já que tem negociações avançadas com instituições como Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para concessão de novas linhas de crédito.

A defesa do fim da reeleição, feita por Serra com mais ênfase, mas também por Aécio, é um sinal do pragmatismo que impera na relação entre os governadores presidenciáveis com Lula. Um mandato só para o próximo presidente da República abriria caminho para Lula tentar voltar à Presidência em 2014 ou 2015, caso o mandato passe de quatro para cinco anos. Ao mesmo tempo, abre caminho para um acordo interno no PSDB em que Aécio, 18 anos mais jovem que Serra, cederia a vez para o rival na próxima eleição, em troca de ter seu apoio na eleição seguinte.