Título: Projetos da Petrobras no Irã preocupam governo Bush
Autor: Balthazar, Ricardo e Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2007, Brasil, p. A3

Os Estados Unidos avisaram o Brasil que estão preocupados com o crescente interesse da Petrobras em fazer negócios com o Irã. A iniciativa faz parte de uma agressiva campanha diplomática deflagrada pelo governo americano contra empresas estrangeiras que desejam explorar petróleo e gás natural no Irã.

O embaixador dos EUA em Brasília, Clifford Sobel, discutiu o assunto recentemente com o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli. Sobel deixou claro para Gabrielli que a presença da estatal no Irã pode criar complicações no futuro para os negócios da subsidiária americana da Petrobras, que explora várias áreas no Golfo do México.

Os investimentos estrangeiros no Irã preocupam os americanos por duas razões. Na avaliação da Casa Branca, eles minam os esforços que os EUA e a comunidade internacional vêm desenvolvendo para isolar o Irã e conter suas atividades nucleares. Além disso, a liberdade de atuação de companhias como a Petrobras incomoda as empresas americanas, que são proibidas por lei de fazer negócios no Irã.

A Petrobras assinou em 2004 um contrato com o governo do Irã para fazer pesquisas num bloco chamado Tusan, em águas territoriais iranianas no Golfo Pérsico. A estatal é parceira da espanhola Repsol nesse projeto e o contrato prevê investimentos de US$ 35 milhões. No momento, ela está furando um poço no local sem indício de descoberta e se encontrar petróleo na área, a empresa brasileira espera ter preferência para explorar o campo no futuro.

A Petrobras também avalia a exploração de dois blocos no Mar Cáspio. No início do mês, um diretor da NIOC, a empresa estatal que controla o setor no Irã, disse à agência de notícias Bloomberg que a Petrobras deverá assinar em breve um contrato de US$ 470 milhões para explorar dois blocos oferecidos na licitação. A notícia não foi confirmada pelo diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró. "No Irã estamos também examinando uma possibilidade, que para nós é muito interessante, de investimento no Mar Cáspio. Mas ainda não chegamos a nenhuma conclusão. Estamos apenas negociando com a NIOC", disse o diretor ao Valor.

A Petrobras tem evitado discutir o assunto em público. Na conversa com Sobel, Gabrielli procurou minimizar o interesse da companhia no Irã. Segundo funcionários do governo brasileiro familiarizados com o assunto, ele disse ao embaixador que no curto prazo os investimentos da Petrobras se restringirão ao bloco de Tusan.

Procurado pelo Valor, o Departamento de Estado dos EUA disse que tem monitorado os investimentos da Petrobras no Irã, mas não quis discutir detalhes das iniciativas diplomáticas tomadas. "Nossa prática é envolver vigorosamente empresas e países relevantes em alto nível [para discutir] seu potencial interesse no setor de óleo e gás do Irã", afirmou Viktor Sidabras, porta-voz do departamento para assuntos da área de energia.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a Petrobras informou que não se manifestaria sobre as questões políticas que cercam seus negócios no Irã, mas afirmou que sua presença no país é "estratégica" e um "ponto de partida para o objetivo de reconquistar a participação [da companhia] no Oriente Médio."

Empresas estrangeiras anunciaram nos últimos anos US$ 126 bilhões em investimentos no setor de petróleo no Irã. Muitos projetos estão em estágio preliminar e não saíram do papel. Companhias como a holandesa Royal Dutch Shell e a Repsol, assim como os governos da China e da Malásia, também sofreram recentemente pressões dos EUA para se afastar do Irã.

O governo americano acredita ter sido particularmente bem sucedido no caso da Shell. A empresa não desistiu do Irã, onde é parceira da Repsol num projeto de US$ 10 bilhões. Mas há poucas semanas incluiu num comunicado ao mercado um alerta sobre os riscos que corre ao apostar no país. Os EUA também têm pressionado bancos europeus a cortar linhas comerciais disponíveis para o Irã.

O problema foi abordado publicamente diversas vezes nas últimas semanas pelo subsecretário de Estado dos EUA para assuntos políticos, Nicholas Burns, o número três na hierarquia do Departamento de Estado. "Nós achamos que o investimento [estrangeiro] em petróleo e gás no Irã está errado", disse ele há uma semana, durante audiência no Senado. "É contrário ao interesse internacional de isolar e pressionar esse regime."

Lideranças do Partido Democrata no Congresso apresentaram recentemente projetos para ampliar as sanções que a legislação americana prevê para companhias que fazem negócios com o Irã. Se essas propostas forem aprovadas, subsidiárias de empresas estrangeiras nos EUA e investidores americanos que aplicam em suas ações ficarão sujeitos a diversas penalidades.

A legislação que regulamenta as sanções aplicadas pelos EUA contra o Irã é dura com as companhias americanas e suas subsidiárias. Se fizerem negócios com o Irã, seus dirigentes podem ser processados criminalmente. As empresas podem ficar impedidas de assinar contratos com o governo e receber empréstimos de bancos americanos.

A Casa Branca é contra a extensão das sanções a companhias estrangeiras e tem procurado convencer o Congresso a desistir da idéia. "Queremos que as sanções recaiam sobre o Irã e não tanto sobre nossos aliados, porque isso iria perturbar e talvez até desmantelar nossa coalizão", disse Burns na semana passada.

Os EUA temem que um endurecimento como o proposto no Congresso prejudique seus esforços para obter o apoio internacional necessário para forçar o Irã a abandonar o programa nuclear. Mesmo assim, a ameaça representada pela possibilidade de novas sanções tem sido mencionada pela diplomacia americana em seus esforços para convencer as empresas estrangeiras a sair do Irã. (Colaborou Claudia Schüffner, do Rio)