Título: Câmbio compromete as exportações
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 29/05/2007, Caderno Especial, p. F4

É grande o descontentamento dos pequenos exportadores com a política cambial. Segundo eles, o dólar baixo já compromete o desempenho dos negócios e, em alguns segmentos, chega a haver risco de quebra de empresas. O problema é maior para indústrias intensivas de mão-de-obra, como é o caso da moveleira e da calçadista, que sofrem acirrada competição com a China, cuja mão-de-obra abundante que ficou mais em conta ainda em relação à brasileira.

"Com o dólar do jeito que está eu não consigo mais exportar", reclama Daniel Canassa, diretor da Damis Calçados, empresa de Birigüi, no interior de São Paulo. "No ano passado, exportei 10 mil pares de calçados em janeiro e outros 10 mil em julho. Este ano as exportações de janeiro caíram para 7 mil e não há previsão de vender mais nada para o exterior até o fim do ano, a não ser que apareça um cliente novo, o que está difícil. Exportar em julho era estratégico para a minha empresa. Nós trabalhamos com produtos sintéticos e julho é um mês complicado para as vendas internas porque está perto de mudança de estação."

A fábrica de Canassa é especializada em calçados infantis, assim como outras da região de Birigüi. Ela está organizada em um arranjo produtivo local (APL). Desde 2002, empresas próximas e com vocações semelhantes vêm se reunindo em arranjos produtivos locais para contar com apoio de entidades como a Agência de Promoção de Exportação e Investimentos (Apex), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e do Ministério do Desenvolvimento para desbravar o exterior.

"Uma empresa pequena que faz parte de um APL tem mais oportunidades para exportar do que outra que não faz", afirma o coordenador do escritório de projetos da Apex, Rodrigo Souza. "No arranjo ela encontra apoio para qualificação de mão-de-obra, centros de pesquisas e ficam mais próximas das instituições de crédito. São esses aspectos que favorecem a qualificação de uma empresa para exportação, porque o mercado internacional é bastante exigente e as companhias têm de atingir determinados padrões de produção limpa, de qualificação, de certificação. O APL ajuda a atingir esses padrões internacionais."

Mesmo com esse apoio, os pequenos exportadores passam por um revés no negócio. Canassa, que já exportou para México, Panamá, Grécia e Portugal, explica: "No começo do ano vendi com o dólar a R$ 2,15; quando fui entregar o pedido e fechar o negócio a cotação já estava a R$ 2,08. Agora, caiu mais ainda e eu tenho de manter o valor combinado em dólar."

Na indústria calçadista de Franca (SP) e de Novo Hamburgo (RS), o impacto foi ainda maior porque muitas empresas exportavam sob encomenda para grandes marcas mundiais e estas encontram mão-de-obra mais barata na China. "As fábricas que não fecharam tiveram que mudar a mentalidade, investir em design e marca e começar de novo buscando agregar valor ao produto. Não é simples. É preciso contratar designer para desenvolver coleções, investir em marketing e começar a divulgar primeiro no Brasil para depois expandir", explica Souza, da Apex. Uma outra tática é pressionar o governo para impor barreiras a entrada do sapato chinês no mercado interno.

Além de agregar valor ao produto para driblar o câmbio desfavorável, algumas indústrias, como a de jóias, estão aproveitando o dólar baixo para ampliar o percentual de matéria-prima importada - ou cotada em moeda norte-americana - em suas mercadorias. "Um grande facilitador é não vender produtos 100% commodities", ensina Rinaldo Aparecido Mônaco, sócio da 4 e vice-presidente da Associação dos Joalheiros e Relojoeiros do Noroeste Paulista (Ajoresp). "Se a peça só utiliza matéria-prima nacional, o jeito de valorizá-la é agregar valor de mão-de-obra e de design. Em nossas peças utilizamos aço e ouro. O preço do aço subiu, mas a quantidade que vai na peça é pequena, já o ouro é cotado em dólar e isso reduz o preço da peça", afirma.

Os joalheiros brasileiros também disputam com a China. Mônaco, que exporta para o Chile, Paraguai, Argentina, Uruguai, Venezuela e Estados Unidos, considera que as empresas que participam dos arranjos produtivos locais deveriam focar mais no Mercosul para aproveitar melhor a vantagem do idioma, dos costumes parecidos e da proximidade. "O deslocamento é mais barato e isso facilita o trabalho de prospecção", afirma.

Na região de São José do Rio Preto, 23 empresas participam do APL de Jóias e Relógios. Ao todo, a Apex apóia 106 APLs dos mais diversos segmentos espalhador por todo o país.