Título: Integração com América do Sul é demorada e difícil, diz Lula
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 03/05/2007, Brasil, p. A8

Um dia depois de o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, anunciar o controle operacional sobre os projetos de petróleo da região da Faixa do Orinoco e de o presidente da Bolívia, Evo Morales, ameaçar romper os contratos com a Petrobras, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender uma política de integração na América do Sul. Durante cerimônia de formatura de novos diplomatas do Instituto Rio Branco, Lula afirmou que "não há outro caminho para a América do Sul que não seja o da construção de um espaço econômico, político e social integrado".

Em nenhum momento Lula citou diretamente os atritos com a Venezuela ou a Bolívia, mas alertou que essa integração é tarefa para longo prazo, sendo natural que surjam dificuldades no caminho. "As relações que mantemos com nossos vizinhos nunca foram tão densas e intensas. Não foi fácil superar décadas de distanciamento entre nós. O processo de integração pode ser às vezes turbulento, mas é indispensável", reforçou.

Para o presidente, os países não podem se render aos interesses imediatistas ou às dificuldades conjunturais, mas ele reiterou que a integração não pode ser assimétrica. "Ela só será efetiva se tivermos a ousadia de buscar soluções que atendam aos objetivos de todos, especialmente os menos favorecidos. Afinal de contas, isso é o que estamos fazendo em nosso próprio país", disse o presidente.

Lula também atacou os críticos da política externa brasileira, que acham que o Brasil age com uma condescendência exagerada diante das ameaças bolivianas. "Humildade não é fraqueza, solidariedade não é sinônimo de ingenuidade. Para ser solidário é preciso ter firmeza e acreditar no que defendemos, afirmou o presidente.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, minimizou a crise com a Bolívia, lembrando que "a ameaça de um rompimento unilateral acabou não se concretizando".

Amorim assegurou, na formatura, que o presidente Lula vem acompanhando de perto a questão da Bolívia e que o Itamaraty conseguiu agir para que a situação não se complicasse ainda mais. "Mas não nos cabe discutir a questão de preços. Essa negociação caberá ao ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, e ao presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli". O chanceler disse que ambos devem retomar as conversas com o governo boliviano a partir de hoje.

O vice-presidente, José Alencar, também procurou ser moderado em relação ao endurecimento de discurso dos presidentes sul-americanos. Afirmou que a nacionalização da produção de gás na Bolívia é uma decisão de governo que deve ser respeitada, desde que não fira os interesses brasileiros no país. "É importante o cumprimento dos acordos firmados com o governo e com as empresas brasileiras, que têm ajudado muito a Bolívia", afirmou.

Durante a cerimônia de formatura dos diplomatas, que sucedeu à entrega da Ordem de Rio Branco, o presidente Lula afirmou que o Brasil conseguiu aumentar o intercâmbio comercial com os países pobres, sem abrir mão das relações com os países desenvolvidos.

E sugeriu, diante dos novos diplomatas, que o Brasil instalasse embaixadas, se possível, em todos os países. "Não é você ter 30 embaixadores disputando para ver quem vai para Washington e não ter nenhum querendo ir para São Tomé e Príncipe", disse o presidente.

Lula admitiu a Celso Amorim que um de seus sonhos é ver o Brasil comprar as embaixadas no Exterior, em vez de prosseguir pagando aluguel. "Eu não sei qual é o falso moralismo ou qual é a implicância de que um país como Brasil não pode comprar embaixada lá fora. Comprar os nossos próprios, nos países estrangeiros, é uma demonstração de que a gente está naquele país, definitivamente", disse o presidente, que convidou ontem o ex-secretário de Imprensa André Singer para coordenar a criação da Universidade da América Latina, que seria instalada em Foz do Iguaçu.